Por Sálvio
Siqueira
É sabido por
todos que estudam o tema cangaço, fase lampiônica, que o mesmo sempre procurava
andar a pé e próximo a alguma elevação natural para, se preciso fosse, subir e
ficar em posição que lhe desse vantagem sobre seus inimigos, assim como ser
mais fácil apagar os vestígios de sua passada, pois os mesmos andavam em fila
indiana.
Porém, em
certos planos idealizados por ele, quando tinha, por algum motivo, se locomover
com maior rapidez, usava animais como montaria. Temos que lembrar de como era o
sertão nordestino naqueles tempos, sem quase estradas de rodagem, e quando
havia, era ligando uma cidade a outra, nunca um sítio ou uma fazenda a outra,
e, em muito lugares, só havia mesmo uma vereda, trilha por onde muitos da
região passavam para fazerem a viagem mais rápida.
Lampião, na
segunda metade do ano de 1926, com mais de uma centena de homens, todos
montados em cavalos, burros e jumentos, entram na região do Pajeú das Flores
com uma meta planejada. Antes da execução das suas missões, após vários estudos
sobre como ocorreram, notamos que ele assim procedia, o chefe mor dos
cangaceiros, além de seu principal ‘alvo’, conhecedor como era do terreno,
sempre tentou fazer uma espécie de ‘arrastão’, para melhor se sair
financeiramente, já que tinha que esconder-se e deixar a poeira baixar antes de
praticar nova incursão.
Sempre de
olho, mesmo tendo um só, via mais que os dois dos outros, ele calculava tudo
que pudesse dar errado. Estudava as vias de escape assim como as vias por onde
poderiam surgir inimigos. Sempre mantinha alguns mais informados do que os
restantes, e esses, escolhidos a dedos, tinham que o defender até mesmo se
alguém dentre eles quisesse eliminá-lo, o que poderia acontecer.
Como sempre,
Virgolino usa seus colaboradores para suas ações. Dessa vez ele chega com seu
bando completo na fazenda Monte Sombrio. Propriedade do seu amigo Xandinho,
Alexandre Gomes de Sá. Tem uma pequena prosa com ele e parte em direção ao
destino escolhido. Antes, porém, chama um dos cangaceiros de confiança, dessa
feita foi o cangaceiro Moita Braba, passa algumas ordem e deixa com ele, alguns
cabras da cabroeira, afim de, se ocorresse algum imprevisto, o mesmo deveria
levar os homens e atacar o inimigo pela retaguarda.
Lampião seguia
em direção a fazenda Tigre, sendo alto sustentável, de propriedade da viúva
Santina Gomes de Sá, conhecida em toda a região por “Santina do Tigre”. Mulher
forte, que ao perde o marido, não esmoreceu e tomou as rédeas da administração
da grande fazenda.
Mesmo tomando
todas as precações possíveis, Lampião e sua horda não passam despercebidos. Um
dos moradores da fazenda, estava cuidando da lida em algum recanto da
propriedade e avista aquele ‘exército’ de cangaceiros rumando na direção da
sede da fazenda. Sabendo onde se encontrava, ele encurta o caminho, pega um
atalho e chega muito antes, e dá à notícia a patroa. Essa fica preocupada, está
apenas com um de seus filhos em casa, e, é mesmo pensando nele, que a
preocupação aumenta. Ela então ordena que Miguel, seu filho, vá para a casa,
fazenda, dos vizinhos e deixa-se que ela toparia o “Rei dos Cangaceiros”. Pois
bem, em vez de seguir as ordens da mãe, ele faz que vai, da uma volta e escolhe
um local alto e com mato, esconde-se e fica a observar o que aconteceria.
O tempo passa,
mas para aquela senhora, parece estar parado. Muitos pensamentos vinham e iam,
iam e vinham, tornando angustiante aquela situação. Por fim, já quando o sol
inclemente não deixa que plantas e objetos façam sombra, surge no terreiro da
sua casa um bando de terríveis cangaceiros. A nata dos mais falados cangaceiros
estavam diante dela, tais como Esperança, Sabino Gomes, Corisco, Sabiá,
Jararaca, Luiz Pedro, chá Preto, Pai Véio e mais uma ruma deles, além, é claro,
do mais temido, Virgolino Ferreira, o Lampião.
Um cavaleiro
cutuca as esporas na barriga da montaria, se adianta dos outros e se apresenta.
Era Lampião. Após se apresentar, o cangaceiro diz:
“ “- Dona
Santina, quero uma coisa da senhora.”
“- Diga, pois
não, o que é que o senhor quer?” (respondeu perguntando a viúva)
“- Eu quero um
arrancho aqui, quero descansar meu pessoal, botar abaixo aqui, demorar, fazer
almoço e passar o resto do dia.” (esclarece o chefe cangaceiro)
“- Tudo bem,
não tem problema nenhum. A casa tá às ordens, passe o tempo que você quiser. O
cercado taí, bote os cavalos na roça, tem legumes nos vasos pra fazer almoço,
tudo bem, mas eu quero garantia pra minha casa e pra meu povo.” (diz
corajosamente a dona da fazenda)
“- Num se
preocupe, Dona Santina, que aqui num se bole com ninguém. Tá garantido, aqui ninguém
mexe com a senhora, pode ficar despreocupada.” " (termina por dizer o “Rei
Vesgo”) (MC e CF, 2016)
A situação nos
faz dizer e fazer determinadas coisas, que nós mesmos, depois que passa o
momento, não acreditamos. Creio que foi o que passou pela mente daquela
senhora. Em seguida ela passa a dar ordens para as mulheres da ‘casa’ cuidarem
em aprontar comida para todo o bando. Satisfeito com aquela receptividade,
Lampião e seu ‘Estado Maior’, na ocasião, Antônio seu irmão, Sabino Gomes, Luiz
Pedro e outros, ficam arranchados na própria sede, os demais vão se acomodando
aonde achavam melhor.
Por
coincidência, ou ironia do destino, uma volante sob o comando do cabo Domingos
Cururu, Domingos de Souza, estava dando uma batida próximo àquela região por
ordens do Capitão Antônio Muniz de Farias, e a mesma encontrava-se nas terras
da fazenda Laje, propriedade de um dos filhos de Dona Santina, conhecido por
Yoyô do Tigre, Sérgio Corrêa, não distando mais que 1/5 de quilômetro da sede
onde se encontravam os cangaceiros. Como a fazenda Tigre era muito extensa,
definiu-se, acreditamos que pela Matriarca, que uma faixa de terra passava a
‘pertencer’ ao filho. A volante era formada pelo comandante, dois Aspeçadas e
trinta soldados. A tropa estando acampada no riacho que leva o mesmo nome da
fazenda de Yoyô, e estando tão próxima a sede da fazenda Tigre, dois homens da
volante são incumbidos de irem até a casa e se abastecerem com água e, ao mesmo
tempo, tentar saber de alguma informação sobre cangaceiros. Era de praxe, todo
volante andar com cuidado aos sinais deixados no solo árido da caatinga. Assim,
os dois homens seguem, mas em silencio e em busca de algum vestígio quando de
repente notam a movimentação dos bandidos pra lá e pra cá no terreiro da casa
sede. Abaixam-se, e retornam para junto do restante da tropa, relatando em
seguida o que notaram ao comandante, o qual traça um plano e ordena que avancem
cautelosamente formando um semicírculo em direção a casa grande.
Lampião parece
se sentir em casa. Tranquilo, abre um dos bornais, retira alguns papéis,
senta-se numa cadeira da mesa e começa a rabiscar alguma coisa nos ditos
papéis. Tudo isso é meticulosamente observado pela dona da fazenda. Com certeza
o que escrevia o chefe cangaceiro seria cartas, ou bilhetes, de extorsões
endereçadas (os) aos homens que tinham dinheiro na região. De repente, ele
estanca com o que está fazendo, levanta-se e vai em direção a porta da sala.
Retorna e, de repente, solta a goela no mundo dando o alarma aos seus homens
que estavam cercados pelos ‘macacos’.
A partir desse
momento, tendo perdido o fator surpresa, pois não estavam totalmente
posicionados, os soldados procuram responder os tiros que vinham de várias
direções onde se encontravam os cabras de Lampião. Lampião, dentro da casa, escolhe
uma janela e começa a manda bala dali. O interessante é que não dando tempo de
cercar totalmente a casa sede, a coluna do cabo Domingos Cururu, fica
exclusivamente diante da frente, com isso, a parte de trás, fica totalmente sem
ter ataque, no entanto, alguns cangaceiros que lá estavam, danam bala para o
alto com a nítida intenção de afugentarem a tropa.
O tempo se
fecha e o tiroteio se acirra a cada minuto. Dona Santinha e as outras mulheres
procuram a todo custo um local para se protegerem. Notando a agonia delas,
Lampião grita vendo que elas adentravam em um dos quartos da casa:
“- Dona
Santina, fique ai e num se preocupe que aqui ninguém bole cum a senhora.” (MC e
CF, 2016)
Escutando o
barulho dos disparos, Moita Braba grita para seus homens e, junto ao dono da
fazenda, Xandinho, seguem para tentarem pegar a volante pela retaguarda como
previra seu chefe.
Um dos
soldados no meio ao tiroteio, nota que um dos cangaceiros não muda de posição.
Atira e depois se abaixa. Tornando a atirar e repetindo aquele movimento.
Espera um instante e faz fogo. Nota quando o cabra tomba e desaparece.
Lampião não
muda de lugar e, atirando feito um alucinado, dá, de quando em vez ordens aos
seus cabras incentivando-os a briga. Só saindo da linha de tiro na janela,
quando se faz necessário recarregar seu fuzil. De repente, ao recarregar sua
arma, ergue-se e sente uma dor horrível na altura do peito, do lado direto do
tórax. A força do projétil é imensa e o atira no chão da casa.
A bala vinda
do fuzil do soldado acerta o ‘batente’ da janela, perde um pouco sua
velocidade, desvia e atingi o “Rei dos Cangaceiros”.
Lampião está estendido no chão da casa sede da fazenda Tigre e seu irmão corre para tentar socorre-lo. O ferimento parece ser grave e Virgolino começa a perder bastante sangue. Nesse momento, aqueles que estavam dentro da casa se apavoram um pouco pensando seu chefe estar morrendo. O “Rei Vesgo”, devido a grande perda de sangue, começa a ficar pálido e perde os sentidos deixando mais apavorados ainda seu Estado Maior.
“(...) Se por
acaso Lampião morresse ali, Antônio sabia que tudo acabaria. Sem o comando, a
astúcia e a genialidade de Virgulino, além do seu conhecimento com os poderosos
Chefes Políticos e Coronéis do Sertão, seria o começo do fim (...).” (MC e CF,
2016)
Os homens
apressam-se a pegarem bastante panos e envolveram o corpo do chefe para que,
além de aquecê-lo, não permitisse que o sangue caísse no piso da casa deixando
a prova que alguém teria sido alvejado dentro dela.
Moita Braba
chega já atirando e o amigo de Lampião, Xandinho, mostra-se um combate
arrojado, conseguindo chegar a casa e entrar nela. Vai direto para onde
encontra-se seu amigo desmaiado e se agacha junto dele. Lampião vai recobrando
os sentidos e, já com seu cérebro em pleno funcionamento, pede ao amigo para
retira-lo daquela arapuca, principalmente por ele conhecer bem a região. Em
seguida, diz a seu irmão para tomar as rédeas do grupo, saltar para fora da
casa e apertasse o tiroteio até colocar a tropa em fuga. Para que ele pudesse
ser levado dali.
Desse momento
em diante a cangaceirama parece ter ingerido alguma droga, pois ficaram como
que alucinados e o fogo aumentou consideravelmente. Xandinho salta para fora de
casa e se mostra um dos mais valentes homens que esse sertão já pisou. Parecia
que ele iria topar sozinho toda tropa atacante. Por fim, sentido o desesperado
ataque dos homens de Lampião, os militares resolvem recuar. Lascam os pés no
meio da mata e somem na caatinga.
Lampião chama
a dona da fazenda e lhe faz um pedido. Que ela não comentasse com ninguém o
ferimento que sofrera, pois se assim procedesse, ele voltaria e mataria todos
que pudesse. Xandinho chega perto do amigo e pergunta para onde ele que ser
levado. Lampião diz querer ir para a fazenda Caraíbas, onde pretendia restabelecer-se.
Formando duas filas com os animais, os homens de Lampião o colocam-no no meio. Assim ele estaria protegido se algum ataque ocorresse e ninguém o veria naquelas condições. Xandinho leva o chefe mor do cangaço, o cangaceiro Lampião por entre os tabuleiros, serras e baixios do Pajeú das Flores... Até chegarem aos limites da fazenda pretendida.
Fonte “AS
CRUZES DO CANGAÇO – Os fatos e personagens de Floresta – PE” – SÁ, Marcos
Antônio de (Marcos De Marcos De Carmelita Carmelita) e FERRAZ, Cristiano Luiz
Feitosa (Cristiano Ferraz). 1ª Edição. Floresta, 2016
Foto Ob. Ct.
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