Por Honório de
Medeiros
Em narrativa
linear, atenta à lógica dos fatos históricos, Sérgio Augusto de Souza Dantas
nos reapresenta a um Antônio Silvino cru, recortado do contexto mítico e
inserido em sua dimensão humana, sem que restasse perdido tudo quanto o tornou
um dos mais interessantes personagens da trindade básica que forjou a alma
sertaneja – o cangaço, o misticismo, o coronelismo.
Louve-se a
felicidade na escolha do “nome” de cada capítulo bem como o excerto que o
acompanha, próprio para chamar a atenção do comprador desatento, em uma
homenagem ao estilo jornalístico de outrora, e a indicar um texto enxuto, leve,
de parágrafos curtos e bem encadeados. Chamam a atenção episódios trazidos a
lume que por si só têm dimensão histórica, como a convivência entre Antônio
Silvino e Gregório Bezerra, lendário líder comunista pernambucano, sua
entrevista com Graciliano Ramos, e o assalto à Usina Santa Filonila na qual
morreu Feliciana na flor da idade – crime do qual o cangaceiro jamais deixou de
se arrepender. Aliás, qual teria sido o desfecho do embate entre Antônio dos
Santos Dias e José Tavares de Melo, este, genro, aquele, pai de Teresa Tavares
de Melo, pivô da questão? Qual teria sido o fim de cada um deles?
O Antônio
Silvino que emerge do ótimo texto de Sérgio Dantas é um personagem emblemático:
é o retrato nítido de uma saga que nos permite identificar e compreender os
nexos causais que originam certa circunstância histórica – o período do cangaço
– e até mesmo ir além, na medida em que também permite identificar o viés comum
a entrelaçá-los, ou seja, a questão do Poder. Basta colocar esses retratos
sobre a mesa e examiná-los com olhar crítico: Antônio Silvino, Sinhô Pereira,
Lampião; Coronel Zé Pereira, Coronel Isaías Arruda, Coronel Floro Bartolomeu;
Pe. Cícero, Beato Zé Lourenço, Antônio Conselheiro... Tomando distância de
qualquer tentativa de apreender o fenômeno a partir de uma explicação oriunda
exclusivamente de fatos alusivos à posse da terra.
É possível
conjecturar se Sérgio Dantas vai aventurar-se em novos resgates ou cuidará de
desbravar outras fronteiras. Sua obra tem sido, até agora, a fronteira entre um
ciclo e outro no que diz respeito à literatura do cangaço. Esse ciclo por ele
estudado até o momento está chegando ao fim. Já não é mais possível, até onde
sabemos, ressalvada a possibilidade de documentos desconhecidos surgirem
inesperadamente, prosseguir com a literatura elaborada a partir de relatos,
fotos, testemunhos ou escritos, ou seja, fontes primárias. São poucos os
sobreviventes e deles já se extraiu mais do que tudo. Os papéis estão virando
pó, vítimas da ação inclemente do tempo e da incúria das nossas elites. Um
outro ciclo está surgindo: a interpretação de todos esses dados, ou seja, uma
literatura de tese, algo timidamente iniciado por Frederico Pernambucano de
Mello com “Guerreiros do Sol”, através da criação do conceito de “escudo
ético”.
A não ser que
– e talento não lhe falta – resolva mergulhar com sua característica obstinação
no jornalismo literário brindando-nos com alguma pesquisa onde sobrem indícios,
mas, faltem provas – como de fato acontece nessa espécie literária - e, no
entanto, seja possível povoar um texto com interrogações perturbadoras tais
quais, por exemplo, as razões do estranho silêncio do Juiz e do Promotor de
Mossoró em relação aos fatos que lá aconteceram em junho de 1927.
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