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domingo, 22 de setembro de 2013

Ideias defendidas pelo escritor Josué de Castro permanecem vivas 40 anos após a sua morte

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Escritor morreu em 24 de setembro de 1973
Publicado em 22 de Setembro de 2013 - por Redação

Escritor morreu em 24 de setembro de 1973. Amanhã, 24 de setembro, completam-se 40 anos da morte de Josué de Castro, médico, professor, geógrafo, cientista social, político e escritor. Mesmo passadas quatro décadas de seu falecimento, os ideais do ativista brasileiro que dedicou sua vida ao combate à fome continuam vivos, sendo disseminadas por todo o mundo.

“Milhões de pessoas padecem de fome no planeta, razão pela qual as ideias de Josué de Castro continuam atualíssimas. A fome se intensificou no planeta, invadindo inclusive áreas do mundo desenvolvido. Faltam alimentos na mesa da população. A palavra de ordem é ênfase ao agrobusiness em detrimento da agricultura familiar”, destaca o professor José Romero de Araújo, pesquisador da vida e obra de Josué de Castro.

Autor de uma extensa obra que inclui "Geografia da Fome", escrita em 1946, e traduzida para 25 idiomas, com ideais apontando que a fome é um produto de estruturas defeituosas, fabricada pelo homem contra o próprio homem, e que somente com amor e solidariedade se pode superar os contrastes, Josué de Castro exerceu ao longo de sua vida importantes funções, como a presidência do Conselho Executivo da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), e embaixador brasileiro junto à Organização das Nações Unidas (ONU).

Considerado o grande apóstolo do século XX, Josué escreveu ao longo de sua vida 28 livros, sendo detentor ainda de títulos como "Cidadão do Mundo", concedido pela França, onde foi exilado após ter que deixar o Brasil no período da ditadura militar, e do prêmio internacional da paz, conquistado na Finlândia.

“Diversos países, como o Brasil, quando do lançamento de ‘Geografia da Fome’, em 1946, e ‘Geopolítica da Fome’, em 1951, eram eminentemente agrários e rurais, com mais de 80% da população habitando o campo. Esses países localizados principalmente no terceiro mundo urbanizaram-se rapidamente pós-segunda grande guerra. Milhões de pessoas padecem de fome no planeta, razão pela qual as ideias de Josué de Castro continuam atualíssimas”, afirma José Romero Cardoso.

Professor da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), José Romero Cardoso começou a pesquisar a vida e obra de Josué de Castro quando leu uma edição portuguesa de “Geografia da Fome”. “Eu encontrei essa relíquia em um sebo em João Pessoa, capital paraibana. Era o final da primeira metade da década de 1980. Os resquícios da ditadura militar ainda estavam bastante ativos e Josué de Castro e suas ideias eram temas proibidos. Infelizmente Josué de Castro e as bases do seu pensamento ainda são desconhecidos da maioria dos brasileiros. O trabalho de exclusão efetivado pela ditadura militar primou pela impecabilidade das ações nefastas de ocultação do nome, das ideias e das lutas do nosso mais importante cientista”, pontua o docente.

Entusiasta das ideias de Josué de Castro, José Romero é idealizador do projeto de extensão "Discutindo a importância da atualidade do pensamento de Josué de Castro em escolas públicas municipais e estaduais de Mossoró", executado desde 2008. “O projeto continua, mas está encontrando dificuldades para ser posto em prática em razão da ausência de incentivos institucionais e também em razão da ausência de esclarecimento por parte de muitos gestores escolares”, conclui.

FONTE: 
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Enviado pelo professor e pesquisador do cangaço José Romero Araújo Cardoso

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Grota de Angico onde Lampião foi assassinado

Grota de Angico onde Lampião foi assassinado

Durante vinte anos, foram várias as investidas realizadas pelas polícias de Alagoas, Pernambuco, Bahia, Sergipe, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará sem êxito, até o dia 28 de Julho do ano de 1938, quando uma volante composta por 49 homens, comandada pelo Tenente PM João Bezerra da Silva, na época delegado e morador do município de Piranhas/AL, auxiliado pelo Aspirante a Oficial PM Ferreira de Melo e o Sargento Aniceto Rodrigues e mais quarenta e seis homens, munidos de fuzis e metralhadoras, conseguiram acabar de vez com Lampião e seu bando.

Tenente João Bezerra à esquerda, Aspirante Ferreira de Melo e Sargento Aniceto Rodrigues.

Após dias no encalço e com informações detalhadas sobre a localização dos cangaceiros, colhidas de um cidadão chamado 

Pedro de Cândido à esquerda - Acervo do escritor e pesquisador do cangaço João de Sousa Lima

Adendo - Blogdomendesemendes

"Pedro de Cândido foi considerado traidor. Mas será que ele foi realmente um traidor, levando pancadas e mais pancadas, unhas arrancadas..., humilhado pelos policiais? Quem está de fora diz isso. Mas quem é a vítima entregará até o presidente da república".

Pedro Cândido, no município alagoano de Piranhas, a Volante da PMAL fez então o cerco e, durante às quatro horas daquela madrugada de quinta-feira, no atual município de Poço Redondo, antigo distrito de Porto da Folha, Estado de Sergipe, em um esconderijo no lugar chamado Grota do Angico, começa a batalha que põe fim à vida de Lampião, sua companheira Maria Bonita e mais nove cangaceiros, deixando ainda o militar Adrião Pedro de Souza morto, e mais dois feridos, entre eles o Tenente João Bezerra.

Volante de Alagoas que matou Lampião pousando diante dos cangaceiros mortos

Mais ou menos trinta dias depois do massacre de Angicos, a maioria dos cangaceiros remanescentes de outros bandos já haviam se rendido, permanecendo na ativa apenas os grupos de Labareda e de Corisco (que era natural de Água Branca/AL), mas sem realizarem grandes ações, sendo este último morto em 25 de maio de 1940, fechando então o ciclo do cangaço no Nordeste.

Notícia publicada a nível nacional sobre o combate contra os cangaceiros

Entrevista concedida por João Bezerra ao jornal "A Noite" na época.

Após o massacre, como de costume na época, para provarem o grandioso feito, os cangaceiros tiveram suas cabeças decepadas e expostas em várias cidades de Alagoas, seguindo após para Salvador/BA e de lá para o Rio de Janeiro, de onde retornou à capital baiana para a realização de estudos científicos.

Fonte:
http://www.pm.al.gov.br/3bpm/joao.html

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Escola Esadual Jerônimo Rosado

tribunadonorte.com.br

A Escola Estadual Jerônimo Rosado foi fundada no ano de 1959, com o nome de Instituto de Educação de Mossoró.

telescope.blog.uol.com.br

Depois passou para Colégio Estadual de Mossoró, Centro Educacional Jerônimo Rosado e nos dias de hoje é: Escola Estadual Jerônimo Rosado. Nas últimas  cinco décadas educou uma grande parte do povo mossoroense.

 
eejrosado.blogspot.com

É a maior escola pública de Mossoró, com mais de 20 salas de aula, e todas são grandes, com auditório, quadra de esporte, e duas rampas para ter acesso às classes. Vale a pena ser aluno dessa escola pública.

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COBLA PLETA OU A CORAGEM DO TOTONHO


Luiz Gonzaga dizia que todo menino que nasce no sertão e não é vitima da opressão de senhores arrogantes tem uma infância feliz. Mesmo que passe privações tem diante de si o recanto mais lúdico e encantado de todo o Universo. Quem sou eu para contrariar essa afirmativa do saudoso Rei do Baião… Tive uma infância parecida com a dele nas brincadeiras, nos folguedos, na religiosidade. Talvez um pouco mais farta e despreocupada, pela condição econômica de meu avô que era comerciante e pequeno agropecuarista. Guardo desse período as mais gratas lembranças, relicário de imagens, saberes e lições que moldaram a minha personalidade pelo resto da vida, desde o gosto literário e musical até a minha postura diante dos desafios da vida. Quando trabalhei como redator e designer gráfico em agencias de propaganda de Fortaleza os colegas costumavam brincar:

- Ô bicho matuto… Este cabra saiu do sertão, mas o sertão não saiu dele!

Diziam em tom de mofa, cobrando uma urbanização, uma pasteurização de costumes que eu jamais almejei, por isso a minha resposta era sempre a mesma:

- Eu sou o Sertão! Matuto, graças a Deus!

Prosear no alpendre, depois da janta, era um costume secular no sertão de outrora, coisa que foi desaparecendo gradativamente com a chegada da eletricidade, dos aparelhos de TV e das antenas parabólicas, gigantescas “urupemas” que infestam desde as opulentas casas-sede de fazenda até os casebres mais simplórios. Com o advento do Funrural, instituído no início da década de 1970 e os programas sociais do Governo, todo mundo possui moto, geladeira, aparelho de TV, telefone celular (mesmo que não pegue), computador e as indefectíveis parabólicas. É como diz o Gilberto Gil na canção ‘Parabolicamará’:

Antes mundo era pequeno
Porque Terra era grande
Hoje mundo é muito grande
Porque Terra é pequena
Do tamanho da antena
Parabolicamará…

ftb
Foto: Blog do Macário Batista

Se há um lado positivo, pela melhoraria da qualidade de vida das pessoas e acesso ao consumo, por outro lado as tradições estão escoando pelo ralo e as novas gerações sertanejas, em muitas localidades, são compostas por jovens indolentes, alienados, arrogantes em sua maioria e, de certo modo, parecidos com os malandros da periferia das grandes cidades. Copiam a roupa, o modo de andar, as gírias, o (des)gosto musical e outros hábitos menos recomendáveis.

velhinha - parecida com a BASTIANA

Mas voltemos ao alpendre de meu avô; deixemos tais elucubrações para os historiadores e sociólogos de plantão. À noitinha, depois da ceia, filhos, netos, vizinhos reuniam-se no alpendre da casa de meus avós para um animado bate-papo, onde não faltavam histórias de caçadas, viagens, relembranças de tempos distantes, amenidades do dia-a-dia e novidades que chegavam pelo rádio. Mas a modalidade mais aterradora de todas (pelo menos para mim) eram as histórias de assombração, cobras venenosas e discos voadores. Eu tinha muito medo de alma, de coisa do outro mundo, mas tinha mais medo ainda do tal disco voador, que os matutos descreviam como uma luz que perseguia as pessoas para chupar o sangue e as cobras venenosas, cascavéis principalmente, que ficaram nas veredas enrodilhadas a espreita de uma vítima. E tinha a história de um ateu cujo caixão pesara meia tonelada na hora do enterro e que ainda por cima virara um bicho, depois de sepultado, sendo necessário colocar uma jaula sobre a catacumba. A velha Bastiana, torradeira de café, jurava que era verdade. Quem ousava duvidar?

Que tortura, ir deixar um cavalo no cercado à noite, mesmo que houvesse lua cheia. Essas lembranças logo vinham à tona, o serviço era feito às pressas, sob clima de terror. Na ida, montado no animal, até que restava um pouco de coragem, mas a volta eram outros quinhentos. O cabra vinha correndo em desabalada carreira e quando chegava no terreiro de casa, sentava um pouco para serenar a respiração e não denunciar o medo que sentia.

Sabendo que eu era medroso confesso, meu avô raramente me incumbia de tarefas como esta. Cabia geralmente aos primos Dário José e Walberto, que tinham fama de corajosos, mas que certamente também tinham medo de tais marmotas. Eles ficavam felizes e empavonados quando meu avô lhes gabava a coragem:

- Cabra macho! Esse é homem mesmo! Foi sozinho deixar o cavalo no cercado e voltou nas mesmas pisadas…

O velho sabia como mexer com os brios do suposto corajoso. Éramos, ao todo, morando na casa grande ou nas imediações, mais de vinte netos, além de sobrinhos e agregados. Menino como o diabo, como dizia Luiz Gonzaga. Só o tio José Oswaldo tinha dez! De todos, o mais medroso era o Totonho. Se assustava até com a própria sombra, era raquítico, miúdo, embora fosse um dos mais velhos da turma. Tinha a fala meio atrapalhada e batia os olhos em sistema pisca-pisca, quando estava aperreado. Foi vítima de uma das muitas travessuras que aprontei na infância.

Remexendo pelo armazém da casa velha, onde dormia o João, empregado de meu avô, encontrei uma velha câmara de ar de pneu de bicicleta, a qual, de tanto remendo, havia sido descartada. De parelha com meu primo Dário José resolvi pregar uma peça no Totonho, que morria de medo de cobras. Cortamos o pneu, enchemos de ar e amarramos com liga nas duas pontas, de modo a parecer uma serpente, uma cobra preta, para ser mais preciso. 

E colocamos a danada na vereda que o Totonho palmilhava toda noite, por volta das seis meia, para vir tomar uma coalhada que a vovó lhe oferecia. Dito e feito. Eu já estava meio esquecido da armadilha quando ouvi um grande alarido, um terrível alvoroço no alpendre, que já estava cheio de gente. O menino chegou branco dar cor de um finado e levou uns três minutos para recuperar a fala, aterrado, transido de susto. Depois de beber sofregamente alguns goles de garapa de açúcar resolveu abrir o par de queixos:

cobra

- Vo- Vovô! Ali tem uma cobla pleta! Um cobla medonha, vovô!

Mané Lima levantou-se de um salto, deu de garra de um cacete de jucá e foi logo perguntando:

- Aonde, menino? Cadê essa cobra?

- A- acolá vovô, na valeda… (vereda)

- Pois vamos me mostrar!

A ordem era imperiosa. Mesmo morrendo de medo o Totonho sujeitou-se a ir apontar o local onde havia avistado o gigantesco ofídio. Na sua descrição media mais de três metros de comprimento! O Gabriel Lopes, marido de minha tia Heliodoria, seguiu com eles conduzindo um lampião a querosene. 

lampião

Chegando ao local, depararam com a tira de pneu e vovô não contou pipoca, desceu o pau na suposta serpente, com toda força do braço, a torto e a direito. Atoleimado, como costumava ser em situações desse tipo. Quanto mais ele batia, mas o pneu pulava e se retorcia, simulando os movimentos de uma cobra.

O Gabriel talvez até já tivesse percebido o engano, pois estava com o lampião e tinha a visão perfeita, mas divertindo-se com a situação, conseguia disfarçar o riso e dava corda no meu avô, para levar a cena adiante:

- Ô cobra dura de morrer, ‘seu’ Manoel, taca o pau nessa danada! Abarca essa bicha, arrocha, ‘seu’ Manoel!


Vendo os pulos da cobra, Totonho foi o primeiro a correr, de volta para o alpendre. Quando a farsa foi descoberta, todos riram a bandeiras despregadas, até mesmo meu avô, que tinha sido uma das vítimas do logro. O resto da noite foi só de “elogios” à coragem do Totonho.

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De Virgulino a Lampião - Sama Multimídia - Parte II



Quando no viço de seus dezessete anos, gostara Virgulino de uma jovem, Santina Lopes da Silva, a quem ele chamaria de Flor Mimosa do Sertão em formosos versos de fina sensibilidade amorosa. 

"Tive até meus amores
Cultivei a minha paixão
Amei uma flor mimosa
Filha lá do meu sertão
Sonhei de gozar a vida
Bem junto à prenda querida
A quem dei meu coração".

O porém da história foi ter aparecido um rapaz da mesma idade de Virgulino e parente de Zé Saturnino, o qual se tomou de paixão encegueirada pela mesma donzela, apesar de não correspondido e até mesmo repudiado por ela.  Num dia de sol ipiaça, arado pela roedeira do ciúme, foi o tal esperar Virgulino que ia em caminho do bebedouro da fazenda. Todo raposeiro, fez-lhe perguntas ciumentas, desafiando-o e arrepiando-se amolestado para cima de Virgulino. No entanto, não teve sorte nem sustança na empreitada: apanhou muito. Por esse motivo, ficaram os parentes do moço apanhado queixosos, ressentidos, abafados. Os recalques sertanejos se acentuam pelo isolamento em que vivem. Seu campo de imagens é reduzido ao pequeno e invariável mundo que os cerca, donde a facilidade de fixação de lembranças, principalmente dos fatos quentes. Não se esquecem de nada, seja o mal, seja o Bem. De uma faúlha tudo pode ser fatível. Mesmo de dentro da cinza podem ser gerados incêndios. Questão de oportunidade, somente.

De início estabeleceu-se a má vizinhança. De quando em vez, nas terras dos Ferreiras apareciam cabras surradas, bodes de orelhas cortadas, ovelhas com pernas quebradas ou simplesmente o sumiço de bodes e cabras. Daí sucederam-se, desavenças, insultos, provocações e brigas que a cada dia faziam aumentar ainda mais a tensão entre as partes adversas, passando as hostilidades a ter um caráter ostensivo, de atritos pessoais numa progressão perigosa e imprevisível de conseqüências.



Houve então uma causa determinante que transformaria Virgulino em Lampião. Zé Saturnino, já de caso pensado para uma invasão e tomada da fazenda Ingazeira (dos Ferreiras), construiu uma cerca para situar um roçado sobraçando bons pedaços de terra daquela fazenda. Os Ferreiras, certos de seu direito de propriedade, desmancharam a cerca. Nisso, o gado da Ingazeira, pastoreando por essa fronteira aberta, invadiu a área de Zé Saturnino. Este ordenou a um cabra seu, Olímpio Benedito: “Quando os Ferreira vinhé, junta o gado na broca, chame o Chico Morais Arves (outro cabra) e infinque bala neles. O rifle tá aqui no canto cum a cartucheira”.

No dia seguinte, 13 de outubro de 1917, pelas seis da manhã, os três irmãos, encourados em trajes de vaqueiro e desarmados, chegaram para rever o gado e na mesma hora Olímpio deu garra do rifle e deu três tiros com o objetivo de atingir os rapazes, só não conseguindo porque era a primeira vez que atirava com aquele tipo de arma. 

Em 14 de outubro houve troca de tiros, e no dia 15 rompeu um tiroteio violento e rápido, que durou de dez a quinze minutos, ficando, de início, Antônio Ferreira, o primogênito, ferido com um balaço que lhe pegou na região do apêndice. Retiraram-se os Ferreiras sem que os inimigos tivessem coragem de lhes seguir no encalço.

Pela primeira vez na vida Lampião atirava em gente! Contava ele dezenove anos.

José Ferreira tomou um burro e foi à cidade dar parte e instaurar processo contra as sucessivas ameaças e provocações de Zé Saturnino, culminadas com o baleamento de seu filho. Ora, a “justiça”, subalterna ao mais “forte”, sempre fugira de atender a um justo reclamo de sua alçada e que poderia dar cabo de tais malquerenças e estabelecer a paz em definitivo.
 
Diante do fracasso, voltou José Ferreira para casa, humilhado, desfazido, sofrido, e sem tino para encontrar solução. “A besta-fera se soltou” – exclamava D. Jacosa.

Maria Jacosa Vieira Lopes, 'Tia Jacosa' - avó de Lampião - fonte: Portal do cangaço

Foi quando os Ferreiras compreenderam que tinham diante de si um “terrível inimigo”,  o inimigo número um: Zé Saturnino. Na estrofe, sincera e sentida, que abre este capítulo, Lampião lamentou as imposições do destino.

Tamanha era a maldade e a insistência do terrível vizinho, tão vis os ultrajes à dignidade e tão baixos os insultos que aquele lhes desferia, que era difícil suportar tudo aquilo sem uma reação violenta, e só mesmo com muito amor ao sossego e vontade grande de viver em paz! José Ferreira, homem eminentemente pacífico, ponderou seriamente a precariedade de sua situação: os adversários apatacados, muito numerosos, com todo o apoio político, cheios de império, rancorosos e vingativos. Do seu lado, conhecia de sobejo a natureza de seus filhos, puxados à mãe, do sangue quente dos Lopes, indômitos e terríveis nas reações contra quem tentasse espezinhá-los, a ponto de lhe ser difícil, a ele, pai, contê-los, apesar de serem muito respeitosos e obedientes. Achou por bem sacrificar os seus precatos e mudar-se, mesmo na aventura da incerteza, para distante, esperando assim obter, dos antagonistas, a paz e o direito de trabalhar e viver como cristão.

Por iniciativa de Cornélio Soares, um amigo, para dar compensação de garantia a José Ferreira, estabeleceu-se um acordo mútuo entre as partes litigantes – os três irmãos Ferreira e Zé Saturnino com João Nogueira e seus dois filhos, Zé e Neneco - de não irem às ribeiras uns dos outros. Nenhuma restrição aos demais membros das famílias. Um leve sereno de esperança e paz parecia cobrir de refrigério o espírito de José Ferreira e de toda a gente daqueles esquisitos.

Nos começos de janeiro de 1918, José Ferreira, com grandes prejuízos, vendia sua parte na Ingazeira, mais uns tantos terrenos e bichos. Além do sinal, nada mais o velho Zé Ferreira recebeu! Pela derradeira vez, circunvagueou o olhar marejado em volta, fazendo cera na contemplação daqueles chãos que traziam o sinal e as marcas de seu coração: sua primeira propriedade, o início de sua vida independente, o recanto de suas labutas e sonhos, o berço de seus amores representados por sua esposa e seus nove filhos...

Rumou a família para Poço do Negro, distrito de Floresta. No caminho, cada batida das apragatas era uma pancada no coração.  Ali, numa pequena casa de taipa se instalaram enquanto se faziam urgentes reparos na bastante deteriorada casa de alvenaria de tijolo da fazenda. Virgulino, com sua inteligência e habilidade para tudo, tomou parte nos consertos, improvisando-se de pedreiro.

Retomaram, José Ferreira e seus filhos, o ritmo normal de trabalho: campo e almocrevia. Contudo, cultivavam os Ferreiras a alegria de viver. Gente boa e amiga,  promoveram festas e casaram Virtuosa, todos anchos de felicidade, porque era o primeiro casamento na família.


CONTINUA...

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