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segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Nazarezinho Parte II

Por Paulo Gastão

Paulo Gastão e Juliana Ischiara

Em determinado momento as famílias de Sigismundo e Pereira se cruzam quando seus filhos Raimundo e Vanice se casam e vão residir em Brasília nos seus primeiros anos de existência, já tendo se tornado a jovem Capital Federal. Não sabemos as causas durante passadas festas do Natal, Raimundo desapareceu e até hoje nenhuma notícia do seu paradeiro. Chico foi para Roma, tornou-se escritor, professor e jornalista. Consegue no final da vida transformar sua grande obra em peça de teatro. E assim Vingança, Não teve inicio a sua grandiosa caminhada. Pelos caminhos do radioamadorismo nos aproximamos de um colega que operava na cidade de Aracaju.
Fazenda Jacu da família Pereira, em Nazarezinho

Era ele frei Lauro, frade da mesma ordem de Albano e que por nossa solicitação, sem saber do que se tratava, quando nós queríamos conhecer mais um filho de Chico Pereira. O tempo se passa e frei Lauro de descendência alemã, passa a residir em Campina Grande, onde viemos a conhece-lo. Naquela oportunidade para nós rara, lhe fizemos completo relato do por que da nossa solicitação. Mas, frei Albano já havia sido transferido e não sabíamos do seu paradeiro. Durante longo período não conseguimos saber do paradeiro do frei Albano. Mais uma vez quem nos salva é frei Lauro, confirmando a presença desejada no Santuário do Canindé no Ceará. Surge que recebemos convite do amigo de caminhadas nas caatingas atrás de depoimentos do tempo de cangaço, Aderbal Nogueira, que nos estende convite para colhermos algumas imagens na Serra Grande ou Serra da Ibiapaba e assim chegamos até a gruta de Ubajara. 

Aderbal Nogueira, Paulo Gastão e José Mendes, do blog "Mendes e Mendes"

Seguimos em busca de Sete Cidades já em território piauiense e fina neblina nos roubou a grande oportunidade de filmarmos as belezas construídas pela natureza.  Seguindo viagem nos deparamos com Guaraciaba do Norte e procuramos pelo bisneto de Antônio Conselheiro, porém, não se encontrava na cidade naquele momento. Então nos dirigimos até a cidade de Ipú, fotografamos e filmamos a bela cachoeira e procuramos nos aperceber da brilhante figura de Leonardo Mota, também identificado de Leota, magistral pesquisador, memorialista e folclorista cearense. Estará chegando uma grande data, ou seja, o sesquicentenário do coronel Delmiro Gouveia o maior empreendedor do Nordeste brasileiro e como a memória do homem de hoje é pequenina por demais, não deveremos comemorar absolutamente nada. Uma vergonha para o Nordeste e para o Brasil. E chegamos ao começo da noite, a cidade de Canindé em festa, a igreja não cabia mais ninguém e teria sido momento de abraçar frei Albano. Nunca pensamos que a cidade estivesse em festa e terminamos indo dormir em Fortaleza.

Afinal Jarda viu seus filhos encaminhados na vida do bem, a enaltecer a memória do pai. Afinal o pai, o homem, o cangaceiro, o cabra macho, ganha espaço no nosso relato. Com a morte do seu genitor o que se tinha em casa era a não violência, era o perdão, o afastamento da vingança que não lavaria a lugar algum. Do outro lado, o mundo via as posições inversas, ou seja, deveria existir a vingança, que a família não poderia ser desmoralizada e assim num crescendo difícil de mudança de comportamento. Conselhos e pedidos foram feitos a Francisco Pereira, o Chico Pereira para não estabelecer a vindita. Mas, o bicho homem depois de decidir o que deseja torna-se impenetrável nas suas decisões, e assim, o filho que perdera o pai vendo que a justiça nada resolvia, tomou do mosquetão e ganhou a caatinga em busca do seu desafeto. 


Consegue trazê-lo e coloca-o na prisão. Algum tempo depois está o criminoso na rua. Chico Pereira resolve ampliar sua capacidade de luta e percorre terras vizinhas no próprio estado e viver muito além, percorrendo trilhas nos estados do Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte.

Localidades que fizeram parte do universo de Chico Pereira. Na Paraíba temos: a partir de Nazarezinho, Sousa, São Gonçalo, Lastro, Antenor Navarro, Fazenda Jacú, Cajazeiras, Condado, Malta, Sítio Pau Ferrado, Coremas, Patos, Santa Luzia, Campina Grande, Guarabira. No Rio Grande do Norte anotamos Acarí, Serra da Rajada, Currais Novos. Esta nomenclatura está estabelecida no livro Vingança, Não, página 18, da Livraria Freitas Bastos, 1960.

Porém as andanças de Chico Pereira se estenderam por um território bem mais amplo. Nas suas andanças Chico Pereira passa a conhecer nomes pouco conhecidos até hoje, como seja: Estrela do Norte, Jandaia, Serra Negra, Maçarico, Caboré, Jordão, Estrela Dalva, Corró, Moitinha, Curió, Perigo e muitos outros. Sua mãe pedia para acabar com aquelas andanças perigosas e Chico dizia que queria primeiro casar. Casamento ocorrido por procuração no dia 25 de maio de 1925 na matriz de Pombal. A noiva de 14 anos apenas de nome Jardelina Nóbrega. Depois tomaria o rumo de Goiás para onde já teriam ido Luís Padre, Sinhô Pereira e Zé Inácio do Barro. Era ele bem informado dos acontecimentos que ocorriam no atribulado mundo. Permaneceu no seu torrão natal.

Paulo Gastão em Conferência no Cariri Cangaço dentro do Parahyba Cangaço, ao lado de João de Sousa Lima e Wescley Rodrigues

Patos de Princesa, hoje Irerê, recebeu a visita de Chico Pereira sob os auspícios do coronel Marcolino Diniz, seu amigo pessoal. Fora da vila residia na casa grande, o major Floro, proprietário de terras, gado. Homem que implantou energia elétrica em fins do século XIX, mesmo antes de Triunfo.

Quanto a sua prisão a literatura oral menciona que os Presidentes (hoje governadores) dos estados da Paraíba João Suassuna e do Rio Grande do Norte Juvenal Lamartine de Faria entraram em acordo no sentido de exterminar a chaga do cangaço nos seus territórios. Juvenal esteve a frente do governo potiguar desde 01 de janeiro de 1928 até 05 de outubro de 1930. Correu mundo a seguinte afirmativa: Juvenal Lamartine caçava a cabeça de Chico Pereira em toda região nordestina desde o dia que tomou conhecimento de que um sua parenta, moça bonita e prendada, estava apaixonado por Chico Pereira e com ele queria casar. Juvenal encetou caçada até que consegui prender Chico Pereira que numa trágica viagem os policiais que o transportavam viraram o carro por cima do preso e para encobrir o crime simularam o acidente. Seu mausoléu está fincado às margens da BR-427, quilometro 177 e está a 18 km de Currais Novos do lado esquerdo de quem vem de Natal para Acarí. Na noite tenebrosa da covardia, Chico Pereira encontrou a morte.

Resumindo, Chico Pereira passou a conhecer mundos dos estados de Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Norte, onde praticou assaltos, crimes, sozinho ou com seu pequeno bando e foi na cidade de Acarí no estado do Rio Grande do Norte instaurado o Processo Crime contra o paraibano, amor de Jarda.

Local onde foi morto Chico Pereira, na Rodovia BR 226, sentido Currais Novos-Natal.

Vejamos a força do relato oferecido por P. Pereira Nóbrega, a pag. 126.

27 de julho de 1924. As quatro da madrugada, Sousa estava cercada. Os 84 homens formavam quatro pelotões sob a chefia de Chico Pereira, Levino, Antônio Ferreira, Chico Lopes. Três grupos algum tempo ficaram piquetando as principais entradas da cidade, para impedir qualquer socorro de fora. Chico Pereira foi bater à porta da delegacia, acordando as autoridades.

- Tenente Salgado, me desculpe. Não esperava que o senhor estivesse aqui.  Se soubesse, não teria vindo, por atenção à sua pessoa. Mas já é tarde para voltar a trás. Comunico à polícia que Sousa está cercada. Vamos abrir fogo contra Otávio Mariz. Se quiserem podem reagir. Se quiserem podem sair em paz.

O Tenente Salgado sabia que estava só. Reagir era suicídio. Às sete horas da manhã batia retirada. O resto da polícia cumpriu o que dissera às vésperas: passividade absoluta ante os cangaceiros. Eles também foram gratos. A polícia não fez mal... Arrolado num processo de mais de 800 páginas está um memorandum do juiz de direito, dirigido ao Presidente do Estado, em que depõe sobre militares:

É de lamentar que a força da polícia, composta de 10 a 12 praças, sob o comando do sargento Apolônio, não tinha se movido a menor diligência de rebate aos assaltantes, pois não disparara uma só arma, conservando-se indiferente no seu cômodo aquartelamento na cadeia, de onde observava o trânsito constante e desassombrado dos cangaceiros, ostensivamente senhores de tudo e de todos. “O Tenente Salgado” que ali viera pronto e solícito a reunir-se ao destacamento local no dia anterior à negregada tragédia, não encontrou infelizmente apoio e solidariedade daquela força para a resistência ao ataque que se pressentia, tendo declarado o sargento que os soldados não atirariam se fosse realizado o assalto à cidade pelos referidos bandidos.


Rachel de Queiroz

A história de Chico Pereira nos chega pelas mãos da querida escritora Raquel de Queirós, que no seu prefácio intitulado ÊSTE LIVRO, diz: ”Este livro, é um livro de padre, mas é também um livro duro, que conta uma história imensamente dramática. Nele não se poupa ninguém – embora não se acuse ninguém. É um depoimento que impressiona pela honestidade – e se às vezes como obra de arte que é, alça às puras alturas da beleza, nunca perde a severa imparcialidade que representa a marca principal”...

Procura Raquel concluir sua apresentação com o brilhante depoimento: “Conheci este ano a moça Jarda. A esposa-menina de Chico Pereira. Digo moça, porque realmente ainda está muito jovem, embora marcada por tantas tragédias. É uma mulher bonita, de fala mansa e gestos tranquilos. Vive para os netos que lhe deu o filho engenheiro e pelo amor dos dois outros filhos – um frade e um padre. Conversamos feito amigas de muito tempo – e, curiosamente, Jarda não me deu a impressão da viúva esmagada por um acúmulo de dramas; pareceu-me antes uma pessoa que lutou muito e acabou triunfando. E os dois filhos, ministros de Deus, são a evidente razão desse triunfo. Pois, ao encaminhá-los para o sacerdócio, ela não o fazia como uma reparação, como um sacrifício propiciatório pelos pecados do pai. Parece ao contrário que ela queria provar – e provou – que se o sangue de Chico Pereira lhe deu tais filhos – quem tinha razão era ela em o amar quando vivo e lhe venerar a memoria depois de morto. São os filhos de um guerreiro, que serviu uma causa errada sim, mas a serviu com bravura e desprendimento e, por ela morrendo, pagou todos os erros de que se culpara”.

Texto apresentado pelo pesquisador e escritor Paulo Gastão em Conferência do Cariri Cangaço em Nazarezinho, dentro do Parahyba Cangaço em junho de 2013. 

Paulo Medeiros Gastão
Sócio Fundador da SBEC
Conselheiro Cariri Cangaço 

http://cariricangaco.blogspot.com 
http://blgodomendesemendes.blogspot.com

Um comentário:

  1. Anônimo15:50:00

    Caro Mendes e Professor Paulo Medeiros Gastão, é importante conhecer a história de Chico Pereira - um dos nossos nordestinos injustiçados. E mais importante é quando conhecemos a força de uma mulher -, sua esposa JARDA que não se deixou abater pelas vicissitudes que o "destino" traça para os mortais. Conseguiu formar dois filhos padres e um engenheiro. São as surpresas da vida.
    Parabéns Mendes. Parabéns Professor Medeiros.
    Antonio José de Oliveira - Povoado Bela Vista - Serrinha - Bahia.

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