*Rangel Alves da Costa
Sem o sol ainda é possível viver, mas sem a lua não, já disse o velho pensador. Já o sábio explanou em poucas palavras: sem a lua não haveria inspiração, e sem a inspiração apenas o homem na sua insensibilidade. O poeta faz da lua seu caderno e sua escrita.
Mas de repente a lua some. A lua daqui ou do Japão simplesmente desaparece, de Poço Redondo ou do Tibete. Não houve eclipse, não houve nenhum fenômeno que servisse de explicação. Os olhos ávidos se lançam aos céus, as pessoas catam suas fagulhas como se necessitassem de qualquer luz.
O menino chorou por que não pôde sair pra brincar. Estava tudo escuro demais. O noctívago entristeceu por que não sabe vagar sem ser debaixo da luz do luar. As janelas e as portas ficaram fechadas. Não havia cadeiras nas calçadas nem enamorados passeando de braços dados. A lua é tudo.
A lua é tudo mesmo. Lua dos amantes, lua dos solitários, lua dos loucos, lua dos lobos, lua dos apaixonados, lua dos poetas. Quando desce depois que o sol se foi, sua luz parece transmudar toda a feição do mundo. Não mais o calor do dia, mas a serenidade pulsante da noite.
Ora, se o mar fica tão entristecido quando numa noite apenas o farol não é aceso para iluminar suas vagas, que se imagine o mundo inteiro sem lua. Se os habitantes das matas ficam tão lamentosos quando os vaga-lumes deixam de piscar em determinados instantes, que se imagine a total ausência da luz do luar.
Os lobos só comprazem uivar nas montanhas se acima de sua solidão houver testemunho da lua. Os labirintos perdem a graça do medo na completa escuridão. Os humanos não podem se transformar em lobisomens sem a energia mutante daquela única claridade. Não tem qualquer sentido os espaços tomados apenas pelo negrume, pelo breu, pela escuridão.
Não tem graça a noite de lua nova. Nesta fase da lua, quase nada dela se avista, apenas com uma mínima porção visível. Entristecimento também quando ela se faz minguante e vai perdendo sua cor, sendo tomada de escuridão. Um céu sem a chama que tanto atrai e absorve.
Igualmente entristecedor quando a noite é de apenas de nuvens escurecidas no céu e a lua não encontra qualquer espaço para brilhar. Nos escondidos, apenas o desejo de sua luz. Nas noites chuvas então surge uma melancolia terrível. Além das saudades e nostalgias, a pergunta que sempre surge: cadê a lua?
Cadê a lua? Que situação mais terrível uma noite sem luar, um noturno sem a poesia daquele brilho, janelas sem mocinhas sonhadoras mirando o alto, frestas sem clarões, loucos sem ter por quem se apaixonar, horizontes sem aquela luminosidade de espírito e alma.
Cadê a lua? Eu quero a lua, diz o louco em cima da pedra, querendo voar, querendo ir buscar o seu brilho. Cadê a lua? Preciso do semblante iluminado do meu príncipe encantado, diz a mocinha entristecida pelo negrume. Nada o olhar avista além do que está adiante. Falta-lhe o norte enluarado.
Mas se a lua sumiu, então como acender a lua? Não será necessário fazer escada bem alta, de uma altura tão grande que alcance os espaços mais distantes. Não será necessário pedir auxílio ao faroleiro nem ao vivente do alto da montanha. Não será necessário enviar um foguete com palito de fósforo aceso na ponta. Não será preciso nada disso.
Basta perguntar ao cego como acender a lua. O cego sabe. E talvez somente o cego saiba como trazer luz, ânimo e vida, ao que de repente se apagou. E o cego sabe como acender a lua por que ele, vivendo na escuridão, acende a sua luz a todo distante que desejar.
A noite do cego é terrível, pois duradoura demais para um ser vivente. Não há luz elétrica, lanterna, lua, vaga-lume, candeeiro, nada que esteja ao seu alcance quando deseje sair dessa terrível noite. Mas encontra luz de maior claridade que muitas pessoas de olhos bem vivos.
Acende sua lua toda vez que faz de sua cegueira a luz que deseja ter. Ao imaginar que há outra cor além daquela escuridão no olhar, então avista luas, arco-íris, sóis, estrelas, belíssimas paisagens. Por isso que será preciso perguntar ao cego como acender a luz.
E o cego dirá: Estou vendo a lua. Encontre você mesmo a claridade que tanto deseja.
Escritor
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