Material do acervo do pesquisador Voltaseca
Lampião fugia de um combate na cidade de Mata Grande-AL, no dia 21 de fevereiro
de 1925, sábado de carnaval, quando foi perseguido pelas volantes paraibanas do
Ten. JOAQUIM ADAUCTO / e do Ten. FRANCISCO DE OLIVEIRA, além de uma volante
pernambucana comandada pelo Ten. JOÃO GOMES , tendo ido se instalar com seus
homens na Fazenda SERROTE PRETO, a qual fica na divisa dos Estados de AL e PE.
O total de homens das forças volantes beirava 90 policiais, enquanto os
cangaceiros chegava perto dos 40.
Os cangaceiros ao chegarem na Fazenda SERROTE PRETO, grande parte deles se alojaram numa casa de taipa, com um curral ao lado, enquanto outros, ficaram numas pedras, nos arredores da casa, dando a retaguarda.
O Ten. FRANCISCO OLIVEIRA que vinha na frente com seus homens no encalço dos bandoleiros, ordenou que seguissem imediatamente visando alcançar, o mais rápido possível, o local onde estava Lampião e seu grupo, no que não concordou o Ten. JOÃO GOMES, da força pernambucana, que disse: “ – Os cangaceiros já comeram, meus soldados não vão ficar sem comer “ . Surpreso, o Ten. Francisco Oliveira respondeu: “ – A força da Paraíba, quando tem notícia de cangaceiros, encosta logo “ e, seguiu com sua força.
Logo que chegaram nas proximidades da casa da Fazenda Serrote Preto, receberam uma forte descarga de tiros, vindo do lado dos cangaceiros. Tombaram mortalmente, os soldados Artur, Diménio, Virgolino, e, um negro muito disposto. Também foi morto o Ten. FRANCISCO OLIVEIRA e, ferido o Tenente JOAQUIM ADAUCTO. Os soldados da volante pernambucana que haviam chegado com um atraso, atiravam em direção à casa, atingindo, também, alguns companheiros da volante paraibana, que ficaram na linha de fogo cruzado.
Alguns soldados da volante de FRANCISCO DE OLIVEIRA procuraram se abrigar num trecho de um pequeno serrote ( pedras), de onde passaram a atirar nos cangaceiros. O soldado ANANIAS CALDEIRA DE OLIVEIRA, por sua vez, ficou amparado numa ponta de curral. Dali ele tinha perfeita visão da porta traseira da casa, planejando:
“ – O primeiro que colocar a cabeça, eu derrubo “.
O que ele não esperava é que os cangaceiros abrissem uns buracos na parede da casa, por onde começaram a atirar em sua direção. Surpreendido pelo inesperado ângulo de tiro, ANANIAS OLIVEIRA foi ferido DUAS VEZES. Um dos tiros fraturou-lhe o BRAÇO e, o outro, atravessou a sua FACE lado a lado, à altura do malar. ANANIAS contou, mais tarde, que o tiro recebido no rosto causou tal hemorragia que o sangue jorrava pelos dois lados, em arco.
O SOLDADO ANANIAS, já ferido, ouviu várias vezes LIVINO ( irmão de Lampião) gritar, de dentro da casa:
“– Espere ai, macaco, que nós já vamos sangrá-lo!“
ANANIAS acabou sendo retirado do local pelo soldado Manoel Gabriel que, por ironia, era seu inimigo pessoal. Ele foi levado até um certo ponto , a partir de onde o sargento JOSÉ GUEDES encarregou de levá-lo mais para dentro do mato, isso, acontecendo, em pleno combate. Ali, sozinho, ANANIAS acabou desmaiando, em consequência da grande perda de sangue.
Ao escurecer, o tiroteio cessou, já que ambos os lados tinham esgotado a munição.
No terreiro da casa havia ficado um soldado ferido, sem conseguir se mover. Implorava ao Tem. João Gomes que mandasse tirá-lo dali, porque os cangaceiros ameaçavam sangrá-lo. O sargento JOSÉ GUEDES chamou a atenção do oficial pernambucano, já que ele não ia buscar o ferido e, ouviu dele :
“ – Cada um que cuide de si“
ANANIAS entrevistado pelo pesquisador Dr. Amaury Araujo (em João Pessoa- PB, no ano de 1969), informou-o que aquela altura, a maioria dos soldados já haviam fugido. Os sobreviventes, liderados pelo sargento JOSÉ GUEDES, apanharam os feridos e, aqueles que puderam arrastaram-se para MATA GRANDE, de onde, depois de receberem os primeiros socorros, foram encaminhados para Paulo Afonso.
Assim como os soldados, também os cangaceiros tinham pago um alto preço durante a batalha. ASA BRANCA, GURI E CORRÓ estavam mortos dentro da casa. FATO DE COBRA, CAPUXU E QUIXABEIRA foram feridos.
Alguns cangaceiros, assim que perceberam a retirada dos soldados, saíram com candeeiros, examinando os corpos caídos. No terreiro da casa ainda estava caído o soldado ferido que o Tenente JOÃO GOMES recusara a socorrer. O cangaceiro JUREMA, aproveitou a ocasião e o sangrou.
Por volta da meia-noite, O SOLDADO ANANIAS voltou a si, anda zonzo. O silêncio era total. Sua sede era arrasadora. Seus lábios estavam inchados que pareciam beiços de cavalo. Sentia que todo o seu rosto também estava inchado e desfigurado. A muito custo, apesar da tonteira, conseguiu se levantar e caminhar sem rumo definido. A vegetação, um macambiral muito grande , era agressivo e dificultava o avanço. Logo suas calças estavam destruídas pelos galhos, tornando-se imprestáveis para protegê-lo.
Ao amanhecer de segunda-feira, dia 22, ANANIAS viu-se à beira de uma estrada. Escolheu uma direção e seguiu em frente, sentindo sua fraqueza crescer, e o mal estar causado pelos ferimentos agravar-se com a fome e sede. O sol nasceu e apareceram moscas varejeiras que vagueavam sobre suas feridas, cada vez mais infeccionadas. Mas ANANIAS estava determinado a não se deixar vencer. Amarrou um lenço preto no rosto, protegendo-o contra os insetos e, prosseguiu sua penosa jornada, pensando:
“A esta altura, se escapei de morrer a bala, vou morrer de fome e de sede“.
Ao seu redor não havia nada para comer ou beber. Lá pelas 22 h, tendo caminhado desde a meia-noite do dia anterior, ANANIAS estava cansado, ferido e cada vez mais enfraquecido. Ouviu um galo gritar. Deixando a estrada, foi em direção ao som, entrando por um varedo de bode, passando por uns umbuzeiros e chegando, finalmente, aos fundos de umas casas.
PENSOU:
“- Não vou chegar pelos fundos, senão poderão pensar que sou um malfeitor e vão querer me matar“.
Encontrou forças para dar a volta e chegar à frente das moradias; entrou numa delas, feita de palha e, deparou-se com uma velha, a quem perguntou:
“– Dona, será que a senhora pode arrumar água morna com sal, prá eu lavar meus ferimentos ?“
- O senhor é praça ou cangaceiro? – Ouviu em resposta.
“– Sou soldado das forças da Paraíba.” – Disse ANANIAS.
A velha levantou-se e foi providenciar, voltando com o que tinha sido pedido. ANANIAS despiu sua túnica e lavou seus ferimentos. Depois tomou muita água, saciando sua sede. Para sua surpresa ficou sabendo, mais tarde, que aquelas casas pertenciam a Mata Grande.
Durante as 24 horas de sua jornada, a maior parte do seu tempo arrastando-se, pois não conseguia andar regularmente. ANANIAS havia avançado, apenas, duas léguas. Embora, ainda não estivesse totalmente refeito. ANANIAS sentou-se na calçada em frente à casa. Aproximou-se um senhor vestido de cáqui.
ANANIAS perguntou-lhe:
“– O senhor sabe informar onde está a força policial da Paraíba?“
- Posso. Está em Paulo Afonso.
Tão logo conseguiu andar, ANANIAS seguiu para a cidade indicada, reencontrando seus amigos e, companheiros, sendo cuidado pelo farmacêutico João Gaudêncio, que o incluiu entre seus pacientes.
Ali em Paulo Afonso faleceram em consequência dos ferimentos, um soldado e o Tenente JOAQUIM ADAUCTO . A contagem final da batalha acusou, além de inúmeros feridos, a MORTE DE DOIS OFICIAIS E DEZ SOLDADOS.
OBSERVAÇÕES –
1º) Matéria compilada da obra “ De Virgulino a Lampião “, pgs 109/110, autor Antônio Amaury Correa de Araújo / Vera Ferreira.
2º) Foto do soldado ANANIAS CALDEIRA DE OLIVEIRA ...pertencente ao acervo particular do escritor, acima citado.
3º) Fotos de Serrote Preto, A CRUZ DOS SOLDADOS e, demais, acervo Volta Seca...
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