Por José Cícero Silva
José Cícero no
Cariri Cangaço em Aurora
Muito já se
sabe sobre a história de Lampião em seus quase 20 anos de intensas estripulias
pelos sertões de sete estados nordestinos. Porém, ao contrário daquilo que
muitos ainda imaginam, inclusive bons pesquisadores e outros “escribas
livrescos”, há muito ainda a ser desvendado e escrito acerca da saga
lampiônica pelos grotões sertanejos do Nordeste.
Arte de Carlão
Informações
fundamentais para que se consiga de uma vez por todas, compreender tal história
e assim, fechar-se o imenso círculo do subjetivismo narrativo de toda esta
complexa empreitada de quatro décadas chamada Cangaço.
De longe o
mais importante fenômeno social já ocorrido nos sertões nordestinos que
teve na figura humana e singular de Virgulino Ferreira da Silva – o Lampião, o
seu principal protagonista. Conquanto, quer seja como herói ou como bandido, o
certo é que Lampião representa até os dias atuais um autêntico divisor de águas
no que concerne à história sertaneja. Posto que, depois dele o sertão com sua
gente nunca mais seria o mesmo.
E neste
dualismo existencial, quer seja para o bem ou para o mal, os feitos produzidos
pelo caatingueiro vilabelense, rei do cangaço entraram definitivamente para à
história como algo imorredouro, fornecendo ainda
hoje combustíveis inesgotáveis para grandes debates e discussões
acaloradas. Algo só comum quando se trata de grandes personagens da história
humana na sua dimensão universal.
O cangaço,
portanto, com sua escalada de feitos e violências, a partir de Lampião ocupou
de vez grandes espaços na agenda sociopolítica do litoral, chamando assim as
atenções da opinião pública não somente de dentro do Brasil. Fazendo com que a
sociedade da época começasse a dá-se conta da péssima situação de miséria,
violência, injustiça e abandono em que se encontravam submetida populações
inteiras dos sertões do Nordeste por anos intermináveis de sofrimento e
abandono. Só a partir de então, diria que efetivamente, o sertão dos esquecidos
passou a fazer parte do país dos poderosos. Porém, a história dos oprimidos
continuaria ainda a ser escrita/descrita sob a pena dos vencedores.
O fato é que,
Lampião, a um só tempo, foi vítima e também responsável por parte importante
deste verdadeiro estado de barbárie quase absoluta que se abatera sobre os
rincões inóspitos e abandonados do interior do Nordeste pelos poderes da
capital. Razão porque (hoje mais do que nunca) é preciso analisar de modo
objetivo e distanciado de quaisquer ranços de ódio ou de paixões, as muitas
faces e roupagens com que se vestiu o espectro do cangaço em sua
dimensão mais realista e mais cruel. Assim como, todas as motivações
que se impuseram sobre os povos dos sertões forçando muitas vezes a ingressarem
na vida cangaceira, seja por vingança ou mesmo por pura necessidade de
sobrevivência.
José Cícero no
Cariri Cangaço em Aurora
Muitos dos
quais como jagunços à serviços dos coronéis seus patrões. Depois, como
integrantes de grupos e subgrupos de temíveis cangaceiros que durante aqueles
anos infestaram a região de uma ponta a outra. No mais das vezes indivíduos
perigosos e sanguinolentos acostumados ao sofrimento de um mundo sem lei para
os quais a única lei que realmente valia era a “lei do cão”, cujo roubo, a
vingança, a morte e o uso da força eram no senso comum de
sua maioria a expressão mais forte e mais sentida.
Neste aspecto,
é possível muito bem se afirmar por exemplo, que a dinâmica do coronelismo da
época que grassava pelos sertões muito pouco se diferenciava do cangaço em
seu modus operandi corporificado por sua sanha absurda de
criminalidade, opressão, pilhagem e injustiça de toda sorte. De modo que,
em ambos os casos, foram sempre os sertanejos mais pobres, suas vítimas em
potencial. Todavia, no contexto em que se precipitaram todos aqueles
acontecimentos dantescos, Lampião e sua gente, seriam apenas mais um, que por
vingança, sobrevivência ou manutenção da honra acharam-se no ‘direito’ de
tentar fazer justiça pelas próprias mãos.
Como se
percebe, mais uma evidência de que quando o Estado não se impõe aos homens por
um dever de justiça, os homens se voltam contra Ele como que pela justiça do
dever que lhes negaram. E assim, ambos se fizeram criminosos, tanto pela
indiferença quanto pela omissão de todos em relação ao bem comum. E nesta correlação
de forças, o povo do sertão foi o grande derrotado. Por conseguinte, com
ou sem a marcante presença de Lampião(um homem que se fez valente para não
sucumbir), os sertões nordestinos nunca foram o tal ‘céu de brigadeiro’ como se
fingia crer a maioria perante a manutenção do status quo dos
poderosos em sua aparente tranquilidade bizantina.
Assim, de modo
um tanto quanto enviesado e incompreendido, eis que Lampião – o legítimo
sertanejo, continua ainda hoje(quem sabe) na memória histórica e coletiva do
povo a pagar sozinho o alto preço de uma injustiça institucionalizada que se
fizera madrasta dos necessitados ao longo de todo este tempo sofrível de
guerra, tragédia e de paz.
José Cícero
Professor,
Pesquisador, Escritor
e Conselheiro
do Cariri Cangaço.
Autor do
livro
"LAMPIÃO
em Aurora: Antes e Depois de Mossoró"
Fonte:http://blogdaaurorajc.blogspot.com.br
E de 25 a 28
de Julho
Cariri Cangaço
Piranhas 2015
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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