Por Antonio Corrêa Sobrinho
Das mortes
anunciadas e não confirmadas do cangaceiro Lampião, penso que nenhuma outra
superou a do dia 12 de janeiro de 1938, em termos de divulgação jornalística.
Jornais em todo o Brasil circularam nesta data com a notícia de que este
bandoleiro, o rei do cangaço, morrera, em terras sergipanas, acometido de
tuberculose, numa das fazendas de Antonio Caixeiro, a “Canhoba”, este pai do
então interventor de Getúlio Vargas em Sergipe, o médico Eronides de Carvalho.
Outros jornais, mesmo sabedores da improcedência da notícia, informaram da
não-morte de Lampião.
Trouxe,
abaixo, o que disseram a respeito alguns dos nossos jornais:
O “DIÁRIO DA
NOITE”, do Rio de Janeiro, um dos noticiosos que tomaram como verdadeira a
informação, assim se pronunciou:
“LAMPEÃO
MORTO, LAMPEÃO POSTO
A certos
respeitos a figura de Lampião parecia um mito, durante quinze anos, as polícias
de seis Estados viveram no seu encalço e de todas as refregas o bandido saiu
ileso e vitorioso.
Dir-se-ia que ele era protegido pelos amuletos, aos quais a crendice popular atribui a virtude incomparável de fechar o corpo dos seus portadores ao efeito das balas. Morreu agora na cama, vítima de tuberculose, como uma donzela romântica. As Parcas somente poderiam cobrar os altos prêmios instituídos pela sua cabeça. Mas as Parcas trabalham de graça.
Lampião era um
fruto do Nordeste, como o xique-xique e o mandacaru.
Permanecendo a terra com as suas condições sociais, não tardará que o Lampião morto suceda um novo Lampião, com a mesma ferocidade, a mesma história meio cavalheiresca, múltiplo e onipresente como os seus ancestrais.
Permanecendo a terra com as suas condições sociais, não tardará que o Lampião morto suceda um novo Lampião, com a mesma ferocidade, a mesma história meio cavalheiresca, múltiplo e onipresente como os seus ancestrais.
Matar o cangaceiro não importa em destruir o cangaço.
Alguma coisa de mais profundo desafia a inteligência e a operosidade dos administradores, antes que se extinga a raça dos Lampiões;
Creio que
nenhum outro brasileiro atingiu jamais o renome e a popularidade internacional
de que desfrutava Virgulino.
A imprensa do mundo ocupou-se daquela figura sinistra e o seu retrato, ao ser conhecida a notícia do seu desenlace tranquilo numa fazenda de Sergipe, aparecerá nas páginas de frente dos grandes diários da América, da Europa e da Ásia.
Pode-se dizer que foi o maior dos cangaceiros nordestinos e esse título, em nossos tempos de confusão e audácia, perpetuará a sua memória na lembrança da posteridade.
Até que outro o suplante nas imaginações. ”
O “CORREIO
PAULISTANO”, por sua vez, atraiu o leitor com manchete afirmativa, mas para
divulgar ser inverídica a notícia:
“A MORTE DO
FAMIGERADO LAMPIÃO
Não é verdade
que o facínora houvesse falecido na fazenda do progenitor do interventor
federal em Sergipe.
RIO, 12 (Da nossa sucursal, pelo telefone) – O interventor em exercício no estado de Sergipe, Dr. Carvalho Barroso, enviou ao interventor Eronides de Carvalho, ora no Rio de Janeiro, o seguinte telegrama:
‘Estão chegando aqui pedidos de informações de agências telegráficas e correspondentes de jornais indagando se Lampião morreu na fazenda de seu pai e de morte natural. Tratando-se de inominável perfídia e invencionices deslavadas, levo fato seu conhecimento. Abraços. Carvalho Barroso, interventor em exercício.’”
“O ESTADO”, de
Santa Catarina, anuncia mas expressão de incerteza:
“VÍTIMA DE UMA
HEMOPTISE, TERIA MORRIDO O BANDOLEIRO LAMPIÃO
CIDADE DO
SALVADOR, 13 – Um vespertino divulga uma notícia procedente de Aracaju, segundo
a qual teria o célebre bandoleiro Lampião morrido, vítima de uma hemoptise.
O fato, segundo ainda aquele despacho aqui divulgado, ocorrera em terras da fazenda Canhoba, de propriedade do senhor Antônio Carvalho, pai do interventor Eronides Carvalho, onde Lampião se recolhera doente, há algum tempo.
Os facínoras do bando guardam sigilo sobre a morte do chefe.
Até o momento, a polícia baiana não recebeu nenhuma confirmação oficial.”
“O IMPARCIAL”,
jornal do Rio de Janeiro, faz jocosidade, graça:
“Extinguiu-se uma chama. Morreu Lampião, um dos mais distintos salteadores. Verdadeiro artista, tinha o curso de ‘fuga’ e era maestro de ‘bando’. Assim que a triste notícia ecoou na Detenção entre os condenados pelos artigos 330 e 356 do Código Penal, o senhor Pula Ventana propôs fossem enviados pêsames à família enlutada. Resolvido também (...) a meio pau e ponto facultativo pros acertadores de relógio no escuro. ‘Valentes do Morro do Neco’ suspenderam o ‘choro’ em sinal de 20% de pesar.”
“O IMPARCIAL”,
do Maranhão:
“LAMPEÃO NÃO
MORREU
RIO, 12 (H) –
“O Globo” Informa que faleceu, ontem, o famoso bandoleiro Lampião, vítima de
tuberculose.
RIO, 12 – A Agência Nacional vem desmentindo, hoje, a notícia veiculada sobre o falecimento de Lampião.”
“O JORNAL”, do
Rio de Janeiro:
“VÍTIMA DE UMA
HEMOPTISE, TERIA MORRIDO O BANDOLEIRO LAMPIÃO
Os seus
companheiros guardam sigilo sobre o ocorrido – Nenhuma confirmação recebida
pela polícia da Bahia.
CIDADE DO
SALVADOR, 11 (A. M.) – Um vespertino divulga uma notícia procedente de Aracaju,
segundo a qual teria o célebre bandoleiro Lampião, morrido, vítima de uma
hemoptise.
O fato, segundo ainda aquele despacho aqui divulgado, ocorrera em terras da fazenda Canhoba, de propriedade do Sr. Antônio Carvalho, pai do interventor Eronides de Carvalho, onde Lampião se recolhera doente, há algum tempo.
Os facínoras do bando guardam sigilo sobre a morte do chefe.
Até o momento, a polícia baiana não recebeu nenhuma confirma oficial.”
O “CORREIO DE
ARACAJU” assim se pronunciou:
O “Diário
Oficial” de hoje publica a seguinte nota:
Este Departamento declara que são absolutamente falsas as notícias veiculadas nos jornais e rádios de outros Estados sobre a morte natural do bandido Lampião, na fazenda Canhoba.
Acredita esta Chefia que tais notícias não passam de explorações a fim de colocar mal o governo do Dr. Eronides de Carvalho, por isso que a fazenda em causa é propriedade do seu progenitor, Sr. Antônio Ferreira de Carvalho.
Respondendo a um telegrama recebido de um periódico de Bahia, sobre o mesmo assunto assim foi expedido: “Grêmio Bahia. Carece fundamento notícia morte Lampião. – Capitão Odilon Siqueira, chefe de Polícia.”
O “CORREIO DO
PARANÁ”:
“LAMPIAO NÃO
MORREU
Vai ser aberto
inquérito, em Sergipe, para apurar quem transmitiu a falsa notícia.
Sergipe, 13 – É completamente destituída de fundamento a notícia sobre a morte do bandoleiro Lampião, a qual, segundo os informes daqui transmitidos, teria se verificado na fazenda do pai do sr. Eronides de Carvalho, interventor neste Estado, ora no RIO de Janeiro.
A respeito, o senhor Carvalho Barroso, ora no exercício da Interventoria, telegrafou ao Sr. Eronides de Carvalho, desmentindo aquela versão e informando que mandou abrir inquérito para apurar de onde teria partido a falsa notícia.”
Deixei propositadamente
para o final, o que disse a respeito o JORNAL DO BRASIL, o valoroso diário
carioca, que considerou como certa a morte de Lampião naquele janeiro de 1938,
informação incorreta que, penso, se não foi motivo de constrangimento e
desabono, deveu-se ao que ao texto do seu jornalista, incumbido de dar a
notícia, Benjamim Costallat, o qual se afastou do lugar comum de elencar
maldades quando o assunto é Lampião, para dizer da importância deste cangaceiro
para os interesses econômicos dos meios de comunicação, uma verdade das grandes
dita sobre uma mentira, a morte de Lampião na casa de Antônio Caixeiro, pai do
homem forte em Sergipe do ditador Getúlio Vargas.
“LAMPIÃO”,
entre os maiores títulos de sua triste glória teve o de ser um dos poucos nomes
da nossa terra que conseguiram repercussão e publicidade fora das nossas
fronteiras.
Não houve reportagem sobre o Brasil e livro de viagem sobre o nosso país que a ele não se referissem.
Ele era, para os caçadores do sensacionalismo, o assunto brasileiro mais empolgante, o motivo mais colorido e a individualidade mais feita desse mistério que permite todos os voos da imaginação quando não alimenta todos os recursos da mentira.
Os especialistas europeus e americanos de reportagens internacionais, precisando servir a voracidade do leitor, cansado mas não farto da sensação que lhe ajuda a gerir a sua refeição pacata e matinal – serviam-se de Lampiao com uma frequência que poderia, em outras circunstancias, chegar a comerver, até às lágrimas, o nosso patriotismo...
Quando Al Capone, pela sua prisão, e Dillinger, pela sua morte, saíram do cartaz dos grandes assuntos – Lampião, e com ele o Brasil, entraram para a notoriedade das reportagens assinadas dos jornais das tiragens astronômicas...
Com a morte de Lampiao, ontem em Sergipe, extinguiu-se, depois de uma agonia longa, pela mesma doença romântica da Dama das Camélias, o Brasil perde um motivo de ser falado na grande imprensa mundial...
Não era, evidentemente, um homem recomendável, nem honroso. Mas os países, como os homens públicos, precisam de publicidade, de toda e qualquer publicidade. Só no silêncio é que está o desprestígio...
Lampião estava para o Brasil como Al Capone para os Estados Unidos.
Era uma
nódoa, mas um assunto.
E, para alguns, um negócio rendoso.
Mas, como nas velhas fitas que acabam smpre bem, o “vilão” foi castigado...
Lampião morreu.
E o Brasil perde a única publicidade que lhe davam de graça, com uma abundância e uma generosidade dignas das gratidões sem limites...
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