Por Verluce Ferraz
Este surgiu de um desejo e necessidade de introduzir motivos sobre a participação canina entre grupos cangaceiros lampiônicos, para completar minhas impressões acerca de traços essenciais da personalidade dos mais famosos cangaceiros Virgulino Ferreira da Silva e da Maria de Déia, a Maria Bonita. Como em toda ciência, também no conhecimento sobre a o comportamento animal exige um trabalho de pesquisa extensa. Por ser um estudo fora de laboratório peço aos leitores que relevem os pequenos lapsos. Alguns fenômenos obrigam a examinar sob vários aspectos fatos que ainda não foram estudados, mas que são necessários. "Portanto, como é a teoria que dá valor e o significado que os fatos têm, ela frequentemente é muito útil, ainda que parcialmente falsa; pois ela projeta luz sobre fenômenos a quem ninguém dava atenção , obriga a examinar sobre vários aspectos fatos que ninguém estudara antes , e estimula pesquisas mais extensas e bem sucedidas” (Guillaume Ferrero)
Não posso
deixar de chamar atenção do leitor para as peculiaridades e de fantasias que
surgem decorrentes de exemplos que tratam alguns livros sobre as relações dos
animais que acompanhavam os cangaceiros. É que mesmo que haja uma interação
animal e ser humano não há possibilidade de penetrar na área subterrânea do
conteúdo existente dentro da cabeça do animal. Segundo a fonte “Os cães na
cultura humana” a inteligência canina refere-se a capacidade que o animal
possui para captar informações e fixá-las em seu conhecimento, sendo que estas
noções serão utilizadas durante todo o período de vida. No entanto os animais
não são capazes de ampliar nem de expandir tarefas criativas mantendo hábitos e
costumes naturais de suas espécies.
Algumas
descrições mostram que os cães são hábeis para algumas tarefas condicionadas,
mas incapazes de raciocínios morais. O cão tem seu comportamento modificado e
até é possível colaborar com o ser humano em determinadas tarefas, mas não é
raro ocorrer uma metanóia no seu comportamento e não capazes de expandir nem
tampouco levar à matilha os comportamentos adquiridos.
Quem conseguiu
ler o livro Dos mitologemas na imortalidade do passado lampiônico... há de
lembrar que buscamos raízes no drama de Édipo para constatar os comportamentos
dos cangaceiros,que nos deparamos com uma multiplicidade de singularidades nos
comportamentos de cangaceiros e da grandiosidade de da tragédia e sobras do
passado de Virgulino, o Lampião. Mas também é necessário nos voltarmos e lançar
nova luz sobre conjunturas psicológicas individuais.
O Animal
idolatrado pelo cangaceiro Lampião e sua companheira Maria de Déia, conhecida
por Maria Bonita, é o cachorro. Os cangaceiros chegam a colocar jóias nos cães
– notamos aqui que o significado do animal coincide com o instinto agressivo do
cangaceiro. No filme feito por Abhaão Benjamim aparece primeiramente a Maria do
Capitão recebendo um chapéu e jóias das mãos de Lampião, e o cachorro não
exerce um papel diferente, e podemos dizer quase tão importante quanto a mulher
quando surge ornado de jóias que indica quase o mesmo episódio de semelhança
entre o animal e a mulher. Parece existir entre essas, uma relação íntima que
as conduz à mesma finalidade. A imagem da mulher e o cachorro tornam-se
símbolos da libido e em alguns pontos, quando os conceitos se encontram o fator
comum às duas imagens está na libido. Sob o aspecto do cangaceiro e do animal
surgem como representação da idéia do homem com sua esfera dominada de
instintos animais. Neste caso, o cachorro surge como animal e/ou mascote do
cangaceiro e da mulher. Identificação com o cangaceiro. Tudo isto corresponde a
manifestações características do inconsciente. Em nenhum momento vimos outro
animal substituindo o cachorro, mesmo que os cangaceiros tenham grande relação
com os equinos, e suas atividades de almocreve. Os cavalos serviam aos
cangaceiros como meio de transporte e eram constantemente trocados de acordo
com as necessidades, mas não foram criados quaisquer laços afetivos entre eles.
Em momentos críticos os cangaceiros abandonavam os cavalos assim como roubavam
outros, tudo com a finalidade de facilitar as a logística dos cangaceiros. Por
isso também é compreensível que o cachorro, como símbolo do componente animal
do homem, tenha amplas relações com os cangaceiros. Lembremos que Lampião foi
almocreve, que surrava os cavalos, mas os cavalos aparecem nessa relação como
força e brutalidade, característica do cangaceiro Lampião. No caso o canino é
um animal menor e domesticável, por isso o significado fálico. A explicação da
sensibilidade do cangaceiro Lampião, mostra em alguns momentos em que entrega
jóias para a Maria, é que ele se identifica com a mãe e por isso age de modo
bastante glamoroso. Um fato importante que psicologicamente percebemos é que
Lampião era aparentemente poderoso e isso tem identificação com a própria mãe.
Já vimos em outros comentários tecidos neste, que a preferência do cangaceiro
recai sobre o cachorro porque ele vai colocar jóias na mulher e sobre o animal
como símbolo do composto da libido, uma das criações de Lampião é a
transformação da libido em atividade artística e estética. O presente trabalho
ficaria incompleto se não mencionássemos que o cachorro de Lampião exercia
papel fundamental para a Maria de Déia que também se identificava com o animal
que a acompanhava em modo de submissão para todos os lugares. A figura
produtora das fantasias na Maria de Déia relatam este ou aquele traço da sua
autora; ela ainda não tinha consciência da parte masculina de sua natureza. O
ideal representado através do homem não a obriga a nada, apenas possibilita
pretensões fantásticas. Se o ideal fosse o seu sexo, ela poderia descobrir que
não correspondia inteiramente a ela. A forma teatral de Maria impressionava o
cangaceiro Lampião e ela produzia nele sentimentos dificilmente compreensíveis
para serem substituídos pelo cangaceiro que almejava dela também o seu lado
feminino.
Temos que
ocuparmo-nos com o assunto dos cães analisando as suas naturezas, sua vida
fisiológica. Os cães dos cangaceiros eram adquiridos já na idade adulta, não
viviam em cativeiro tampouco se reproduziam. Por isso mostram que seus
criadores também condicionavam os animais aos seus estilos; os cães tinham a
energia psiquica de seus criadores. Eram seres vivos independentes, dando para
simbolizar o inconsciente em seu aspecto plástico-criador. Unidos aquela força,
com aventuras nefastas para realizar tarefas, eram instrumentos nas mãos dos
cangaceiros. Algumas características encontradas nos cangaceiros tornaram-se
características para os animais. “O adestramento de caninos não foi o mesmo que
o almocreve dava aos seus animais de grande porte e de montaria, mas os cães de
acordo com o ambiente modificaram os impulsos de latir, de procriar. Assim o
homem pode levar o cão ás doenças, ao envelhecimento com problemas de medo,
depressão e mudanças de humor. “O cão aceita o seu dono como chefe da matilha”.
No dizer de MacLean, elas são três computadores biológicos que, embora
interconectados, conservam, cada um, nas palavras do cientista. É aí que nascem
os mecanismos de agressão e de comportamento respectivo. É aí, também, no
complexo-R, que se esboçam as primeiras manifestações do fenômeno de
ritualismo, através do qual o animal visa marcar posições hierárquicas no grupo
e estabelecer o próprio espaço.
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