Por Rangel Alves da Costa
Era uma vez um lugar chamado Sergipe...
Contudo, não se imagine que o referido lugar possui qualquer relação com o estado nordestino chamado Sergipe. O qual, aliás, deveria se chamar Serigy.
Dizem até que por querer ser um carro tão simples, por sempre querer “ser jipe”, acomodou-se nas estradas esburacadas e jamais conseguiu seguir adiante.
Mas voltando ao outro Sergipe, este realmente existiu e ainda existe. Os livros não deixam mentir. A geografia também. Mas fato é que dizem que está apenas em algum lugar.
Este lugar chamado Sergipe possui seu nome oriundo da língua tupi, com escrita original sendo si'riu pe, que significa rio dos siris. Ou ainda siri’y pe, igualmente significando rio dos siris. Mas qual o rio dos siris: Rio Sergipe.
Mas há quem tem afirme que o nome tupi é "siri ü pe". Mas tudo dá em rio dos siris. Como visto, então, sempre o crustáceo, sempre o pequeno caranguejo envolvendo o nome do lugar. E assim por que nas proximidades de um rio com muitos siris.
Muita coincidência com o estado chamado Sergipe, alguém poderia dizer. Pois este tem sua denominação também oriunda do tal rio dos siris, do rio tomado de crustáceos que serviam como alimento ao nativo governado por um bravo líder chamado Serigy.
Serigy, o cacique, aliás, também foi o governante maior daquele outro Sergipe. Aquela outra povoação localizada na afluência de rios, perto das águas grandes, entremeado de vales, ribeiras e montanhas.
O Sergipe de lá, ou outro Sergipe, um dia foi descoberto por navegadores brancos e daí em diante teve a paz nativa terminada. Rico em pau-brasil, em especiarias da terra fértil, ainda que de plena aridez em muitos lugares, foi usado e abusado, passado de mão em mão, de governante a governante, até se transformar num lugar qualquer.
Talvez diferente do outro Sergipe, o estado da federação que, mesmo em humilde evolução, teve seu desenvolvimento ajudado pelas riquezas da terra, pelas belezas naturais, pelas muitas águas ao seu redor, pela riqueza negra jorrando da terra, e pela pujança de seu povo trabalhador.
Tal sorte não teve o outro Sergipe, aquele sempre governado pelo clã Serigy em sua vasta linhagem: Serigy o patriarca cacique, Serigy pajé dos deuses, Serigy da promissão, Serigy imbatível, Serigy do povo, e assim por diante. Ainda hoje um Serigy comanda os destinos daquele Sergipe.
Fato dos mais estranhos é que a linhagem dos Serigys não é de cunho consanguíneo ou familiar, mas por um fator chamado política, que automaticamente vincula ao clã aquele que alcança o poder. E é por isso mesmo que se vira mundo, se gasta rios e mais rios de dinheiro, para a ascensão ao Serigysmo.
Uma vez em ascensão, então chega ao poder pela voz da humilde e da mansidão, mas logo se transforma na espada da ira e do terror. Coisa estranha demais, mas pouco governante das terras do Serigy já se recordou que um dia também foi povo, gente, parte da população. Sempre parece nascido rei, poderoso, de brasão e espada.
Mesmo estando em algum lugar, de possível localização geográfica, o Sergipe dos Serigys não é conhecido pela maioria da população de outras localidades. E aqueles que o conhecem, geralmente pouco sabem das entranhas de sua realidade. Sequer imaginam o que se passa quando descamba o entardecer e a noite chama os seus dramas.
Quem está de fora, ao longe, sempre diz das belezas do Sergipe dos Serigys. Para muitos, não há lugar mais belo, mais encantador, mais adorável pra se viver. Segurança absoluta, paz reinando em todos os quadrantes, prosperidade em cada canto e recanto, o melhor lugar do mundo. Ora, estão distantes e dizem o que quiserem.
Alguém bem lembrou que as estradas desse Sergipe dos Serigys são tão boas que o viajante mais parece num tapete voador. Planando nas nuvens, no aconchego das asas de passarinho, nunca há do que reclamar. Depois de dizer isso, foi reconhecido como assessor do governante e jogado nas estradas mais intransitáveis do mundo.
O próprio Serigy governante reconhece a utopia em todo maravilhamento que se faça sobre seu reino. Lógico que não reconhece em palavras, pois vende seu reino pelo perfume e não pelo odor. Contudo, sabe muito bem que no seu jardim há mais espinhos que flores, que no seu milharal há mais espantalho que espigas.
O povo, principalmente a classe trabalhadora, com medo da reação do Serigy governante, famoso pelas perseguições e pela negação ao povo enquanto humano, simplesmente ecoa a mesma cantilena oficial: a terra das maravilhas, um jardim em flor, onde jamais houve erva daninha nem labirinto amedrontador.
Ainda bem que tudo isso naquele outro Sergipe, lugar distante e pouco conhecido. Por isso mesmo muito mais irreal que realidade. Ainda mais quando se sabe que o Sergipe nordestino é paraíso e se plantando tudo dá. E só coisas boas. Não há violência, medo, insegurança.
Escritor
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