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sábado, 21 de setembro de 2024

O CANGAÇO PELA PERSPECTIVA FEMININA

 Por Tuíca do Cordel

Se tinha algo que dava um prazer intenso a Lampião, além de apunhalar seus rivais ou os “macacos”, como os cangaceiros chamavam os policiais no sertão nordestino dos anos 30, era “cobrir uma fêmea”, o que, no linguajar deles, significava estuprar uma mulher enquanto ela chorava. Isso quando não era o caso de aplicarem uma “gera”, nome conhecido na região por estupro coletivo. Lampião, o chefe, era o primeiro da fila. Para ele e seu bando, o estupro ocorria porque “as mulheres queriam”. E após a morte de seus maridos, as cangaceiras ficavam à disposição de qualquer um que as quisessem.

Zé Baiano, cangaceiro do bando, gostava de marcar mulheres com ferros para boi com as iniciais do seu nome na face, genitália, nádega ou panturrilha. Se a mulher estivesse de cabelo ou vestido curto, era castigada pelo cabra. Criar os próprios filhos também era outro direito negado a elas. Dadá, estuprada quando tinha 12 anos por Corisco, nome proeminente do cangaço, classificava essa dor como “a maior do mundo”.

Relatos como esses, que revelam o terror que foi a vida das mulheres que entraram para o cangaço - e também daquelas que tinham a infelicidade de cruzar com o bando de Lampião -, ganharam visibilidade em Maria Bonita: sexo, violência e mulheres no cangaço, livro recém-lançado da jornalista Adriana Negreiros.


Maria Bonita - A Rainha do Cangaço em trajes de festa: cabelos ao estilo das melindrosas, dedos tomados por anéis e uma profusão de colares no pescoço.

A obra busca tirar das sombras uma rotina de opressão e violência a que eram submetidas cangaceiras como Maria Bonita, Dadá, Durvinha, Otília e outras dezenas de mulheres que foram raptadas com extrema violência pelos cangaceiros. Ou que decidiram seguir o bando por conta própria, sonhando com uma vida de riqueza, folia e aventuras que fazia parte do imaginário popular sobre o cangaço. Mas aquela era uma “vida miserável”, diria Dadá.

Pesquisar sobre o cangaço, conta Adriana, foi se deparar com violências absurdas que mais parecem saídas de filmes de terror. Várias das mulheres que entraram para o cangaço, aproximadamente 40 e muitas delas à força, viviam uma rotina de ameaça constante de morte tanto por parte de seus companheiros quanto da polícia, além dos estupros que sofriam.

“Os cangaceiros se julgavam no direito de fazer com elas o que bem entendessem, inclusive matá-las. No bando de Lampião, elas eram vistas como propriedade privada de seus homens”, explica a autora. Era uma “vida desgraçada”, como relatou Otília, uma das inúmeras mulheres que foram obrigadas a entrar à força para o cangaço. Ou entravam ou morriam na bala.

Transgressora? Sim - Fascinada pelo cangaço desde menina, Adriana costumava ouvir da avó materna a história sobre como, em 1927, a cidade de Mossoró (RN), onde ela nasceu, se organizou em trincheiras e botou para correr na bala os cangaceiros.

Mas, diferentemente da literatura sobre o período, contada pela perspectiva masculina, Adriana optou por escrever sobre o cangaço do ponto de vista feminino, um recorte raro na historiografia sobre o período, uma escolha que ela definiu como “política e feminista”.

“Nas narrativas sobre o cangaço, de forma geral, só há homens. De bandoleiros a soldados, passando por políticos e jornalistas, os personagens são todos do sexo masculino. O principal objetivo do livro é jogar luzes sobre as narrativas das mulheres, que são historicamente silenciadas – no cangaço e em qualquer outro episódio”.

A escolha da jornalista em escrever um livro sobre Maria Bonita foi embasada por seu pioneirismo e importância: ela foi a primeira mulher a entrar para o cangaço - e por vontade própria. Após sua chegada, Lampião daria passe livre para outras mulheres.

Para Adriana, Maria Bonita tinha um comportamento transgressor: uma mulher do sertão dos anos 1930, machista e opressor, que teve coragem de largar o marido e dar uma banana para a moral e bons costumes para cair nos braços do homem que amava, um fora da lei, ainda por cima. Seu bom-humor com “risada de rapariga”, como definiria a cangaceira Durvinha, era criticado por outras mulheres do bando.



O casal de cangaceiros Pancada e Maria Jovina; as cangaceiras Nenê, Maria Jovina e Durvinha; e Maria Gomes de Oliveira, que entraria para a história como Maria Bonita.

Feminista? Não - Considerar Maria Bonita feminista seria um exagero: se por um lado ela exalava empoderamento, por outro reproduzia o machismo violento do cangaço. Apesar de a cangaceira ter intervindo em raras ocasiões para que Lampião não violentasse mulheres, ela não defendia as próprias companheiras quando eram condenadas à morte por adultério. Adriana relata que a Rainha do Sertão tinha por hábito, por exemplo, arrancar brincos de mulheres inimigas à força, rasgando-lhes os lóbulos.


Quando recebeu a pena de morte por ter traído seu marido no bando, Lídia tentou clamar por sua vida para a primeira-dama do cangaço, que lavou as mãos. “As mulheres também agiam de forma machista, não se apoiavam e até incentivavam a execução de suas colegas quando cometiam adultério”, diz Adriana que, no entanto, defende que Maria Bonita não era uma sádica. “Não há relatos de que ela tenha cometido assassinatos ou participado de torturas.”

Para algumas das cangaceiras, entrar para aquela vida sofrida e penosa era uma aventura e a possibilidade de outra existência que não fosse o marasmo dos dias quentes e tediosos do sertão. Os cangaceiros eram vistos por muitos como heróis, homens que protegiam os sertanejos da violência da polícia, além de bem-sucedidos por ostentar muito ouro.

Era comum, afirma a autora, ver mulheres suspirando por Lampião. “Entrar para o cangaço representava, para muitos sertanejos e sertanejas, a única possibilidade de uma vida outra que não a sina de viver enfrentando a miséria e a seca.”

Maria Bonita só depois da morte - O livro mostra que Maria só se tornou Bonita após sua morte. No bando de Lampião, ela era apenas Maria de Déa (uma referência à sua mãe) ou Maria do capitão. Há duas principais versões para a criação do apelido.

A primeira teria sido uma criação de jornalistas do Rio de Janeiro e a segunda, uma “homenagem” dos soldados que participaram da emboscada feita a ela em 28 de julho de 1938, na grota do Angico, em Sergipe, que resultou em sua morte, na de Lampião e de boa parte do bando. As cabeças decepadas foram expostas ao público em excursões fúnebres por cidades alagoanas.

Adriana Negreiros

“Retratada pelas fontes oficiais como criminosa e perigosa, afinal, era preciso justificar sua morte e decapitação, a figura de Maria Bonita logo seria apropriada pela indústria do entretenimento, mas com uma roupagem romântica. Daí a origem do mito da mulher guerreira, da Joana D’arc da caatinga”, diz Adriana.

E, diferentemente de como a cangaceira foi retratada na minissérie Lampião e Maria Bonita, exibida pela Globo em 1982, em que Maria Bonita duela de arma em punho com a polícia em uma das cenas, seu dia a dia do sertão era outro. Cangaceiras não atiravam, com exceção de Dadá, e suas funções no bando se reservavam mesmo a satisfazer a selvageria sexual dos maridos e cuidar dos afazeres domésticos em meio a mandacarus e a aridez daquela vida.

(Da revista Trip)

http://luzdefifo.blogspot.com/2019/02/o-cangaco-pela-perspectiva-feminina.html

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SURGE SINHÔ, O MAIOR DOS PEREIRAS, NO CANGAÇO

 Por Manoel Severo Barbosa

Aderbal Nogueira, Manoel Severo e Dr. Sérgio Dantas

O ano é 1915 quando vamos encontrar Né Dadu, retornando da cidade de Triunfo após ser absolvido de crime de morte de João Jovino. Naqueles dias uma volante se formava para capturar um dos maiores desafetos da família Carvalho. Sob o comando do Tenente Teófanes Ferraz Torres e contando ainda com os Carvalho: Antonio e José da Umburana e João Lucas das Piranhas, atacam São Francisco, mas não encontram Né Dadu, espancando fortemente uma negra de nome Antonia Verônica, governanta do lugar, conhecida por “Mãe Preta” e prendem o mais novo dos filhos de D. Constança, irmão de Né Dadu: Sebastião Pereira, então com 16 anos.

Sinhô Pereira, sentado e Luiz Padre, de pé

A represália dos Pereira veio logo em seguida, quando é morto José da Umburana em emboscada de Vicente de Marina, o morticínio continua, desta feita mais um Pereira tomba, Né Dadu morre em 16 de outubro de 1916, vítima de covarde traição de um ex-cabra dos Carvalho, Zé Rodrigues, Zé Grande ou simplesmente “Zé Palmeira” que o matou com seu próprio rifle no lugar Poço do Amolar, na fazenda Serrinha. Esse caboclo Zé Palmeira havia se aproximado de Né Dadu após ardilosa trama traçada pelos próprios Carvalho, simulando o rompimento do referido cabra com a família inimiga. Apesar de Atento e desconfiado Né Dadu acabou sendo ludibriado pelo audacioso golpe e acabaria sendo vítima fatal do mesmo.

A morte do irmão empurrou definitivamente o mais jovem da família para o mundo do crime, nascia ali aquele que seria o mais valente de todos os cangaceiros, segundo o próprio Virgulino Ferreira: Sebastião Pereira, vulgo Sinhô Pereira.
  

 Sinhô Pereira década de 70 - 
O seu tamanho era enorme, imagine o tamanho da natureza deste homem

Partindo na sanha da formação de seu grupo, Sebastião Pereira partiu em busca do Coronel Zé Inácio, do Barro, conhecido coiteiro e protetor de bandidos, dali saiu com um grupo de 20 cabras, tendo como seu lugar tenente seu primo, Luiz Padre, rumo a Vila Bela, no Vale do Pajeú.

Invadindo São Francisco, depredou e queimou a loja de Antonio da Umburana e tomou a pequena vila, partindo dali para as fazendas dos Carvalho, Umburanas e Piranhas, depredando, queimando, matando animais, destruindo cercas, arrasando tudo. Os Carvalhos diante de tanta fúria se retiraram para a cidade, finalizando assim a primeira grande investida do grande cangaceiro.

Sobre a eterna peleja entre os clãs vamos ter o episódio da invasão à fazenda Piranhas, narrado por inquérito na própria delegacia de Vila Bela, como segue: “... no dia 1º corrente apresentaram-se voluntariamente a prizão os indivíduos José Alves de Barros e José de tal conhecido por José Caboclo e Francisco Alves de Barros, Cincinato Nunes de Barros, Antonio Carvalho de Barros, conhecido por Antonio da Umburana, Antonio Alves Frazão, José André, Feliciano de tal, João Ferreira, Francisco Porphirio, Antonio Teixeira, Antonio Pedro da Costa Neto, Antonio Pequeno, José Flor e João Tapia todos denunciados neste município como incursos no artigo 294 por terem morto ao cangaceiro Paixão na ocasião em que os mesmos se defendiam do ataque feito a fazenda Piranhas pelo grupo chefiado por Sebastião Pereira e Luiz Padre dos qual fazia parte o referido Paixão (Informe ao Chefe de Polícia pelo delegado de Vila Bela, 5/9/17).

Algum tempo depois Sebastião Pereira mataria o assassino de seu irmão Né Dadu, o indivíduo Palmeira na localidade de Viçosa em Alagoas, tendo Luiz Padre sangrado o matador de seu pai Padre Pereira, Luis de França, em São João do Barro Vermelho. Em outra oportunidade na localidade de Queixada, sob a proteção do Coronel Pedro da Luz, acabou encontrando Antonio da Umburana que foi sangrado, esquartejado e queimado, assim se configurava a vingança dos primos, Sebastião e Luis Padre.

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