Por: Rangel Alves
da Costa(*)
Nos estudos e
publicações sobre o cangaço, tornou-se comum encontrar alguns aspectos gerais
acerca dos fatores que possibilitaram o seu surgimento. E tais fatores não
mudam muito desde os seus primórdios ao advento do bando cangaceiro mais famoso
entre todos, que foi aquele comandado pelo Capitão Virgulino Ferreira da Silva,
o Lampião, que reinou a partir da década de 20 até o ano de 38.
Tais fatores
são muitos e variam segundo a linha de raciocínio dos autores, mas sempre
voltados para alguns referenciais: opressão, injustiça e pobreza. Mas eis a
diversidade de outros fatores geralmente apontados como motivadores do cangaço:
a formação de bandos armados pelos grandes latifundiários para defesa contra os
inimigos e garantir suas posses; o surgimento de pequenos grupos insurgentes
contra os desmandos cometidos pelos coronéis; as péssimas condições sociais da
região nordestina; o latifúndio concentrando a terra e a renda nas mãos de um
pequeno número de proprietários, deixando na miserabilidade a maioria da população.
Mas as causas
apontadas ainda são muitas: o cangaço surgiu como uma forma de defesa dos
sertanejos diante da ineficiência do governo em manter a ordem e aplicar a lei;
as suas origens estão nas questões sociais e fundiárias então prevalecentes na
região nordestina; seu nascedouro está nas violentas disputas entre famílias
poderosas e a falta de perspectivas de ascensão social num sertão assolado pela
miséria e pelas injustiças.
E mais: o
cangaço surgiu como uma reação à miséria social e ao desemprego que assolavam
as populações sertanejas ladeadas por ricos latifundiários e entregues ao mando
e poder dos coronéis; o monopólio da terra e o trabalho servil, heranças das
capitanias hereditárias, sempre mantiveram os pobres sertanejos submissos ao
poder dos poderosos da região nordestina, fazendo surgir alguns grupos de
revolta contra a insuportabilidade da situação; o cangaço surgiu como uma
reação à fragilidade das instituições responsáveis pela ordem, lei e justiça, e
da ocorrência de contínuas injustiças; uma forma de defesa contra as tiranias
praticadas, tendo o sertanejo que fazer justiça com as próprias mãos e causando
ainda mais violência.
Quer dizer, de
uma forma ou de outra sempre batem na mesma tecla, caminham no mesmo sentido,
que é o de apontar as causas do surgimento do cangaço com base na opressão, na
injustiça e na pobreza. E numa alarmante continuidade. Com efeito, lá pelos
idos do século XIX, período de gestação do cangaço, a situação do sertanejo era
de insuportabilidade diante daquilo que contextualizava seu cotidiano. Desde a
vivência à sua expressão social enquanto ser humano. E sempre desamparado de
tudo.
O
analfabetismo reinando na maioria da população, as imensas e desconcertantes
desigualdades sociais, o perpétuo estado de submissão àqueles senhores donos
dos meios de produção e de sobrevivência, um festim dilacerado de violências e
a total falta de expectativas de sair dessa desumana situação. Eis a feição
sertaneja naqueles idos onde o cangaço ainda estava apenas semeado. Contudo,
era a pobreza ossuda, a miséria mais abjeta, que mais marcava aquela sociedade
matuta. E onde a pobreza alarmante impera logo chega quem procure escravizar o
homem, colocando-o sob o seu jugo e mando.
A pobreza em
si já era uma forma de submissão social, de menosprezo ao homem forte e
trabalhador, como pontua o reconhecimento euclidiano. Contudo, a miserabilidade
nunca foi motivo desesperador àquele indivíduo tão acostumado às durezas da
vida, às estiagens prolongadas, ao padecimento por falta do fruto da terra. Tal
situação, ainda que perversa e inumana, não seria motivo demasiadamente
desesperador, pois já reconhecida como fazendo parte daquele modo de vida.
Entretanto, se
a pobreza não afligia de morte nem retirava do desvalido sertanejo as suas
últimas forças, o mesmo não acontecia perante a realidade humana que
enfrentava. Ora, de fervorosa religiosidade, o sertanejo suportava as
inclemências naturais e as tantas necessidades sempre apegado na fé por dias
melhores. Daí suportar o sofrimento. Mas tudo mudava quando as situações cada
vez mais difíceis eram causadas por outros seres humanos, por uma classe
poderosa e atroz.
E tal classe
portentosa e cruel só podia ser avistada no grande latifundiário, no senhor
dono do mundo, no velho coronel ainda encastelado no feudalismo, na feição mais
nefasta do oligarca. Este si sim, este se constituía numa verdadeira afronta ao
sertanejo. Não pela riqueza em si, não pelo poder e mando chamados a si a todo
custo, mas pela ação autoritária, arbitrária, arrogante, injusta, escravocrata,
criminosa e bárbara com que tratava o homem simples, pobre, vitimado pelo
próprio meio.
Continua...
(*) Meu nome é
Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no
município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito
na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também
História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou
autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e
"Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas
Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em
"Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros
contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e
"Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada
sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão -
Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do
Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor:
Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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http://jmpminhasimpleshistorias.blogspot.com
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