Por Rostand Medeiros
Rostand Medeiros – IHGRN
Durante a Segunda Guerra Mundial, até onde eu sei, nenhum dos filhos do Rio Grande do Norte que atravessaram o Atlântico para combater em terras italianas foi piloto de combate do 1º Grupo de Aviação de Caça, o famoso “Senta a Pua”.
Mas na houve um ser vivo, oriundo das plagas potiguares, que foi membro da 15ª Air Force da USAAF – United States Army Air Force e chegou a ter 50 horas de combate em céus europeus.
Tal como o “Senta a Pua”, coincidentemente este potiguar combateu nos céus da Itália. Mas a sua base ficava na cidade de Bari, na região da Puglia, sul daquele belo país. Já a sua unidade aérea de combate era designada como 154Th Weather Recon Squadron, sendo este o único esquadrão de reconhecimento da 15ª Air Force que utilizava o poderoso caça bimotor Lockheed P-38 Lightning.
Este potiguar era muito querido pelos seus companheiros estadunidenses, saiu da Cidade do Sol através de Parnamirim Field e já foi entrando na cabine de um P-38 e ganhando os céus italianos.
Até porque de céu este conterrâneo nosso entendia bastante, pois ele era um simpático papagaio.
É sério!
Esta é a incrível história de “Jock”, um papagaio potiguar comprado por um dos milhares de aviadores militares americanos que passaram pelo Rio Grande do Norte durante a Segunda Guerra Mundial e que, por obra do destino, participou de missões de combate e ainda foi notícia em vários jornais americanos.
Para que os “doutores” em história da aviação potiguar não digam que o que eu escrevo é mentira, vejam a reprodução da matéria do jornal carioca “A Noite”, edição de quarta-feira, 19 de janeiro de 1944.
Não vou nem reproduzir o que está descrito na reportagem, ela fala por si.
Acredito que pelos dados que encontramos na matéria, informando que o louro tinha um tamanho de 10 polegadas (26 cm), hábito de repetir palavras e bico forte que quebrava lápis, deveria ser da espécie Papagaio Verdadeiro (Amazona aestiva), que é um bicho bem sociável.
Os mais velhos me narraram que este pássaro era fácil de encontrar no Rio Grande do Norte, principalmente no agreste. Mas isso em uma época quando a nossa natureza era muito mais preservada e não existia nem o IBAMA e o ICMBIO para controlar a venda de nossos emplumados psitacídeos aos aviadores gringos.
Mas será que “Jock” era mesmo potiguar?
Bem, como não existe registro de nascimento lavrado em cartório e nem carteira de identidade para papagaio, vale o lugar onde ele foi comprado.
Procurei saber mais sobre os P-38 Lightning”da 15º Air Force e descobri que eles eram subordinados ao 305th Fighter Wing, com base em Salsola, Italia. A esta grande unidade estavam subordinados três grupos de caças P-38, com três esquadrões cada. Já o 154Th Weather Recon Squadron, pela espinhosa função de reconhecimento, era como uma unidade a parte no organograma da 15ª Air Force.
Bom, fiz uma pesquisa rápida na internet sobre algum piloto chamado Clark, dono de um louro brasileiro, servindo na Itália, etc. Descobri que a notícia publicada no jornal carioca foi também reproduzida em vários jornais americanos. Pesquei a primeira página do jornal “Charlotte News”, de Charlotte, North Caroline e outro de um jornal nova-iorquino, onde a notícia é bem mais detalhada.
Soube que o dono do psitacídeo potiguar era o piloto Donald L. Clark, de 28 anos, natural de Oakland, Califórnia. Daí encontrei a foto do pessoal do 154Th Weather Recon Squadron e o Senhor. D. L. Clark está lá na segunda fila, mas nada do penoso.
Já em relação à história transmitida ao repórter Hal Boyle, da Associated Press, pelo piloto Clark, eu posso entender que “Jock” dormisse durante muitos dos voos, pois eram missões de reconhecimento, onde o melhor é o piloto não chamar atenção e fazer suas fotos bem quietinho, que depois seriam enviadas para o alto comando da 15ª Air Force. Mas esta história que o penoso louro da terra “Papa Jerimum” dormia em missões de bombardeamento e não acordava nem com “artilharia antiaérea”, aí tenho minhas dúvidas.
Pode ser que as alterações de pressão e de temperatura devem ter ajudado o bicho a esticar as pernas e tirar um ronco após cada decolagem, mas só um biólogo, ou um ornitólogo, para definir se esta história tem fundamento.
E o danado do “Jock” fez bonito no meio da gringalhada, pois aprendeu, além do português materno, mais quatro idiomas, até mesmo o árabe. Pena que só servia para repetir palavrões.
Agora os pilotos americanos erraram quando inventaram de dar brandy misturado com água ao danado do emplumado potiguar e ele não quis mais beber em uma colher. Tivesse sido cachaça ele beberia até em cálice de igreja. Afinal, quem já ouviu falar em um norte-rio-grandense bebendo brandy?
Apesar de saber que papagaios em geral vivem muito, acredito que no ritmo meio amalucado que o piloto Clark descreve como era a vida deste emplumado norte-rio-grandense e ainda mais com os pilotos baforando fumaça na cara do infeliz, ele não deve ter durado muito.
É uma pena não ter encontrado nada mais sobre este valoroso combatente potiguar que cumpriu tantas missões nos céus da Europa.
Com a história pitoresca de “Jock”, agora posso orgulhosamente afirmar que o Rio Grande do Norte teve um representante em uma cabine de pilotagem durante a Segunda Guerra Mundial.
Para aqueles que vivem nesta terra banhada de sol e admiram com enorme respeito à participação dos nossos conterrâneos no maior conflito da história mundial, podem agora se ufanar de ter um potiguar nesta listagem tão nobre e distinta.
Afinal, é melhor se orgulhar de “Jock” do que da maioria dos políticos desta minha bela terra.
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