Por Geraldo Maia do Nascimento
A província do
Rio Grande do Norte, durante a segunda metade do século XIX, foi assolada por
várias doenças que, em pouco tempo, assumiram um caráter epidêmico, ou seja,
atingiram uma grande quantidade de indivíduos, como a cólera, febre amarela e a
varíola. Essas epidemias geraram além de um grande número de contaminados, uma
elevada mortalidade, principalmente entre as décadas de 1850 a 1890.
O primeiro
registro que temos sobre epidemias em Mossoró está no livro “História do Rio
Grande do Norte – Ministério da Educação e Cultura – Rio de Janeiro – 1955 –
pág. 278”, de Luís da Câmara Cascudo, onde consta que em 1856 o Estado do Rio
Grande do Norte foi visitado pela “Cólera Morbo”, uma doença infecciosa e
contagiosa aguda, causada pelo Vibrio cholerae, transmitida sobretudo pela água
e caracterizada por diarreia abundante, prostração e câimbra. Essa peste deixou
um saldo de 2.563 pessoas mortas na província, sendo 75 em Mossoró. Não existia
serviço médico nem botica em Mossoró, que é como se chamava a farmácia daquela
época, sendo os doentes tratados com ervas e rezas. Natal, capital de
província, possuía apenas um médico e uma botica, insuficiente para atender até
a própria população, ficando os demais municípios entregues à própria sorte. No
período de 1877 a 1879 o município foi mais uma vez castigado com alto índice
de mortalidade causada, principalmente, pela terrível seca dos dois sete. Essa
seca sacudiu para a cidade de Mossoró, que na época contava com uma população
de pouco menos de 8.000 habitantes (dados de maio de 1873), uma multidão
advinda dos municípios do Oeste potiguar e das províncias vizinhas da Paraíba e
do Ceará, de quase 40.000 emigrantes, aqui chegada quase que por um milagre,
nus, famintos e afetados de inchação das extremidades inferiores. A Câmara
oficia ao Presidente da Província a 16 de agosto de 1877, a existência de
febres intermitentes e biliosas gastro-interites, angina de diversos graus e
interites ulcerosas, tendo esta última moléstia vitimado um crescente número de
crianças, segundo nos informa o historiador Luís da Câmara Cascudo em seu livro
“Notas e documentos para a história de Mossoró – Fundação Vingt-un Rosado –
Coleção Mossoroense – 5ª edição – pág. 136. A maioria dessa gente, sem teto que
servisse de abrigo, passava os dias e as noites expostas às intempéries do
tempo, ao sol e ao relento, resultando numa espantosa mortalidade que atingia a
40 pessoas por dia, de formidáveis epidemias como a beribéri, a febre, o
sarampo e posteriormente a bexiga. Diante do exposto, o Presidente da Província
mandou para Mossoró, em 1878, o médico Henrique Câmara com uma botica, e em meados
de 1879 chegou o doutor Luís Carlos Lins Wanderley como médico em Comissão para
atender aos doentes cujo número continuava crescendo, que por aqui permaneceu
por alguns meses. Em 1881 chegou a Mossoró o cearense Dr. Francisco Pinheiro de
Almeida Castro. Era o que podemos chamar de um homem múltiplo: Médico
humanitário, formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro na turma de
1880, cidadão boníssimo, Chefe político de incontestável prestígio em
Mossoró e zona Oeste do Rio Grande do Norte e Venerável da Loja Maçônica “24 de
Junho” de 1895 a 1900. Foi jornalista e como tal um dos mais assíduos
colaboradores do jornalista João da Escóssia na publicação de “O
Mossoroense” jornal esse do qual foi diretor de 1920 a 1922. Era Sócio
correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte. Fez
parte da Constituinte de 10 de maio de 1891. Foi Presidente da Câmara Municipal
de Mossoró no triênio 1890-1892. Foi representante do Rio Grande do Norte na
Câmara Federal, em cujo mandato de deputado veio a falecer em 22 de julho de
1922, aos 64 anos de idade, sem nunca ter saído de Mossoró. Sobre o Dr. Almeida
Castro, Câmara Cascudo depõe: “ Havia também o Dr. Castro, valendo uma
permanência fenificiente e polimática, médico, orador, amigo forte, cirurgião
que a necessidade improvisava, devoto dos magistrais, formulando sempre, mesmo
quando seus futuros colegas haviam rendido às seduções cômodas dos
remédios de frasco. Corria a fama curativa de suas receitas. Era forte,
possante, simpático, impecavelmente vestido, amando a dança, o discurso, o
Cognac”. Foi o Dr. Castro quem trouxe o farmacêutico Jerônimo Ribeiro Rosado de
Catolé do Rocha para instalar sua farmácia em Mossoró em 1890. Já no
primeiro quartel do século XX o município foi atacado mais uma vez por uma
epidemia. Governava o município o farmacêutico Jerônimo Rosado, que havia
assumido a Intendência para o triênio de 1917 a 1919. Foi um administrador
dinâmico que, entre outros feitos, fez levantar grande área de cercas e
preparar terrenos, que foram doados a agricultores pobres, promovendo assim a
primeira reforma agrária do município. Mas foi também nesse ano que se deu a
eclosão da “Influenza Espanhola”, ou “Gripe Espanhola”, moléstia terrível do
após guerra. A gripe espanhola apareceu no final da I Guerra Mundial e, em
menos de um ano, matou milhões de pessoas. A epidemia foi tão severa que nos
Estados Unidos, onde um quarto da população foi infectada e 675 mil pessoas
morreram, a expectativa de vida caiu 10%. A denominação "gripe espanhola",
segundo alguns autores, surgiu na Inglaterra, em fins de abril de 1918. Duas
são as principais hipóteses para essa denominação: a primeira partia do
pressuposto errôneo de que a moléstia havia se originado na Espanha e/ou lá
fizera o maior número de vítimas. Outra explicação afirmava que a Espanha, país
neutro durante a Primeira Guerra Mundial, não censurava as notícias sobre a
existência da gripe epidêmica, daí a dedução equivocada de que a enfermidade
matava mais naquele país. A primeira notícia do vírus da gripe espanhola no
Brasil foi de setembro de 1918, logo depois da chegada de um navio com
imigrantes vindos da Espanha. Vários deles apresentavam sintomas da gripe.
Outro relato dizia que alguns marinheiros sentiram estranhos sintomas a bordo
de um navio que ancorou em Recife. O fato é que no início de novembro de 1918 a
doença já tinha alcançado vários pontos do Brasil. As cidades portuárias foram
as que mais sofreram. No Rio de Janeiro, morreram 17 mil pessoas em dois meses.
Os familiares, desesperados, jogavam seus mortos na rua com medo de contrair a
doença. As avenidas ficaram cheias de cadáveres e presidiários foram obrigados
a trabalhar como coveiros. Os bondes circulavam abarrotados de corpos. Na
frente das principais igrejas, milhares de famílias se reuniam para pedir ajuda
a Deus. Em São Paulo, foram mais de 8 mil mortes. Entre as vítimas da gripe
estava o presidente da República, Rodrigues Alves. Eleito para o cargo pela
segunda vez, não pôde tomar posse e morreu no dia 16 de janeiro de 1919. Os
médicos, também alarmados, não sabiam o que receitar e indicavam canja de
galinha. O resultado foram saques aos armazéns atrás de frangos. Os jornais
afirmavam que o tratamento deveria ser feito à base de pinga com limão ou
uísque com gengibre. No Rio, o sanitarista Carlos Chagas comandou o combate à
enfermidade. Em Porto Alegre, foi criado um cemitério especialmente para as
vítimas da gripe espanhola. Em todo o país foram cerca de 300 mil mortos. Em
Mossoró, logo após os primeiros casos, o Prefeito mobilizou todos os recursos
de assistência disponíveis, quer improvisando isolamento de doentes, quer
pessoalmente dirigindo socorros médicos em remédios e alimentos aos pobres
abandonados. Dessa forma, salvaram-se vítimas. A quantidade de mortos não foi tão
grande, mas muitos dos que escaparam ficaram com sequelas. Foi a maior epidemia
da história, uma pandemia. Ao passo que a Primeira Guerra Mundial, de
1914-1918, matou, aproximadamente, 8 milhões de pessoas, a gripe espanhola foi
fatal para mais de 20 milhões de seres humanos em todo o mundo. Nada matou
tanto em tão pouco tempo. O vírus mutante da gripe assumiu características tão
singulares em 1918, que a chamada influenza espanhola, até hoje, apavora quem
procura entender o que aconteceu naquele ano.
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