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quinta-feira, 23 de março de 2017

A HISTÓRIA DO CANGAÇO MERECE SER REESCRITA

* Por: Antônio Neto

O objetivo deste artigo consiste em abordar a forma como vem sendo escrita e tratada a história do cangaço. Todavia, pouco se tem levado em conta a fundamentação das pesquisas nessa área, não só na elaboração dos dados, mas, notadamente, na abertura de caminhos para a descoberta das relações dos pesquisadores com o próprio processo de conhecimento no aprofundamento das questões passadas no Sertão nordestino. Muito do que foi escrito, acerca do cangaço, tende a ficar retido na peneira da verdade e muitos outros irão se perder na poeira do tempo.

Historiar o cangaço é um termo recorrente. Existe um acervo enorme sobre esse tema. Sem nenhum exagero, há mais de 500 títulos que abordam o assunto. Quase todos os meses, um novo livro é lançado sobre essa proposição. 

Essa temática tem sido o motivo de muitas reportagens na mídia falada, escrita e televisiva, além de ser uma fonte perene para pesquisadores do Brasil e do exterior.

Qualquer escrito sobre essa questão carrega de importância esse contexto, embora, pouco se tenha valorizado os dados efetivos e consistentes. De um modo geral, as pesquisas realizadas até o momento, sobre essa epígrafe, têm seguido a linha da entrevista vocal, na qual o entrevistado narra a sua versão, sem o compromisso de apresentar provas, tudo feito na base do que ouviu dizer. Desse modo muitos textos foram produzidos em cima de simples falatórios. Apesar disso não tira o mérito do escritor, nem torna a sua obra menos valiosa. Sem esses pioneiros da pesquisa e da escrita, nesse campo, nada teria sido registrado nos anais da história do cangaço. Os precursores dessa gesta merecem o reconhecimento de todos os estudiosos do cangaceirismo, sobretudo, pela coragem na investigação dos acontecimentos ao longo da trajetória cangaceirada nas quebradas do Sertão do Nordeste, contribuindo de modo substancial com a sua contextura histórica. 

Centenas de obras acerca desse objeto, especialmente no tocante a Lampião e outros bandoleiros, foram lidas pelo autor deste artigo, desde os primeiros títulos em formato de livros sobre essa proposição, entre os quais, destacam-se: “Lampeão – Sua História” (1926), redigido pelo jornalista paraibano, Érico de Almeida. Em sequência, “Viajando pelo Sertão” (1934), de Luiz da Câmara Cascudo, “Lampião – Documentário” (1934), de Ranulfo Prata, “Serrote Preto” (1961), de Rodrigues Carvalho, “Cangaceiros” (1953), de José Lins do Rego, “Lampeão” (1953), de Optato Gueiros, o “Rei dos Cangaceiros” (1954), de Nelly Cordes, “Lampião Cangaço e Nordeste” (1970), de Aglae Lima de Oliveira, “Lampião Seu Tempo e Seu Reinado” (1980) de Padre Frederico Bezerra Maciel e outros mais. Entretanto, é valido ressaltar que esses livros e tantos outros, que vieram depois destes, com ressalva de alguns, foram elaborados com o caráter descrito e narrativo fundamentados em opiniões pessoais individualizadas, isto é, sem comprometimentos com dados reais, tais como documentos, fotografia e citações de fontes confiáveis. 

Nesse contexto, há exceções para os escritores Geraldo Ferraz, Frederico Pernambucano de Melo, Billy Jaynes Chandler que, além de opiniões individuais, pautaram suas produções na exploração bibliográfica em materiais publicados em livros, artigos de jornais, revistas e, ainda coletas em acervos públicos. Enquanto, os demais seguiram o critério da investigação oral, tais quais os primeiros, sem o aprofundamento na cata de elementos concretos sobre a conjuntura do banditismo no Nordeste. Fica aqui uma indagação: por que os escritores não fizeram uso dos autos dos processos existentes nos arquivos da polícia e da justiça para narrarem a saga do cangaço, se ali reside, toda verdade desse caso? Não é fácil entender a razão que levou pesquisadores, historiadores, escritores, estudiosos desse fenômeno escreverem, sobre essa temática, utilizando-se apenas, de opiniões pessoais de alguns, em vez de fazerem uso dos autos de processos judiciais e de arquivo policiais no âmbito do cangaceirismo, os quais, ainda hoje, se encontram em acervo público da justiça de Pernambuco e de outros estados à disposição dos interessados.

Caso as obras existentes, a respeito desse argumento, tivesse sido fundamentadas em elementos reais, a história do cangaço seria bem diferente da que existe, pois são essas fontes confiáveis que retratam a verdade desse caso.

A leitura minuciosa dos processos que envolveram os cangaceiros, principalmente os personagens Antônio Silvino, Sinhô Pereira, Luiz Padre e Virgulino Ferreira – o Lampião, levou-me à conclusão de que a história do cangaço merece ser reescrita, em fundamentos reais, para o bem da verdade.

* Antônio Neto é pesquisador, biógrafo, escritor, dicionarista e poeta.
Fonte: Revista de Literatura Novo Horizonte
Edição: Maio / 2015

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