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quarta-feira, 8 de outubro de 2025

FREI DAMIÃO, PRESENTE

  Clerisvaldo B. Chagas, 6 de fevereiro de 2024

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 3.009



Após a passagem do primeiro santo do Nordeste, padre Cícero Romão Batista, em 1930, a nação nordestina apegou-se ao segundo santo, Frei Damião, de Bozzano. Mas a dor veio do mesmo jeito em 1997, quando da passagem do Frei.

O Nordeste aguardava, mas não resistiu a dor do falecimento de Frei Damião de Bozzano. O Santo do Nordeste vinha doente, passando quase um mês internado no Hospital Português, do Recife, por grave problema de insuficiência respiratória. O Frei italiano nascera em 5.11.1898, em Bozzano e falecera aos 99 anos de idade, em 31.05.1997.

Com a morte de Frei Damião, o presidente da república, então, Fernando Collor de Mélo, decretou luto oficial por três dias. O féretro ficou à visitação pública, durante também três dias na Basílica de Nossa Senhora da Penha dos Frades Capuchinhos, em Recife.

O sepultamento ocorreu na capela dedicada à Nossa Senhora das Graças, no Bairro do Pina, na capital pernambucana.

Santana do Ipanema chorou a morte de Frei Damião e o homenageia com uma modesta pracinha que leva seu nome e sua imagem de corpo inteiro em redoma de vidro. O local fica na confluência das Ruas Manoel Medeiros de Aquino, Delmiro Gouveia e Maria Gaia no Bairro Camoxinga. Ultimamente não existe mais a redoma de vidro e a imagem está em pedestal mais baixo do que o original, ao alcance de todos.

Informações compiladas com alterações do livro O BOI, A BOTA E A BATINA; HISTÓRIA COMPLETA DE SANTANA DO IPANEMA que será lançado no próximo mês de março em Maceió e em Santana.

Mesmo invisíveis aos encarnados, os dois santos nordestinos não deixam de trabalhar pelos que apelam para suas intervenções sobre os males terrenos.

Em Canafístula Frei Damião, as romarias parecem sem fim, bem como as romarias à Pedra do Padre Cícero, na cidade sertaneja de Dois Riachos.  E no Juazeiro do Norte, nem se fala, de multidões e multidões que chegam à cidade vindas de todas as partes de País.

A região de Alagoas é que, por certo, envia mais devotos aos principais eventos anuais ao Cariri.

Frei Damião continua servindo, padre Cícero nunca parou de servir.

IMAGEM DE FREI DAMIÃO (FOTO: MARLENE COSTA/LIVRO O BOI, A BOTA E A BATINA...)



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FREI DAMIÃO NÃO ACEITAVA MÃOS DE FIÉIS SOBRE SUA CABEÇA.

   Por José Mendes Pereira

(Repostei para corrigir um erro meu. Não consegui abrir a página anterior para fazer a correção).

A foto pertence ao acervo do Raimundo Nunes

Durante a minha vida adulta levei duas grandes porradas e fortes, mas me orgulho, porque, todas as duas pessoas que me bateram verbalmente, são gentes grandes, gentes famosas, que cada uma delas, tem o seu lugar registrado na fama.
 
Escritor e pesquisador do cangaço João de Sousa Lima.

Um deles, é o famoso escritor e pesquisador do cangaço João de Sousa Lima, reconhecido no Brasil inteiro pelos seus belos trabalhos sobre o cangaço, e que foi quem mais encontrou peças do xadrez cangaceiro, que sempre será visto agora, e no futuro (assim disse o cineasta Aderbal Nogueira), com os seus valiosos trabalhos sobre o cangaço. 

Cineasta Aderbal Nogueira

Mas o escritor João de Sousa Lima teve razão. Ele tinha o direito de cobrar o seu nome  no seu trabalho. Um equívoco meu, pois não o coloquei. Em nenhum momento fiquei chateado com a sua cobrança, cuja tinha direito de sobra de me cobrar. João de Sousa Lima é autor de vários livros sobre o tema cangaço.


E o outro que foi e é considerado famoso e santo, é Frei Damião, pelo seu amado trabalho religioso, e um dos que, sem dúvida, permanece junto de Jesus. Todo Nordeste o tem como santo, muito embora ainda não foi canonizado, mas um dia será.

https://www.youtube.com/watch?v=CE1wBGm0T48&ab_channel=CANALDOBOC%C3%83O-JavierMalavasi
.
Lembro-me que na década de 70, em uma das suas missões em Mossoró, à noite, no largo da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, no grande Alto da Conceição, a fila de fiéis era enorme, e quando chegou a minha vez de ser abençoado pelo frei Damião, coloquei a minha mão sobre a sua cabeça. De repente com a sua mão, frei Damião tirou a minha mão que estava sobre a sua cabeça, dizendo-me:

www.panormaio.com

 "-Não ponha a sua mão sobre a minha cabeça!". 

Eu estranhei aquela atitude do religioso, vez que ele era e é considerado um verdadeiro santo entre os homens do nordeste brasileiro e de outras regiões do chão do Brasil.

Mas, posteriormente, não sei se era verdade, falaram-me que ele tinha sido advertido por um médico que tratava da sua escoliose, que não deixasse ninguém colocar a mão sobre a sua cabeça, porque aumentava mais ainda o problema. 

De fato! Uma, duas mãos sobre um corpo, não afeta. Mas milhares de mãos, mesmo uma de cada vez, na sequência, tem que pesar, e isso faz com que prejudique mais ainda o corpo que tem escoliose. Também não levei a sério, vez que ele era o religioso mais famoso do nosso chão querido que é Brasil.

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O FOGO DAS GUARIBAS E O TRISTE FIM DE NÊGO MARROCOS.

 Por Bruno Yacub

Herlon Fernandes e Bruno Yacub

Em 1927, Macapá, hoje Jati, era distrito de Jardim, que ainda englobava Baixio do Couro, hoje Penaforte. Assim, Jardim era um município de extensa área territorial. Havia em Macapá um jovem cobrador de impostos da renda estadual, muito popular, liderança emergente no Município, já incômodo para as velhas raposas políticas de Jardim: seu nome era Antônio Marrocos de Carvalho.
As circunstancias do assassinato do líder político Antônio Marrocos de Carvalho caracterizavam, a exemplo de tantas outras ocorrências funestas, a época sombria do apogeu do coronelismo. A morte comovente desse cidadão, concomitante à chacina dos homens do Salvaterra e o cerco a Chico Chicote, mostrava como o regime de dominação dos poderosos sul-cearenses, nos derradeiros anos da década de 1920, prosseguia desenvolto, alardeando o prestígio soberbo do bacamarte, que se disparava pelo banditismo político, da polícia e o banditismo dos homens do cangaço.
Àquele tempo, o mais torvo plano foi concertado entre potentados do extremo sul cearense e a polícia militar, para a eliminação de vidas humanas. O desgraçado projeto resultaria, realmente, em várias mortes. E a polícia militar far-se-ia, marcadamente, responsável por um dos capítulos mais sombrios da sua crônica e escreveria uma das páginas mais negras da história do banditismo nos sertões nordestinos.

Os dias eram para o Ceará, principalmente para o Cariri, de perseguições políticas, insegurança e intranquilidade.

Antônio Marrocos

Antônio Marrocos foi surpreendido, certa noite, pela visita de Lampião, levado à sua casa por Manuel (Né) Pereira, que exercia cargo de subdelegado daquele povoado. Como é sabido, Lampião era ligado à família Pereira por forte amizade. Fiel à tradição sertaneja e por ser parente e amigo de Né Pereira, Marrocos recebeu a visita com bastante cordialidade. A partir de então, tendo fracassado em duas emboscadas contra Marrocos, no caminho entre Macapá e Jardim, os seus adversários políticos denunciaram-no ao Chefe de Polícia como coiteiro de Lampião, razão pela qual ele passou a ser fortemente perseguido.
Meses depois, novamente à meia-noite, Né Pereira bateu à porta de Marrocos. Ao abri-la, verificou a presença de Virgulino. Sem convidá-los a entrar, Marrocos explicou-lhes o que lhe vinha ocorrendo. A seguir, dirigindo-se a Lampião, sugeriu-lhe que, embora contasse com sua atenção, não voltasse a visitá-lo, afim de não confirmar as acusações que lhe estavam sendo feitas pelos chefes situacionistas de Jardim.
Em resposta, Lampião pediu-lhe que telegrafasse ao Chefe de Polícia comunicando que ele, naquela noite, passava em Macapá com destino ao Cariri. Tal sugestão foi ratificada na manhã do dia seguinte, quando Marrocos, dirigindo-se a Brejo dos Santos (atual Brejo Santo), de onde enviaria o despacho, passou pelo grupo estacionado no local Barra-de-Aço, a 01 km de Macapá.
Apesar de tudo isso, quando o tenente José Bezerra chegou a Macapá, no rumo de Brejo dos Santos, foi à casa de Antônio Marrocos e sugeriu-lhe que, para desmentir as acusações de que estava sendo alvo, deveria unir-se à sua tropa na perseguição ao bando de Virgulino.

Logo de início, alegando de tratar-se de uma calúnia já desmentida, Marrocos recusou a sugestão. Mas, após prolongada polêmica, para não demonstrar covardia, ele resolveu incorporar-se à volante. Com isso, no dia 28 de janeiro de 1927, procedente de Jardim, chegava a Brejo dos Santos uma volante policial sob o comando do Primeiro-Tenente José Gonçalves Bezerra, com o objetivo – segundo era comentado e confirmado pelo citado oficial – de perseguir e combater o grupo de Lampião.


Reafirmando sua falsa missão de dar cabo ao Rei do Cangaço, o tenente José Gonçalves Bezerra saiu de Brejo dos Santos na madrugada de terça-feira, 1° de fevereiro de 1927, comandando uma volante com 70 praças, como auxiliar o Sargento-Tenente Veríssimo Alves Gondim e como guia e agregado à tropa, voluntariamente, João Gomes de Lucena, sobrinho de Chico Chicote, filho do então prefeito de Milagres e ex-prefeito de Brejo dos Santos, coronel Manoel Inácio de Lucena e sobrinho do então prefeito de Brejo dos Santos, o coronel Joaquim Inácio de Lucena, conhecido como Quinco Chicote, além de cabras do coronel Nozinho Cardoso.
Logo após a chacina dos homens do Salvaterra e a fim de não provocar reação em Guaribas e concluir o plano elaborado para eliminar Antônio Marrocos, o tenente José Bezerra, antes de lá chegar, manteve longa conversa com Marrocos, manifestando a certa altura, o desejo de conhecer o mencionado sítio e travar relações amistosas com seu proprietário. A seguir, referindo-se à sua missão e expondo razões de ordem tática, pediu-lhe que fizesse um desenho da casa-grande, das habitações vizinhas e das elevações e depressões do terreno em seu redor. E para que Marrocos não pusesse em dúvida suas intenções, afirmou-lhe que deixaria a tropa distante do sítio e somente ele, o tenente Veríssimo, o sargento Antônio Gouveia (Antônio Pereira de Lima) e o corneteiro Louro Galo Velho iriam à residência de Chico Chicote, tendo à frente o próprio Marrocos, a fim de não haver desconfiança e possível reação à sua presença ali.

Ruínas da Casa de Chico Chicote

Amigo de Chico Chicote, de quem havia recebido, uma semana antes, um rifle de presente, que conduzia a tiracolo, Marrocos traçou a lápis, num pedaço de papel de embrulho, um ligeiro croqui de Guaribas. A casa-grande da fazenda Guaribas, município de Porteiras, era uma verdadeira fortaleza, aboletada numa dobra da Serra do Araripe, ao lado do povoado Simão, e meio a uma plantação de café, com muitas fruteiras. As paredes tinham quase meio metro de largura, feitas de tijolos dobrados, com buracos abertos por todos os lados (chamados “torneiras”), por onde os atiradores poderiam mirar e fulminar eventuais invasores. Com efeito, pelas 07 horas da manhã, ao aproximar-se do sítio, a tropa fez alto e Zé Bezerra pôs em execução o que havia planejado com o seu colega Veríssimo (Esses detalhes foram dados pelo cabo Pedro Alves à viúva de Marrocos, Mundinha (Raimunda) Piancó, bem como outros pormenores sobre o seu fuzilamento).Percebida a aproximação do reduzido grupo, umas das mulheres que faziam colheita de café, naturalmente para esclarecer Chico Chicote e outras pessoas que se achavam com ele, disse em voz alta: É o Nêgo Marrocos!
Imediatamente, o tenente Veríssimo disparou um tiro de revolver nas costas de Antônio Marrocos, que tombou de frente, abaixo de um pé-de-café, atingido no pulmão direito, vindo a falecer três horas depois. 

Naquele momento o segundo “acerto” da empreitada seria efetivado (o primeiro acerto foi a chacina de Antônio Gomes Grangeiro, seu sobrinho João Grangeiro (Louro Grangeiro) e dois moradores, Aprígio Temóteo e Barros e Raimundo Madeiro Barros (Mundeiro). Quando foram prepararo sepultamento de Antônio Marrocos, Mundinha Piancó, viúva de Marrocos estranhou que, embora ele estivesse de frente com a casa-grande das Guaribas, o tiro que o vitimou entrou pelas costas.

Monumento a Antonio Gomes Granjeiro

Confirmando as suspeitas sobre a causa de fuzilamento, o coronel Francisco de Sá Roriz, a Mundinha, ao visita-la em Macapá, que os situacionistas de Jardim haviam subornado Veríssimo com Cinco Contos de Réis para eliminar Marrocos. Para termos uma noção hipotética, 01 Conto de Réis (Mil Mirréis), equivale hoje a R$ 123.000,00 (cento e vinte e três mil reais).
Mundinha Piancó ficou viúva aos 26 anos e com 06 filhos para criar. Faleceu aos 92 anos no estado de São Paulo. A perversidade insana dos velhacos tenentes José Gonçalves Bezerra e Veríssimo Alves Gondim estremunharam, mais ainda, a aversão popular à polícia. O tempo, contudo, se encarregaria de revidar, nas pessoas deles, as mortes bárbaras de Antônio Marrocos, Antônio Grangeiro, Chico Chicote e dos demais que foram trucidados covardemente na hecatombe do começo de fevereiro de 1927.
Decorrido um decênio, na verdade, aos 10 de maio de 1937, José Bezerra, já com a patente de Capitão, seria trucidado, no Cariri ou, mais precisamente no sítio Conceição, próximo às comunidades Mata dos Cavalos e Curral do Meio, no município de Crato, por ocasião de luta com fanáticos remanescentes do beato José Lourenço Gomes da Silva, dentre os quais morreram alguns. A golpes de facões, roçadeiras, foices, cacetes e a tiros de espingardas e pistolas, tombaram o sanguinário oficial, um filho (1º Sargento Anacleto Gonçalves Bezerra), um genro e mais dois policiais subalternos. Dentre os comandados, outros saíram feridos. Mesmo assim, à morte do Capitão seguiu-se o bombardeio na Serra do Araripe, autorizado pelo Ministro da Guerra, General Eurico Gaspar Dutra. Entre 700 a 1.000 pessoas foram mortas. E, assim, se findava um dos maiores bandidos-autoridades de que já se teve notícia no Ceará.


Um lustro antes do capitão José Bezerra, já havia embarcado seu comparsa, tenente Veríssimo Alves Gondim. Em Lavras da Mangabeira, metera-se o tenente Veríssimo a afrontar e humilhar o coronel Raimundo Augusto Lima, filho do coronel Gustavo Augusto Lima e neto de Fideralina Augusto Lima, destronado pela Revolução de 30. Lá chegara, inclusive, com ordem de, a todo custo, conduzi-lo, algemado, a Fortaleza. A vingança, porém, não tardaria muito.
Com efeito, aos 26 de junho de 1932, o oficial era alvejado, nas costas, pela arma do coronel, tal como fizera ele próprio a Antônio Marrocos, minutos antes do Fogo das Guaribas, havia cinco anos. Pôde, ainda, o militar moribundo balbuciar: “Que homem falso!” Estas palavras doridas, que tão bem se ajustavam a seu autor, o malogrado tenente Veríssimo, muito antes, poderiam ter sido articuladas pelo desventurado Marrocos, também, no lance derradeiro. E quem sabe se as não teriam pronunciado? Quem sabe?
Bastante comentado, na época, o assassinato do tenente Veríssimo Alves Gondim. Sob os céus de Lavras da Mangabeira, todavia, nada de novo acontecera, senão a repetição da história.
Bruno Yacub Sampaio Cabral
A Munganga Promoção Cultural

O Brejo é Isso!

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FREI DAMIÃO

 Por José Mendes Pereira

Todos tiveram sortes com Frei Damião em Mossoró, menos eu, recebi um batido forte e como foi forte.

Lembro-me que na década de 70, em uma das suas missões em Mossoró, à noite, no largo da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, no grande Alto da Conceição, a fila de fiéis era enorme, e quando chegou a minha vez de ser abençoado pelo frei Damião, coloquei a minha mão sobre a sua cabeça. De repente com a sua mão, frei Damião tirou a minha mão que estava sobre a sua cabeça dizendo-me:

 "-Não ponha a sua mão sobre a minha cabeça!". 

Eu estranhei aquela atitude do religioso, vez que ele era e é considerado um verdadeiro santo entre os homens do nordeste brasileiro e de outras regiões do chão do Brasil.

Mas, posteriormente, não sei se era verdade, falaram-me que ele tinha sido advertido por um médico que tratava da sua escoliose, que não deixasse ninguém colocar a mão sobre a sua cabeça, porque aumentava mais ainda o problema. 

De fato! Uma, duas mãos sobre um corpo, não afeta. Mas milhares de mãos, mesmo uma de cada vez, na sequência, tem que pesar, e isso faz com que prejudique mais ainda o corpo que tem escoliose.

Mas nem por isso fiquei chateado com o religioso.

 O vídeo é de Chico Marques

https://www.youtube.com/watch?v=-e8m-r-AZ3M&ab_channel=ChicoMarques

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E MAIS ISAIAS ARRUDA DE CALIXTO JUNIOR

 Por Raul Meneleu Mascarenhas


O livro é dividido em duas partes, sendo que a primeira, trata da vida de Isaías Arruda, a segunda, sobre a sua morte e o que se deu depois. Nesse livro o Confrade João Tavares Calixto Júnior, caririense de Aurora no Ceará, que em sua formação acadêmica no sentido profissional é Professor Doutor na Universidade Regional do Cariri - URCA, Conselheiro do Cariri Cangaço e membro de diversas agremiações culturais onde recentemente foi convidado para a Academia Brasileira de Letras e Artes do Cangaço – ABLAC. É autor de diversos livros, conforme relação em sua biografia.
Pois bem, em "Vida e morte de Isaías Arruda - Sangue dos Paulinos, abrigo de Lampião" Calixto alcança ações do Coronel Menino com uma pesquisa profunda, como faz em seus demais escritos, trazendo o mundo do cangaço no Cariri Cearense, com nomes e ações de cangaceiros, que a maioria dos estudiosos da saga desconhece. Mostra ações dos diversos grupos de cangaceiros, inclusive o de Lampião com o famoso ataque à cidade de Mossoró, trazendo informes sobre outras autoridades mossoroenses que tiveram importância na defesa da cidade.

Calixto Junior, Raul Meneleu, Ingrid Rebouças e Jorge Remígio
Calixto também traz fotografias raras de cangaceiros e de influentes políticos da região caririense, não deixando de expor fotos da família do Coronel Isaias Arruda, como a de sua bonita esposa. Lemos nessa magnífica obra, que não pode faltar na biblioteca dos pesquisadores, a vida curta, porém influente e repleta de casos, de um Coronel sertanejo que atuou na política cearense, com ecos nos jornais de todo o país e que conquistou a patente na força da valentia e armas.
Tomou a prefeitura à bala, foi o primeiro Prefeito Eleito de Missão Velha e ficou conhecido como grande empreendedor. Tratado como Coronel até aos 28 anos de idade, quando foi morto a balaços por dois membros da família Paulino. O livro merece estar em destaque nas nossas bibliotecas. Parabéns Confrade João Tavares Calixto Júnior!

Raul Meneleu, pesquisador e escritor
Conselheiro Cariri Cangaço
Aracaju SE.

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1929: HÁ 90 ANOS LAMPIÃO INVADIA QUEIMADAS , SAQUEAVA A CIDADE E PRATICAVA ORGIA DE SANGUE.

 Por Oleone Coelho Fontes

Artista Jesualdo Cândido

Véspera de Natal de 1929, um domingo, 23 de dezembro. Lampião acompanhado de 17 malfeitores assaltou a heroica cidade de Santo Antônio das Queimadas, na Bahia, e, covardemente, comandou um festival de derramamento do sangue de 5 soldados da polícia baiana. Fuzilou friamente os militares pegados de surpresa, em seguida assistiu um filme no cinema, organizou um baile com as moças da sociedade, arrecadou mais de vinte contos de reis, fez autoridades judiciárias e políticas passarem por constrangimentos e humilhações e escreveu num quadro-negro bilhete desaforado para o governador da Bahia, Vital Soares. Se disse governador do sertão e estar engordando desde que começou a ser perseguido e até já pensava em casar. Os delinquentes deixaram, pela madrugada, totalmente embriagados, uma comunidade traumatizada, como se nada de anormal houvesse ocorrido naquele domingo.
A irrupção na outrora Vila Bela de Santo Antônio das Queimadas teve início na fazenda Parelha, de José Lúcio da Silva, em Cansanção. Lúcio foi intimado a servir de guia até a sede do município. Na cidade de Cansanção, o falso capitão com falsa patente de oficial do Exército (recebida em 1926, no Juazeiro do Norte, Ceará), à testa de quase duas dezenas de bandidos, botou abaixo portas de vendas, armazéns e lojas, levou a cabo uma geral pilhagem. Não satisfeitos em abrir frascos de perfumes e derramar o líquido sobre suas roupas os ladrões deram banho de água de cheiro nos cavalos. Mercadorias foram distribuídas arbitrariamente com os que não tiveram tempo de fugir. Determinou o chefe da gangue que caminhão do IFOCS, (Inspetoria Federal de Obras contra as Secas, atual DNOCS) conduzisse a caterva até a vizinha Queimadas.

Oleone Coelho Fontes e Manoel Severo no Cariri Cangaço Poço Redondo, 2018

Em Queimadas o grupo foi estrategicamente dividido em duas alas. Uma se apoderou da estação ferroviária, deu voz de prisão ao chefe e ao telegrafista, cortou os fios do telégrafo. Outra ala, Virgulino à frente, tomou de assalto, o quartel, trancafiou os soldados e soltou os presos.
Ao final da tarde os soldados foram fria e barbaramente fuzilados, sem direito a defesa, pessoalmente por Lampião e outros bandidos, entre os quais Volta Seca que, segundo testemunhas, teria limpado com a língua a lâmina do punhal.

Soldados assassinados: Olímpio B. de Oliveira, Aristides Gabriel de Souza, José Antônio Nascimento, Inácio Oliveira, Antônio José da Silva, Pedro Antônio da Silva e o anspeçada Justino Nonato da Silva. Relação publicada em boletim da Polícia Militar. O sargento Evaristo Carlos da Costa, comandante do destacamento, foi salvo por um trancelim. Na residência de D. Santinha, batizada Austrialina, Lampião elogiou joia de ouro que a senhora da sociedade queimadense portava no pescoço. D. Santinha prontamente retirou o pingente e ofereceu ao bandoleiro. Este, para se mostrar grato, declarou que lhe podia fazer um pedido. Dona Austrialina pediu pela vida do sargento Evaristo pondo em relevo seus atributos de homem religioso e que jamais perseguira cangaceiros. Constrangido, Lampião disse garantir a palavra e que “bandido também tem palavra”. Reparem que ele próprio se reconhece bandido, e hoje, passados 81 anos de sua morte, grande número de lampionófilos negam, chamando-o apenas de cangaceiro.

Oleone Fontes, José Edson, Bezerra Irmão e Leandro Cardoso no 
Cariri Cangaço Floresta 2017

Quando adolescente conheci Evaristo Carlos da Costa na cidade de Santa luz, reformado da Polícia e proprietário de uma venda que ele e os amigos chamavam de espelunca. Avesso a repassar o trágico episódio, Evaristo, por ter sido amigo de meu pai, Paulo Martins Fontes, e servido com meu avô, João Martins Fontes, em Bonfim, no destacamento policial, me concedeu entrevista que merece ser lida em Lampião na Bahia, em 11ª edição. Este facínora sanguinário, cruel, covarde e desumano, responsável por terror, tortura, saque e depredações implementados nos sertões do Nordeste, pretensos historiadores insistem em considerar herói.

Oleone Coelho Fontes, escritor de ficção, historiador, estudioso de temas nordestino, colaborador de A Tarde.
Salvador - BA.

https://cariricangaco.blogspot.com/2019/12/1929-ha-90-anos-lampiao-invadia.html

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LAMPIÃO NA BAHIA.

 

Luiz Ruben

O que a imprensa registrou na época em que Lampião agiu na Bahia. Resultado de aproximadamente 150 mil páginas dos jornais: A Tarde, Diário da Bahia, Diário de Notícias, Era Nova, O Imparcial, do período de 1928 a 1940. Este livro tem no seu início, o Jornal O Povo, de Fortaleza no Ceará, apresentando uma reportagem datada de 4 de junho de 1928, setenta e oito dias antes da decisão de Lampião entrar na Bahia. Esta matéria dá uma visão da situação do chefe cangaceiro e de seu exíguo grupo ao fugir para o nordeste baiano.

Textos transcritos com a ortografia atual. As palavras em inglês foram aportuguesadas ou traduzidas, para melhor compreensão. No final das matérias do ano 1928 e no final do livro iconografia apresentando páginas dos jornais e de recortes. As notícias que a imprensa publicava sobre Lampião tinham seu nome sempre grafado "Lampeão", como mostram as fotos. Os jornais também grafavam Virgulino, embora o registro de batismo e nascimento estejam grafados com (o) Virgolino.


As localidades que tiveram seu nome modificado ao longo dos anos também foram atualizados. As matérias publicadas sobre Lampião pelos diferentes jornais, com o mesmo assunto é uma prova do interesse que o público baiano começou a despertar quando da chegada de Lampião na Bahia. Manchetes abrangendo o período de 23 de agosto de 1928 até 28 de dezembro de 1929. A primeira foi divulgada pelo Jornal A Tarde em 23 de agosto de 1928 com a seguinte manchete “Quem é Vivo... O grupo de Lampião ruma para a Bahia”.

Verão que o secretário de segurança pública, senhor Madureira de Pinho, acusa o jornal Diário de Notícias de ser seu inimigo, dando assim uma cobertura das tropelias de Lampião, desfavorável ao seu governo, mas os fatos noticiados mostravam a ação de Lampião. Não existia um jornalismo investigativo sobre a presença de Lampião na Bahia, as matérias publicadas nem sempre eram assinadas pelos jornalistas, os periódicos da capital não focavam apenas as manchetes, mas também opiniões, comentários e editoriais.

Serviço
"Lampião conquista a Bahia" - Luiz Ruben F. de A. Bonfim
Edição do autor - 422 págs.
Pedidos: graf.tech@yahoo.com.br
ou (75) 3281 - 5080


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O ATAQUE DE LAMPIÃO A UIRAUNA - PB.

 Por Sérgio Dantas

Alguns dos defensores de Uiraúna. Ao centro, de paletó escuro, Luiz Rodrigues. Na extrema direita, sentado, o Subdelegado Nelson Leite.

Uma vitória da inteligência sobre a força

Há meses Lampião sumira dos noticiários dos jornais. O ano de 1926 encerra-se sem grandes novidades sobre a horda do famoso cangaceiro de Vila Bela. Bem instalado e seguro no ‘coito’ da Serra do Diamante, do poderoso Coronel Isaías Arruda, Lampião sai da aparente inatividade apenas em fins de abril de 1927. Naquele fim de mês, o bandoleiro deixa o refúgio e pratica assaltos em pequenos vilarejos situados na região noroeste da Paraíba, entre os municípios de Cajazeiras e São José de Piranhas. São ataques rápidos, com vistas apenas ao saque. A proximidade desta parte da Paraíba com o valhacouto do ‘dono’ de Missão Velha facilita sobremaneira a ação do bando.

De fato, no dia 15 de maio daquele ano, liderando uma falange de cerca de trinta e cinco homens, Lampião se prepara para tomar de assalto a Vila de Belém do Arrojado - atual cidade paraibana de Uiraúna. Há dias que ‘olheiros’ residentes em sítios da fronteira já haviam sondado o vilarejo e o cangaceiro – decerto bem ciente das condições do lugar – crê que tem plena chance de sucesso na empreitada que pretende levar avante.

o Arruado de Belém situa-se junto à fronteira do Rio Grande do Norte e é então inexpressivo. Ali não há mais que cento e trinta casas e uma igreja singela. Comércio pobre ou quase inexistente. Também ali não está destacado sequer um contingente policial para manutenção da ordem ou para oferecimento de uma defesa – mesmo que acanhada – no caso de um eventual ataque de cangaceiros. A ‘ordem’ no povoado é garantida somente por um Subdelegado civil, o potiguar Nelson Leite. Apesar de reiteradas notícias sobre incursões de cangaceiros naquela parte da Paraíba nos últimos dias, o Governo do Estado parece ignorar os eventos propalados pelos jornais e pela boca do povo. Apesar de vários reclamos por parte de proeminentes de Belém, o Estado não enviara tropa regular para a localidade.



o início da tarde daquele dia 15 de maio, no entanto, o sertanejo Leonardo Pinheiro percebe a marcha de cangaceiros em direção a Belém. Sem demora, espora o cavalo e entra no povoado em sonoro alarde:

-“Vem cangaceiro por aí! Vem cangaceiro por aí! Parece que é Lampião e não está a mais que umas duas léguas!”

Enquanto a horda marcha em busca do vilarejo, Nelson Leite se apressa em organizar uma defesa. Sangue quente, cioso de suas obrigações, Leite parece disposto a sacrificar a própria vida na defesa da comunidade que lhe fora confiada.

Abandonados à própria sorte, os habitantes de Belém – incentivados por Nelson Leite - tratam de se armar e garantir a resistência do lugar. Civis são convocados e há mesmo os que comparecem voluntariamente para pegar em armas. Ao final do rápido recrutamento, chega-se à desanimadora soma de onze homens apenas. Um contingente ínfimo que tentará rechaçar um bando com cerca de trinta e cinco cangaceiros. Uma luta desigual – se considerarmos a proporção de três bandoleiros para cada defensor e a falta de experiência de guerrilha dos citadinos. Por volta das dezessete horas, finalmente, Lampião avizinha-se da Vila. O frágil agrupamento de casas lhe parece excessivamente frágil e torna-se ainda mais amiudado pela sombra da serra de Luís Gomes, não muito distante dali. “Um alvo fácil”, provavelmente terá pensado o poderoso cangaceiro. O desenrolar dos fatos, porém, lhe revelará um grave erro de prognóstico.

Em que pese a correria desenfreada que se seguiu ao alarma dado por Leonardo Pinheiro, os homens de Nelson Leite aprestam munição e armas. Tudo é feito com rapidez e disciplina.Ao mesmo tempo, mulheres, velhos e crianças – a seguir igualmente os apelos do Subdelegado – buscam refúgio na caatinga ou em sítios de familiares fincados nos arredores de Belém. Pequenos “tesouros” são previamente enterrados em lugares seguros. Potes de barro, caixas de papelão, latas de querosene: qualquer coisa serve como invólucro para as ‘economias’ adquiridas ao longo de anos de trabalho.

Em pouco tempo, os defensores se organizam e estão posicionados em lugares previamente definidos pelo Subdelegado. Dedos nervosos aguardam o desfecho do ataque. Uma testemunha registra os momentos iniciais do entrave:

“O ‘delegado’ Nelson Leite distribuiu uns homens nos pontos mais altos da rua principal, dois outros guarnecendo as laterais e três instalados no teto da Igreja. Quando Lampião entrou com o bando, pela ‘rua velha’, começou a fuzilaria”. (Sinforosa Claudina de Galiza, entrevista).

Nelson Leite, de fato, engendrara bom plano. Distribuíra os poucos rifles e fuzis disponíveis com os onze defensores. Repartiu com irrepreensível parcimônia a rala munição que tinha ao seu dispor. Os melhores atiradores foram destacados para pontos estratégicos. Na teto da igreja - prédio mais alto e com abrangente visão dos arredores - posicionaram-se Luís Rodrigues, Moisés Lauriano, José Teotônio e Joaquim Estevão. O tempo corre lento. Não há novidades. Até perto das oito horas nem sinal da sinistra patuléia de chapéu de couro. A espera alongada transforma as trincheiras em ninhos de ansiedade.


Matriz Jesus, Maria e José, Uirauna atualmente.

De súbito, Luís Rodrigues dá o alarma. Alguém se aproxima. O luar denuncia vultos sorrateiros. Homens armados aproximam-se do povoado pela ‘rua da Proa’. É o início da invasão. De pronto, grande incêndio ilumina a noite na pequena Belém. Grossas labaredas passam a consumir a casa de um agricultor e espalham-se rapidamente para um antigo curral e plantação de milho já há dias quebrado. O incêndio. Método infalível para incutir terror aos sitiados.

Josefa Augusta Fernandes, bem jovem à época do evento, anota a origem do fogaréu:

"Lampião começou destruindo a propriedade do finado João Gabriel, tendo em seguida tocado fogo nos currais e nas plantações de feijão e milho. O fogo serviu para alertar os homens da cidade, sendo que eles já estavam em posição nos principais pontos daqui”. (Maria do Socorro Fernandes, entrevista).

Não havia mais o que esperar. Ao primeiro grito de comando de Nelson Leite, trava-se pesado tiroteio. Lampião, decerto, não esperava semelhante reação. A fantástica fuzilaria oriunda da Vila lhe faz recuar. De efeito, os tiros vindos da rua da Proa tornam inviável uma entrada por aqueles lados.

Sem sucesso na primeira investida, o chefe de cangaço tenta confundir os defensores entrincheirados. Sob sua batuta, os bandoleiros passam a gritar, urrar como animais e a praguejar insultos e xingamentos aos defensores e suas famílias. A permear a gritaria, grossas baterias de tiros.

O rei-do-cangaço deseja tomar Belém. Tentará de todas as maneiras penetrar no vilarejo para vilipendiar suas casas e lhes extrair até o último ‘cobre’. Sem demora, ordena aos comandados a ‘abertura’ de uma linha de fogo pela lateral, com o fito de invadir a Vila pelo flanco oposto.

Nada, entretanto, parece gerar resultado prático. A posição privilegiada dos atiradores locados no telhado da igreja permite que tiros sejam disparados em todas as direções. A resistência agiganta-se com estrondos de repercussão fantástica e de curiosa origem. Nelson Leite improvisara – no pouco tempo que dispôs antes da consecução do ataque - algumas “ronqueiras” e logo começou a fazer uso dos artefatos. Os estrondos causados pelas bombas caseiras são assustadores e surpreendentemente surtem efeito. Um simples improviso que, ao que tudo faz crer, parece realmente ser a chave para uma vitória. (1)

Em pouco, qualquer objeto metálico em formato cilíndrico - e vazado pelo menos em um dos lados - torna-se invólucro para manufatura dos pesados rojões. Joel Vieira, com dezoito anos à época do fato, registrou em depoimento:

“Os que estavam no alto da Igreja, começaram a atirar de ponto e também para dentro da igreja, causando um eco que parecia canhão. O Subdelegado também tinha improvisado umas ‘ronqueiras’, feitas com pólvora socada dentro de latas, e de quando em quando estourava uma. Já estava escuro, e aqueles tiros davam a impressão que havia um canhão com a gente”.

No alto da igreja, Luis Rodrigues - artilheiro mais aguerrido – resolve acrescentar estrondos adicionais aos estampidos das ‘ronqueiras’ improvisadas pelo Subdelegado. Dessa forma, com o intuito de causar impacto ainda maior, começa a atirar quase em paralelo à lateral da nave do prédio sagrado. Estrondos fantásticos, causados pelo eco do salão quase vazio, dão ainda mais ânimo aos outros defensores entrincheirados no teto da igreja. Decide-se que alguns deles, alternadamente, passarão a atirar também para dentro da nave.

A estratégia funciona. Os estrondos se multiplicam. De fato, para quem está do lado de fora, resta a impressão de que algum tipo de canhão está sendo utilizado. Os cangaceiros, atarantados, mantém posição de cautela e não avançam. O escuro da noite enevoada pela fumaça dos disparos os impedem de enxergar, na verdade, o tipo de “arma” adicional que ora se usa na defesa do arruado. O engodo paulatinamente funciona.

No calor da peleja, porém, passos apressados denunciam silhueta humana esgueirando-se próximo à igreja. A escuridão da noite não permite distingui-la com precisão. Da torre principal um defensor atira. O civil Antônio Correia é atingido. Confundiram-no com um cangaceiro. Correia morre pouco tempo depois em razão do profundo ferimento à altura do pulmão. É a única baixa durante o combate.

Os cangaceiros não desistem e tornam a investir contra o território inimigo por uma ruela lateral à igreja. Lampião brada ordens aos seus homens. Todos, contudo, parecem hesitar em razão dos estrondos que continuam a reverberar entre as casas da pequena Belém.

Do lado dos defensores, um voluntário prontifica-se para preparar novas ronqueiras, de forma ininterrupta, servindo-se como espécie de municiador.

Dominado pela ira, Lampião manda reacender o fogo que arde tênue na propriedade de João Gabriel. O vento rapidamente espalha as labaredas em espantosa velocidade. As chamas consomem vacas e bezerros cativos no cercado contíguo a casa. Urros de dor de animais engolidos pelas chamas desenham dantesco suplício. Poucos escapam ao bizarro holocausto.


A derradeira tentativa de conquista do povoado fracassa. Com pesar, os cangaceiros reconhecem que não conseguirão penetrar em Belém.

O desconhecimento dos pontos de defesa, o espocar das “ronqueiras”, o ribombar de tiros reverberados pelo salão da igreja, a configuração física da vila, o cansaço da longa marcha até ali. Tudo parece sugerir uma retirada. Lampião não demora em perceber o malogro da empreitada:

- Vamos sair para economizar munição! – grita furioso.

Ainda se ouvem tiros por mais um quarto de hora. Aos poucos os cangaceiros se retiram do campo de luta. Disparos tornam-se esparsos. Ao compasso da retirada, a fuzilaria regride até reinar o mais absoluto silêncio. Lampião e seus homens deixam Belém em definitivo. É ainda Joel Vieira quem destaca:

“Eles tentaram muito, mas não conseguiram entrar. Antes das sete horas da noite, já tinham ido embora. No dia seguinte, o festejo foi grande, pois todos pensavam que ia morrer muita gente, mas não. Apenas um rapaz morreu vítima de uma ‘bala doida’ e caiu ali perto da Igreja. Tirando o incêndio na propriedade de João Gabriel, o prejuízo aqui foi pouco. Com pouco recurso, a gente botou Lampião prá correr!”.

E Lampião, de fato, jamais voltou a Uiraúna. Nos dias seguintes, um telegrama é enviado para as principais cidades do sertão do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. Anunciava-se a vitória de um povo contra o poderoso rei do cangaço. O Intendente local assinou o comunicado:


“Fomos atacados dia 15 famigerado Lampião. Resistimos cerrado fogo, bandoleiros recuaram. Vítima tiroteio Antônio”. (a) José Caboclo.

É a vitória inconteste de um sumário grupo de cidadãos contra quase quarenta cangaceiros. Uma vitória nascida da confiança de homens do povo; sertanejos comuns. Não houve – como aconteceu em Mossoró – um grande lapso de tempo para a preparação de uma defesa. Não houve reuniões; não se teve tempo para comprar armas modernas. Não havia sequer uma torre na igrejinha da cidade. Existia, apenas, a vontade de preservar os próprios lares.

Uiraúna se defendeu heroicamente, a exemplo da resistência mostrada pela pequena Nazaré, em Pernambuco, quatro anos antes. Uiraúna impediu a entrada dos cangaceiros de Lampião como faria a população sergipana de Capela, liderada pelo destemido Mano Rocha, três anos mais tarde.

A vitória do povo de Uiraúna foi obtida sem recursos, sem alarde e sem exploração midiática posterior. Vitória conseguida sem um ‘notável planejamento prévio’ e sem colóquios barulhentos. Vitória de um pequeno grupo de homens pegos de surpresa pelo maioral do cangaço. Vitória, porém, recheada de atos do mais real e verdadeiro heroísmo. Vitória, enfim, da inteligência sobre a força.

Sérgio Dantas

Sérgio Augusto S. Dantas é autor dos livros “Lampião no Rio Grande do Norte – A História da Grande Jornada” (2005), “Antônio Silvino – O Cangaceiro, o Homem, o Mito” (2006) e “Lampião: Entre a Espada e a Lei” (2008).

NOTA:
(1) s.f. – Ronqueira: “Cano de ferro, preso a uma tora de madeira e cheio de pólvora, o qual produz grande detonação quando se lhe inflama a escorva”. (Aurélio). As ronqueiras já haviam sido largamente usadas em revoltas populares, como na guerra de Canudos. N do A.

FONTES UTILIZADAS:
A União, edições de 17 e 18 de maio de 1927.
DANTAS, Sérgio Augusto de Souza. LAMPIÃO NO RIO GRANDE DO NORTE – A HISTÓRIA DA GRANDE JORNADA. Editora Cartgraf, Natal/RN. 2005. 452 pgs.
SOUZA, Tânia Maria de. UIRAÚNA NO ROTEIRO DE LAMPIÃO, in Revista Polígono, 1997, 158 pgs.
Entrevistas concedidas ao autor por Maria do Socorro Fernandes (2003), Joel Vieira da Silva (2001), Josefa Augusta Fernandes (2000) e Sinforoza Claudina de Galiza (2000).

https://cariricangaco.blogspot.com/2009/12/o-ataque-de-lampiao-uirauna-porsergio.html

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