Por: Jornalista Antonio Galdino
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Saímos de Paulo Afonso, para Carqueja, antiga Nazaré, onde houve a maior repressão a Lampião na época do cangaço. As volantes que saíam dali eram conhecidos como “os nazarenos”.
Acompanhado do escritor João de Souza Lima fomos conhecer e gravar um entrevista com o
Ten. João Gomes de Lira, um dos últimos remanescentes daqueles tempos.
Nascido em 3 de julho de 1913 na Fazenda Genipapo, distrito de Nazaré do Pico – Carqueja – Município de Floresta/PE nos recebeu com a peculiar simpatia do sertanejo, com direito a lanche e boas conversas. A sua casa, muito procurada por pesquisadores até do exterior, é quase um museu.
Ali está a farda dos seus tempos de combatente e, guardada a sete chaves, a sua Winchester 44, cuidada pelo caseiro e pelo filho. Fotos do tempo de militar da ativa, diplomas e homenagens estão espalhados pelos móveis e paredes da casa. O velho tenente nos recebeu na frente da casa, debaixo de uma frondosa árvore e nos contou, sem nenhum rodeio a sua versão dos acontecimentos, que estão publicados em dois volumes, com mais de 700 páginas com o título: “Lampião – Memórias de um Soldado de Volante”.
Primeiro falou de seu estado de saúde: “Minha saúde não anda boa, embaraçada. Diabetes, nervos, coração” mas logo começou a relator o que viu nesses anos de luta.
Deixamos que ele falasse e um dos fatos que narrou com detalhes foi a chegada de Lampião, Antônio e Livino, distribuídos estratégicamente no lugarejo.
Ten. João Gomes de Lira – Aí, eles chegaram. Os três irmãos, todos armados. Lampião acolá, Antônio aqui e Livino ali do outro lado. Lampião ficava jogando o rifle pra cima e aparando e gritava: - Aqui hoje não me chora ninguém! Aí, Antônio respondia: - Se chorar eu acalento! E Livino respondia: - Bem baixinho! E ficavam repetindo.
Aí pai, (Antônio Gomes Jurubeba, que era Delegado) chamou eles e disse: - Não façam isso não. Hoje é dia de feira, vocês armados assim, o povo tá todo apavorado. Guardem as armas, vocês têm os inimigos lá, na Serra Vermelha. Aqui vocês não têm inimigos. Eles não vêm aqui e vocês podem ficar à vontade. E Lampião disse: - Pode dizer ao delegado que as armas estão guardadas nas nossas mãos e nos ombros. Pode vir tomar. E pai disse: - Isso não é modo de se falar com Delegado. E Lampião disse: É isso mesmo!
Então pai falou: Se daqui a oito dias vocês voltarem com as armas podem se preparar pra gente trocar tiro aqui no meio do povo. Aí Lampião disse: - Junte seus cachorros e jogue em cima dos Ferreira pra você o peso dos Ferreira como é. Foi aí o começo da questão aqui, em 1917.
E continua, seguro, o Ten. João Lira: - Passados uns dias, eles foram pra Triunfo e dias depois resolveram vir pra cá. Os três irmãos Ferreira e mais outro cabra, também armado.
O pai de Lampião foi encontrar-se com eles e pediu pra não vir que aqui tinha soldados. Depois de muita insistência Lampião insistindo até que foi convencido de não entrar e saiu aqui por trás. Ali deram um tiro e a polícia foi ao encontro deles.
Meu pai juntou mais alguns parentes que tinham armas e foram ajudar a polícia. Eram os Flor, Euclides, Odilon, Arcôncio, Cícero Leite e trocaram tiros. Foi quando Livino Ferreira foi ferido. Os outros correram e Livino foi preso e levado para Floresta. Foi aí que o pai deles resolveu se apressar em vender as coisas pra ir embora.
O Ten. João Lira fala sobre o casamento de Licor, com quem Lampião tinha namorado mas veio para o seu casamento e teria carregado a sanfona e com isso acabado a festa. Falou da morte da mãe de Lampião, Maria Lopes “de aperreio” e do assassinato do pai José Ferreira dos Santos.
E a prosa continuou por quase uma hora, com episódios de enfrentamentos da força policial contra os cangaceiros, inclusive um de 1º de agosto de 1923. O ten. tinha então 10 anos. Em 16 de julho de 1931, com 18 anos entrou na carreira militar e já seguiu para a Bahia para atender um pedido de apoio do governo baiano. Seu comandante era o parente e compadre Manoel de Souza Neto sob as ordens de quem participou de muitos combates com o grupo de Lampião.
(LEIA: - "Lampião – Memórias de um Soldado de Volante" – Vol. I e II – João Gomes de Lira – editado pela Prefeitura Municipal de Floresta-PE - 2007).
Extraído do blog "Folha Sertaneja"
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