Seguidores

sábado, 31 de março de 2018

JOÃO, A CASA E JULIANA

José Ribamar Alves

Querida, minha querida e necessária casa! 
Venho-me a Ti, possuído pelos sentimentos atordoantes,
De uma possível solidão consensual, estampada no olhar
de Juliana, que a mim jurara, preferir morrer a perder um só momento dos seus momentos ao meu lado.

Ó minha querida casa; valha-se da mudez congênita dos teus cômodos, do silêncio adormecido do teu teto e da surdez peculiar de suas portas e janelas, para que se mantenham sem respostas evidentes, minhas evidentes indagações.

Assim, talvez, eu possa sentir o zéfiro suave da paz, encontrada, unicamente, nas flores selvagens do ermo nunca visto e tocado pelos homens.

Será que seria possível pelas fendas triangulares,
Do portão de ferro, proteção alienadora dos portadores da síndrome do medo, as contagiantes energias negativas, adentrarem sobre Ti?

Que motivo teria Juliana, para querer abrir mão do nosso casamento, a não ser suspeitas de uma simples escapadinha,
ou da confirmação pretensiosa de uma suposta interessada,
na posse dos meus desejos sexuais?

Ah, minha casa; palácio dos meus desmerecidos vitalícios;
alcova dos meus delírios afrodisíacos, necrópoles dos meus queridos sonhos mortos, madrinha das minhas insônias desgastantes e refúgio consolidado do meu desventurado ser.

Como eu gostaria de saber, o que, afinal, significa o casamento?
Será uma benção dada por Deus, que nunca se casara?
Ou um acúmulo de dívidas atribuídas aos homens e mulheres,
por, Jesus que também nunca se submetera a tal sentença?

Ah, minha humilde casa!
É, que aquecida pelas malditas chamas do ciúme, Juliana, minha companheira de maus bons e momentos, vez por outra, insinua-me querer desistir do convívio a dois.

Não discordarei se assim o fizer; porque, a meu ver,
o casamento é uma verdadeira servidão, imposta pelos
homens que se vestem como damas, sem a menor ideia sobre o seu significado.

Será que machuquei seus idolatrados sentimentos ou será que
infrigi  as regras pregadas e repregadas pelos bons e falsos profetas,os  quais, na verdade, morreriam pela mantença de suas iguarias refinadas, de suas despesas sem despesas ou de suas vidas tranquilas como o condor que esvoaça os céus pela manhã?
  
Querida, minha querida casa, que seja feliz àquela que me escolhera dentre tantos outros, talvez, simplesmente, pela óbvia vontade de ostentar seu nome de consorte, ou, quem sabe, empurrada por Cupido, de encontro a mim, pelo desejo carnal que aflora em toda jovem que sente a necessidade de amar e ser amada, assim como até os animais, de certo, sentem também?

Que tipo de alma sentiria-se bem, acorrentada pelas leis, como um salteador? Que coração adoraria sentir-se submisso ao amor,
como uma flor às gotículas do orvalho?
Há, como há mistérios entre as coisas de Deus e as coisas dos homens!

Diria eu, assim como dizem os que são proibidos do amor carnal:
não se aproximem do que emporcalha seus espíritos,
fujam da maldição, sejam como são, os cordeiros inocentes;
Mas, desde que minha vida “mansa” continuasse garantida pelos leigos.

Ó meu querido rancho, meu guarda-sol, meu guarda-chuvas;
O que me dirias se por ventura eu te abandonasse
Assim, como as mães desnaturadas rejeitam suas crias?

Quem cuidaria das deteriorações causadas a Ti, senão eu?
Quem me serviria de testemunha para minhas angustiantes em noites mal dormidas, se não fostes tu?

Quem ficaria ao meu lado por tantas horas, pescando palavras desusadas e, escavacando no paiol da solidão, respostas para tudo, se não fosses tu?
Quem ouviria comigo, a voz do silêncio exibida pela garganta dos  esquecidos e o retumbante desabafo das infelizes vítimas dos  impiedosos?

Assim seria eu; sem Juliana a mulher que em pleno
desabrochar dos sentimentos, virara as suas costas para o refúgio da sua mocidade, para seguir sem certeza de como seria seu futuro
à sombra incontrolável do meu querer obcecado.

Ah, minha velha confidente casa!
Nossa história tornou-se mais forte do que o amor que une a mãe ao filho e mais resistente que a fé que vence o impossível aos olhos dos incrédulos.

Mas, se acontecer de Juliana me varar as costa;
não tem nada não!
Não tem nada não; porque saberei ser forte como um vulcão que nunca se deixa adormecer; porque serei frio como a nevasca do Alasca; porque, assim como nasci sozinho, sozinho voltarei ao pó.

Serei forte por ter certeza que nessa vida tudo passa;
inclusive a mocidade, o desejo, o apego, a simpatia e, até mesmo, o amor quando se cansa.

Mas, eu não morreria de tristeza, antes que a esperança,
de me reerguer, viesse a óbito.

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário