Por Geraldo Maia do Nascimento
Todos
os templos autênticos envolvem um simbolismo cósmico, um clima sagrado, uma
atmosfera mágica. E quando esse templo, além do papel religioso que ocupa,
envolve outros acontecimentos históricos, sua áurea mística se multiplica. Em
Mossoró temos um templo que se enquadra perfeitamente nesse conceito que é a
Igreja de São Vicente de Paula.
Igreja de São Vicente de Paula em Mossoró - redeglobo.globo.com
Esse
templo, que fica na Av. Alberto Maranhão, no centro de Mossoró, foi inaugurada
no dia 20 de julho de 1919, e vem prestando serviços religiosos até os dias
atuais. A ideia da sua construção surgiu no ano de 1915, no seio das confrarias
vicentinas, sendo a sua pedra fundamental lançada a 3 de outubro de 1915, com
ato oficiado pelo Padre Elesbão Gurgel. Dois fatos, no entanto, marcaram a
existência daquele templo: a seca e o cangaceirismo.
Raimundo Soares de Brito e Geraldo Maia do Nascimento
O início da construção da Igreja de São Vicente deu-se no ano de 1915, ano esse em que o nordeste brasileiro sofria com uma terrível seca. O historiador Raimundo Brito, em trabalho publicado sobre a Igreja de São Vicente diz que “os serviços da construção do templo serviram para amenizar o sofrimento das numerosas levas de retirantes que aqui chegavam tangidos pelo flagelo da grande estiagem”. Das mãos fracas de famintos retirantes surgiram os tijolos e a cal
que foram usados para erguer o templo. O dinheiro que ganhavam, apesar de
pouco, era o que amenizava a fome. O professor Almeida Barreto, em um dos
capítulos das suas memórias dizia: “Aquele templo é uma dádiva de suor, sangue
e lágrimas, dos retirantes, de 1915. Merece um poema à memória de um êxodo
forçado”. E o próprio professor Barreto faria esse poema, quando apelava:
“Mossoroenses, quando passardes diante da Igreja de São Vicente de Paula,
prestai o vosso culto, não só ao orago do templo, como aos seus construtores,
quase todos desaparecidos já, porém, ainda mais rendei o vosso preito àqueles
humildes grandes, que fabricaram, de graça, o material para o citado templo”.
Lampião em Limoeiro do Norte - cariricangaco.blogspot.com
Um
outro fato marcante é que em 13 de junho de 1927, quando a Cidade de Mossoró
foi atacada pelo bando de cangaceiros chefiados por Lampião, a Igreja de São
Vicente serviu como trincheira para os defensores da cidade, abrigando em sua
torre alguns defensores. As marcas do combate ainda podem ser vistas em suas
torres, preservadas que estão, para conhecimento da geração futura.
Igreja de São Vicente servindo como trincheira
A
resistência encontrada pelos facínoras fez com que os mesmos fugissem no que
ficou conhecida como sendo a primeira grande derrota de Lampião, derrota essa
que fez com que até o fim dos seus dias, não mais perturbasse a paz no Rio
Grande do Norte. Foi uma grande vitória do povo mossoroense, vitória essa que é
lembrada até os dias atuais, e que teve como comandante maior o prefeito
Rodolfo Fernandes. Daí porque muitos se referem a Igreja de São Vicente como
sendo a Igreja de Lampião, ou a “Igreja da bunda redonda”, por assim ter sido
chamada pelo chefe dos bandidos.
Lampião chamou esta igreja de bunda redonda - valdecyalves.blogspot.com
O
templo permanece até hoje com o mesmo estilo idealizado pelo arquiteto prático
Francisco Paulino. Quase nada mudou em sua arquitetura. Apenas o piso foi
trocado e o altar primitiva foi demolido, sabe Deus porque motivo.
Da
luta dos flagelados da seca de 1915 para erguer o templo, nada se comenta. Esse
fato a poeira do tempo apagou. Da importância da Igreja na defesa da cidade
contra os cangaceiros, sim. Esse episódio fez com que a Igreja se tornasse um
ponto turístico da Cidade de Mossoró. Sua imagem ficou associada a esse fato de
tal maneira, que não se fala em cangaceiros em Mossoró sem se referir a Igreja
de São Vicente. Por tudo isso é que a Igreja de São Vicente de Paula é
considerada um dos principais monumentos históricos da cidade de Santa Luzia de
Mossoró.
Geraldo Maia do Nascimento
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