Marcos Edílson
de Araújo Clemente*
Universidade
Federal do Tocantins – UFT
marceddilson@yahoo.com.br
Detalhemos a
fotografia. Maria Bonita sentada, pernas cruzadas, cabelos cuidados, tom
sereno, segurando dois cães em pose fidalga. O equipamento alemão – máquina Ica
de última geração, da Karl Zeiss, 35 mm, contendo um maço de filmes Gevart Belgium – focaliza Lampião que está ao
lado dela, em pé, olhos fixos na câmera, tendo em mãos um exemplar de um
jornal, provavelmente A Noite Ilustrada.
A imagem fotográfica
sugere uma imagem de Lampião como leitor e mais especificamente leitor de Noite
Ilustrada. Sugere ainda possíveis relações do fotógrafo Benjamin Abrahão com a
imprensa do Rio de Janeiro, haja vista a existência de outras fotografias em
que Lampião aparece segurando um exemplar de O Globo. Aliás, desde o século XIX
havia se instalado entre os fotógrafos a prática de se fotografar pessoas que
portavam às mãos algum objeto, inclusive livros. Percebe-se a encenação em ambiente
natural, a pose seguida das representações para a posteridade, plena de sentido
e recursos cenográficos. Esta foto fornece pistas da relação dos cangaceiros com
o mundo dos negócios e da comunicação, indicando que o documento fotográfico esconde
atrás de si uma história cuja intencionalidade deve ser esclarecida.
Donde a
necessidade de analisá-lo como monumento e como documento. Enquanto monumento,
a fotografia é uma escolha das forças atuantes no real, uma herança do passado;
enquanto documento, é uma escolha efetuada pelo historiador.
Marc Ferro
propõe partir das imagens, mas “[...] não procurar somente nelas exemplificação,
confirmação ou desmentido de um outro saber, aquele da tradição escrita.
Considerar as imagens tais como são, com a possibilidade de apelar para outros saberes
para melhor compreendê-los”.32
A análise das
imagens fotográficas requer a distinção entre os conceitos de iconografia e de
iconologia. A análise iconográfica inventaria o conteúdo das imagens em seus
elementos icônicos formativos. A análise iconológica, por sua vez, busca o significado
intrínseco do documento fotográfico e refere-se à realidade interior, o significado
intrínseco de uma imagem. Para ultrapassar o realismo fotográfico é necessário
desenvolver as análises iconológicas, levando-se em conta as representações
32 FERRO,
Marc. O filme: uma contra-análise da sociedade? In: LE GOFF, Jacques; NORA,
Pierre. (Dir.). História: Novos Objetos. Tradução de Terezinha Marinho. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, p.
203. Fênix –
Revista de História e Estudos Culturais
Outubro/
Novembro/ Dezembro de 2007 Vol. 4 Ano IV nº 4
ISSN:
1807-6971
Disponível em:
www.revistafenix.pro.br
18 e as
práticas culturais construídas em torno delas e por meio delas. Para o caso das
imagens fotográficas do cangaço, vimos que diferentes sujeitos atuam com representações
distintas nos processos de produção, reprodução e recepção das imagens.
http://www.revistafenix.pro.br/PDF13/DOSSIE_%20ARTIGO_13-Marcos_Edilson_de_Araujo_Clemente.pdf
Revista de história Estudos culturais
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