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segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Filho de Lampião e Maria Bonita morre em Juazeiro do Norte Ceará.

Por Doizinho Quental


"Nota: O blog do Mendes e Mendes" não pode afirmar com clareza que o João Peitudo era mesmo filho de Lampião e Maria Bonita. Segundo alguns pesquisadores, afirmam, que não foi comprovado que o João Peitudo era mesmo filho do casal de cangaceiros. Mas o blogdomendesemendes respeita o que o Doizinho Quental escreveu"

João Ferreira da Silva, de 62 anos, filho de Lampião e Maria Bonita, morre  na madrugada do dia 26 de junho do ano 2000, de um infarto no miocárdio, na UTI do Pronto Socorro de Juazeiro do Norte Ceará.

João Peitudo, como era mais conhecido, era filho de Virgulino Ferreira da Silva, Lampião, Rei do Cangaço, o mais temível cangaceiro do Sertão Nordestino. Ultimamente, ele residia na casa de um filho, Francisco Ferreira da Silva, ( Rubens), sita à rua John Lennon, 37 ( Bairro do Pirajá) na cidade de Juazeiro do Norte, Ceará.

João Peitudo só passou, a saber, que realmente era filho de Lampião e Maria Bonita, com a idade de 19 anos.

Em meados da década de 1970, a mãe adotiva de João Peitudo, Dona Aurora da Conceição, sofreu um acidente e, como esteve prestes a morrer, decidiu revelar ao filho os seus verdadeiros pais. Em 1938, quando veio ao Cariri, o casal de cangaceiro deixou a criança de 42 dias de nascida para Dona Aurora criar e, antes de partir, furou as orelhas do filho. Com o passar dos tempos, João Peitudo dedicou-se à tarefa de provar que era verdadeiramente filho de Lampião, principalmente diante das constantes negativas de Expedita Ferreira Nunes a sua filha, quanto a paternidade.


A história ganhou destaque nos principais veículos de comunicação do Brasil. Só em abril de 1994, João Peitudo comemorou o resultado do exame de DNA, após a confirmação do laboratório norte-americano Lifecoades Corparation, de Stanford,  Massachusetts.. A partir daquele momento, o laudo médico passou a ser uma espécie de "documento de filiação" provando que João era filho legítimo de Virgulino Ferreira da Silva e Maria Déa, o qual fazia questão de apresentar para todos diante da resistência e protestos de Expedita Ferreira, residente em São Paulo. Antes, exames feitos na capital paulista já haviam atestado a paternidade.

Todos os exames realizados comprovaram que foram encontrados elementos genéticos comuns entre João e Expedita. Na época, ele trabalhava na Rádio Atual, de São Paulo, cujo proprietário José Masci de Abreu, patrocinou os primeiros exames. Com os resultados positivos, João Peitudo ganhou mais credibilidade na luta para provar que era filho de Lampião e passou a dar entrevistas e ser uma das atrações do Centro de Tradições Nordestinas de São Paulo, onde era vigilante. "A mãe que me criou não tinha revelado antes porque disse que tinha medo de me matarem". Justificava João Peitudo, nas entrevistas que concedia.

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Nazarezinho Parte II

Por Paulo Gastão

Paulo Gastão e Juliana Ischiara

Em determinado momento as famílias de Sigismundo e Pereira se cruzam quando seus filhos Raimundo e Vanice se casam e vão residir em Brasília nos seus primeiros anos de existência, já tendo se tornado a jovem Capital Federal. Não sabemos as causas durante passadas festas do Natal, Raimundo desapareceu e até hoje nenhuma notícia do seu paradeiro. Chico foi para Roma, tornou-se escritor, professor e jornalista. Consegue no final da vida transformar sua grande obra em peça de teatro. E assim Vingança, Não teve inicio a sua grandiosa caminhada. Pelos caminhos do radioamadorismo nos aproximamos de um colega que operava na cidade de Aracaju.
Fazenda Jacu da família Pereira, em Nazarezinho

Era ele frei Lauro, frade da mesma ordem de Albano e que por nossa solicitação, sem saber do que se tratava, quando nós queríamos conhecer mais um filho de Chico Pereira. O tempo se passa e frei Lauro de descendência alemã, passa a residir em Campina Grande, onde viemos a conhece-lo. Naquela oportunidade para nós rara, lhe fizemos completo relato do por que da nossa solicitação. Mas, frei Albano já havia sido transferido e não sabíamos do seu paradeiro. Durante longo período não conseguimos saber do paradeiro do frei Albano. Mais uma vez quem nos salva é frei Lauro, confirmando a presença desejada no Santuário do Canindé no Ceará. Surge que recebemos convite do amigo de caminhadas nas caatingas atrás de depoimentos do tempo de cangaço, Aderbal Nogueira, que nos estende convite para colhermos algumas imagens na Serra Grande ou Serra da Ibiapaba e assim chegamos até a gruta de Ubajara. 

Aderbal Nogueira, Paulo Gastão e José Mendes, do blog "Mendes e Mendes"

Seguimos em busca de Sete Cidades já em território piauiense e fina neblina nos roubou a grande oportunidade de filmarmos as belezas construídas pela natureza.  Seguindo viagem nos deparamos com Guaraciaba do Norte e procuramos pelo bisneto de Antônio Conselheiro, porém, não se encontrava na cidade naquele momento. Então nos dirigimos até a cidade de Ipú, fotografamos e filmamos a bela cachoeira e procuramos nos aperceber da brilhante figura de Leonardo Mota, também identificado de Leota, magistral pesquisador, memorialista e folclorista cearense. Estará chegando uma grande data, ou seja, o sesquicentenário do coronel Delmiro Gouveia o maior empreendedor do Nordeste brasileiro e como a memória do homem de hoje é pequenina por demais, não deveremos comemorar absolutamente nada. Uma vergonha para o Nordeste e para o Brasil. E chegamos ao começo da noite, a cidade de Canindé em festa, a igreja não cabia mais ninguém e teria sido momento de abraçar frei Albano. Nunca pensamos que a cidade estivesse em festa e terminamos indo dormir em Fortaleza.

Afinal Jarda viu seus filhos encaminhados na vida do bem, a enaltecer a memória do pai. Afinal o pai, o homem, o cangaceiro, o cabra macho, ganha espaço no nosso relato. Com a morte do seu genitor o que se tinha em casa era a não violência, era o perdão, o afastamento da vingança que não lavaria a lugar algum. Do outro lado, o mundo via as posições inversas, ou seja, deveria existir a vingança, que a família não poderia ser desmoralizada e assim num crescendo difícil de mudança de comportamento. Conselhos e pedidos foram feitos a Francisco Pereira, o Chico Pereira para não estabelecer a vindita. Mas, o bicho homem depois de decidir o que deseja torna-se impenetrável nas suas decisões, e assim, o filho que perdera o pai vendo que a justiça nada resolvia, tomou do mosquetão e ganhou a caatinga em busca do seu desafeto. 


Consegue trazê-lo e coloca-o na prisão. Algum tempo depois está o criminoso na rua. Chico Pereira resolve ampliar sua capacidade de luta e percorre terras vizinhas no próprio estado e viver muito além, percorrendo trilhas nos estados do Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte.

Localidades que fizeram parte do universo de Chico Pereira. Na Paraíba temos: a partir de Nazarezinho, Sousa, São Gonçalo, Lastro, Antenor Navarro, Fazenda Jacú, Cajazeiras, Condado, Malta, Sítio Pau Ferrado, Coremas, Patos, Santa Luzia, Campina Grande, Guarabira. No Rio Grande do Norte anotamos Acarí, Serra da Rajada, Currais Novos. Esta nomenclatura está estabelecida no livro Vingança, Não, página 18, da Livraria Freitas Bastos, 1960.

Porém as andanças de Chico Pereira se estenderam por um território bem mais amplo. Nas suas andanças Chico Pereira passa a conhecer nomes pouco conhecidos até hoje, como seja: Estrela do Norte, Jandaia, Serra Negra, Maçarico, Caboré, Jordão, Estrela Dalva, Corró, Moitinha, Curió, Perigo e muitos outros. Sua mãe pedia para acabar com aquelas andanças perigosas e Chico dizia que queria primeiro casar. Casamento ocorrido por procuração no dia 25 de maio de 1925 na matriz de Pombal. A noiva de 14 anos apenas de nome Jardelina Nóbrega. Depois tomaria o rumo de Goiás para onde já teriam ido Luís Padre, Sinhô Pereira e Zé Inácio do Barro. Era ele bem informado dos acontecimentos que ocorriam no atribulado mundo. Permaneceu no seu torrão natal.

Paulo Gastão em Conferência no Cariri Cangaço dentro do Parahyba Cangaço, ao lado de João de Sousa Lima e Wescley Rodrigues

Patos de Princesa, hoje Irerê, recebeu a visita de Chico Pereira sob os auspícios do coronel Marcolino Diniz, seu amigo pessoal. Fora da vila residia na casa grande, o major Floro, proprietário de terras, gado. Homem que implantou energia elétrica em fins do século XIX, mesmo antes de Triunfo.

Quanto a sua prisão a literatura oral menciona que os Presidentes (hoje governadores) dos estados da Paraíba João Suassuna e do Rio Grande do Norte Juvenal Lamartine de Faria entraram em acordo no sentido de exterminar a chaga do cangaço nos seus territórios. Juvenal esteve a frente do governo potiguar desde 01 de janeiro de 1928 até 05 de outubro de 1930. Correu mundo a seguinte afirmativa: Juvenal Lamartine caçava a cabeça de Chico Pereira em toda região nordestina desde o dia que tomou conhecimento de que um sua parenta, moça bonita e prendada, estava apaixonado por Chico Pereira e com ele queria casar. Juvenal encetou caçada até que consegui prender Chico Pereira que numa trágica viagem os policiais que o transportavam viraram o carro por cima do preso e para encobrir o crime simularam o acidente. Seu mausoléu está fincado às margens da BR-427, quilometro 177 e está a 18 km de Currais Novos do lado esquerdo de quem vem de Natal para Acarí. Na noite tenebrosa da covardia, Chico Pereira encontrou a morte.

Resumindo, Chico Pereira passou a conhecer mundos dos estados de Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte, onde praticou assaltos, crimes, sozinho ou com seu pequeno bando e foi na cidade de Acarí no estado do Rio Grande do Norte instaurado o Processo Crime contra o paraibano, amor de Jarda.

Local onde foi morto Chico Pereira, na Rodovia BR 226, sentido Currais Novos-Natal.

Vejamos a força do relato oferecido por P. Pereira Nóbrega, a pag. 126.

27 de julho de 1924. As quatro da madrugada, Sousa estava cercada. Os 84 homens formavam quatro pelotões sob a chefia de Chico Pereira, Levino, Antônio Ferreira, Chico Lopes. Três grupos algum tempo ficaram piquetando as principais entradas da cidade, para impedir qualquer socorro de fora. Chico Pereira foi bater à porta da delegacia, acordando as autoridades.

- Tenente Salgado, me desculpe. Não esperava que o senhor estivesse aqui.  Se soubesse, não teria vindo, por atenção à sua pessoa. Mas já é tarde para voltar a trás. Comunico à polícia que Sousa está cercada. Vamos abrir fogo contra Otávio Mariz. Se quiserem podem reagir. Se quiserem podem sair em paz.

O Tenente Salgado sabia que estava só. Reagir era suicídio. Às sete horas da manhã batia retirada. O resto da polícia cumpriu o que dissera às vésperas: passividade absoluta ante os cangaceiros. Eles também foram gratos. A polícia não fez mal... Arrolado num processo de mais de 800 páginas está um memorandum do juiz de direito, dirigido ao Presidente do Estado, em que depõe sobre militares:

É de lamentar que a força da polícia, composta de 10 a 12 praças, sob o comando do sargento Apolônio, não tinha se movido a menor diligência de rebate aos assaltantes, pois não disparara uma só arma, conservando-se indiferente no seu cômodo aquartelamento na cadeia, de onde observava o trânsito constante e desassombrado dos cangaceiros, ostensivamente senhores de tudo e de todos. “O Tenente Salgado” que ali viera pronto e solícito a reunir-se ao destacamento local no dia anterior à negregada tragédia, não encontrou infelizmente apoio e solidariedade daquela força para a resistência ao ataque que se pressentia, tendo declarado o sargento que os soldados não atirariam se fosse realizado o assalto à cidade pelos referidos bandidos.


Rachel de Queiroz

A história de Chico Pereira nos chega pelas mãos da querida escritora Raquel de Queirós, que no seu prefácio intitulado ÊSTE LIVRO, diz: ”Este livro, é um livro de padre, mas é também um livro duro, que conta uma história imensamente dramática. Nele não se poupa ninguém – embora não se acuse ninguém. É um depoimento que impressiona pela honestidade – e se às vezes como obra de arte que é, alça às puras alturas da beleza, nunca perde a severa imparcialidade que representa a marca principal”...

Procura Raquel concluir sua apresentação com o brilhante depoimento: “Conheci este ano a moça Jarda. A esposa-menina de Chico Pereira. Digo moça, porque realmente ainda está muito jovem, embora marcada por tantas tragédias. É uma mulher bonita, de fala mansa e gestos tranquilos. Vive para os netos que lhe deu o filho engenheiro e pelo amor dos dois outros filhos – um frade e um padre. Conversamos feito amigas de muito tempo – e, curiosamente, Jarda não me deu a impressão da viúva esmagada por um acúmulo de dramas; pareceu-me antes uma pessoa que lutou muito e acabou triunfando. E os dois filhos, ministros de Deus, são a evidente razão desse triunfo. Pois, ao encaminhá-los para o sacerdócio, ela não o fazia como uma reparação, como um sacrifício propiciatório pelos pecados do pai. Parece ao contrário que ela queria provar – e provou – que se o sangue de Chico Pereira lhe deu tais filhos – quem tinha razão era ela em o amar quando vivo e lhe venerar a memoria depois de morto. São os filhos de um guerreiro, que serviu uma causa errada sim, mas a serviu com bravura e desprendimento e, por ela morrendo, pagou todos os erros de que se culpara”.

Texto apresentado pelo pesquisador e escritor Paulo Gastão em Conferência do Cariri Cangaço em Nazarezinho, dentro do Parahyba Cangaço em junho de 2013. 

Paulo Medeiros Gastão
Sócio Fundador da SBEC
Conselheiro Cariri Cangaço 

http://cariricangaco.blogspot.com 
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CORONELISMO E CANGAÇO: ALGUNS ASPECTOS

Por Rangel Alves da Costa*



Durante a República Velha (1889-1930), o poder político tinha nos grandes latifundiários uma de suas mais importantes bases de sustentação. Os grandes proprietários, bem como pessoas de muitas posses, principalmente aquelas instaladas no Nordeste brasileiro, sustentavam, através dos currais eleitorais que mantinham, os anseios políticos das classes dominantes.

O reconhecimento dos favores políticos prestados por estes poderosos senhores não tardou a chegar. Além do prestígio político e do mando absoluto nas suas regiões, passaram a ser reconhecidos oficialmente a partir de 1831, com a criação da Guarda Nacional que, dentre  outros aspectos, possibilitou a venda de patentes às elites regionais e locais.

Logicamente que os grandes fazendeiros, latifundiários, ricos comerciantes e outros endinheirados, que já se sobressaíam com poder de mando em todos os aspectos da vida interiorana, pagaram fortunas para adquirir o maior posto militar então colocado à venda, que era a patente de coronel.

Contudo, coronel apenas de patente comprada, quase como mera simbologia, sem ação militar alguma, a não ser a oficialização do grande poder que já mantinha. Poder este sobre o homem, sobre a terra, sobre animais. O coronel, no dizer da história, era o dono do mundo ao seu redor. E também agente decisivo nas decisões políticas, nos conchavos, na manutenção do poder de uma elite política conservadora. Verdade é que o sertanejo passou a ter por coronel todo aquele que possuía o poder político local.

 

Assim, o coronelato, principalmente nordestino foi a junção de um poder quase ilimitado já existente com o poder oficializado através da compra de patente militar, no mais alto posto colocado à disponibilidade. A partir daí, o coronel passou a ser verdadeiro dono do mundo, pois tudo na vida regional e interiorana tinha de passar pelo seu crivo. Afinal, era também a voz do poder governante na região, quando ele próprio não era possuidor de mandato.

Sua influência era tamanha que mantinha jagunços e outros pistoleiros de mando sem ser incomodado pelas autoridades. Ora, ele era a autoridade maior no seu chão, no seu curral, na sua pastagem regional. Mandava matar, escravizava, subjugava, submetia, pintava e bordava e ficava por isso mesmo. Bastava um recado ou bilhete seu e a ordem tinha de ser atendida na hora. Cuspia no chão e antes de o cuspe secar já queria o resultado pretendido.

O coronelismo ainda hoje é lembrado como prática de poder e mando baseado na dominação de um poderoso senhor perante o povo a ele submetido. O prestígio do coronel era fruto de seu poder político e econômico, de sua forma de imposição arbitrária perante a sociedade e instituições, bem como na forma de conduzir o mando a ele conferido. Senhor de tudo e de todos, sua ordem só não possuía imperatividade diante de desafeto com o mesmo coronelato.

Contudo, foram as práticas próprias do coronelismo que marcaram mais profundamente o seu percurso, e ainda guardando visíveis resquícios nos dias atuais. O voto de cabresto, a fraude eleitoral, o clientelismo e o assistencialismo, os conchavos políticos, a manutenção do poder a todo custo, a dominação e o jugo de pessoas empobrecidas, além de outras manipulações e desmandos, eram práticas constantes desse sistema.

O coronel mantinha a população empobrecida como num verdadeiro curral, encabrestada ao seu carrasquento desejo. Um povo sem estudo, sem força de reação, muitas vezes tendo no poderoso seu único benfeitor, ainda que de forma degradante e submissa. Um emprego qualquer, uma cesta de alimento, um remédio, uma esmola, tudo isso era feito para que cada um ficasse devendo favor. E este era sempre cobrado no tempo certo. E ao preço da honra.

A Guarda Nacional deixou de existir em 1930, mas não significou o fim nem do coronelismo nem de suas práticas. No Nordeste brasileiro, e principalmente nas regiões mais distantes, a verve coronelista ainda perdurou com plena força e poder. E foi subsistindo de tal forma que ainda deixa seus rastros pelas vastidões interioranas. Não mais coronéis latifundiários, de imensas riquezas da terra, mas coronéis da política, da diversificação econômica, e também do clientelismo eleitoral, do voto ainda encabrestado e da desmedida barganha.

Tais coronéis tiveram importante atuação no cenário cangaceiro do Nordeste. Durante todo o seu percurso até a morte de Lampião, em 28 de julho de 1938, também foram personagens dessa saga inglória para o destemido justiceiro das caatingas. Contudo, no seu pedestal, apenas influenciava tomando partindo dos cangaceiros, colaborando para manutenção da luta, ou se bandeando para a legalidade, ou seja, colaborando com a polícia perseguidora.

Ora, esperto como era, tendo de comer pelas beiradas do poder maior, de repente não podia confrontar as ordens federais de perseguição aos bandoleiros das caatingas. Mesmo assim, muitas vezes se manteve protetor do cangaço ainda que o governo achasse que era colaborador das forças policiais. Fez o jogo duplo sem ser dúplice no seu intento, pois proferia mentir ao governo a trair a confiança do líder maior do cangaço.

E o grande Capitão soube muito bem caminhar por essa vereda espinhosa. Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, o maior líder cangaceiro que já pisou no chão sertanejo, teve na inteligência e na astúcia algumas de suas características mais marcantes. E tais aspectos o levaram a providencialmente tecer uma verdadeira rede de apoiadores e colaboradores à sua causa. E dentre os patrocinadores dos rebeldes estavam grandes e renomados coronéis nordestinos.

Mas tudo numa troca de favores. O bando cangaceiro protegia o coronel da sanha inimiga de outro poderoso da região, se comprometia a não atacar - e também defender - aqueles protegidos pelo senhor, e em troca recebia preciosidades para a continuidade da luta. Dinheiro, mantimentos, armas de diversos tipos e calibres, vasta munição, dentre outros objetos, tudo isso era disponibilizado pelo coronel ao bando.

Não é raro se ouvir falar que alguns momentos de trégua do cangaço foram patrocinados por coronéis. O poderoso mexia os pauzinhos e afastava a volante por uns tempos do encalço cangaceirista. Do mesmo modo, mantinha uma extensa rede de informantes para não deixar que os cangaceiros fossem surpreendidos por uma emboscada. E também mandava dar fim a quem estivesse conspirando em desfavor do bando protegido.

 

O coiteiro era o mensageiro entre o coronel e o bando cangaceiro. Lampião chamava um cabra de confiança e fazia chegar, através de bilhete, carta ou recado, aquilo que desejava ver atendido pelo poderoso amigo. Mas nem sempre pedindo armas, munições ou outros objetos, mas também como troca de impressões, fazendo reclamações ou mesmo numa escrita amigueira. Os assuntos mais sérios eram repassados verbalmente pelo coiteiro. Os segredos não podiam cair em mãos indesejadas. E se conhece histórias de coiteiros que preferiram morrer a revelar os segredos a ele confiados.

Lampião era recebido e sentava à mesa desses poderosos. Se o outro era coronel, ele também carregava a patente de capitão, e esta devidamente providenciada e abençoada pelo santo político de Juazeiro, o Padre Cícero. O medo, verdadeiro temor, fazia com que o poderoso recebesse o líder cangaceiro com o maior zelo do mundo, colocando sempre à disposição o que este precisasse. Por seu lado, sabendo da importância e necessidade daquele pacto, Lampião sempre se mostrava à disposição, às ordens do coronel.

E assim os pactos cangaceiristas, as estratégias de manutenção do poder cangaceiro e coronelista e também as desconfianças de lado a lado, saíam dos antigos casarões e adentravam nas selvas nordestinas, fruto de mundos tão diferentes e tão próximos na realidade  de então. O coronelato oficial acabou em 1930 e o cangaço oito anos depois, em 38. Mas coronéis continuaram existindo, enquanto que a morte de Lampião enterrava de vez a maior das sagas nordestinas.

Poeta e cronista
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