Joel Reis
Mamede Paes Mendonça.
Em certa
madrugada, fomos visitados pelo Coronel Virgulino Ferreira, o “Lampião”! Seus
homens estavam famintos e pararam para comer na nossa padaria, pois viram que
estávamos funcionando lá dentro, com as luzes acesas. Comeram quase todo o
estoque, mas na hora de pagar, a prudência mandava não aceitarmos!
Lampião ainda insistiu, mas resolvemos não receber. Muito agradecido, foi nosso amigo até à morte, mas nunca soube que havia nos causado o maior problema de capital de giro de toda a história da firma. Ainda assim a padaria cresceu e compramos um armazém. A firma se chamava “Armazém e Padaria Sergipana”. (Mamede Paes Mendonça)
O EPISÓDIO
Numa daquelas
madrugadas, Ribeirópolis adormecida, os rapazes percebem um tropel inusitado.
Muitos cavaleiros vêm entrando na cidade e acabam parando na porta da padaria.
Mamede estranhou aquela multidão de fregueses chegando antes da hora normal.
Bateram forte
na porta. Era um jagunço enorme! Cara feia, faltando dentes e sobrando
cicatrizes. Pente de balas por todo lado, poeira por todo o corpo. E falou
grosso:
- Vosmicê é o dono da padaria?
Mamede balançou a cabeça, dizendo que sim.
- O Capitão Virgulino Ferreira taí fora querendo falar com vosmicê.
Mamede saiu sentindo frio e um pouco assustado. Aliás, devia estar, provavelmente, apavorado. O que será que Lampião ia querer com ele?
Alguma informação sobre a
cidade, ou sobre a polícia?
- Qual é a sua graça? perguntou Lampião, com certa gentileza.
- Mamede Paes Mendonça, sim senhor.
- Muito prazer. Sou o Capitão Virgulino Ferreira. Meus homens tão sem comer desde ontem e tou vendo que o moço tem aí uma padaria. O que se tem prá comer aí?
Mamede logo respondeu:
- Capitão, o pão já está saindo, mas tem umas bolachinhas aí para se comer enquanto espera.
- Isso demora muito?
- Não senhor. O senhor vai ver que é num instante!
Mal a jagunçada acabou de devorar o estoque de bolachas e Mamede já estava distribuindo o pão quente com manteiga. O clima já descontraído, Mamede fazendo piadinhas e brincadeiras, sob o olhar e sorriso condescendente do Capitão e com a alegre aprovação de todos os cangaceiros.
Barriga forrada, pessoal já montado, o Capitão perguntou:
- Quanto devo a vosmicê?
- A mim o Capitão não deve nada - disse Mamede – eu não vou cobrar de quem defende os fracos.
O Capitão sorriu lisonjeado e respondeu:
- Muito obrigado então, homem. Deus lhe proteja. Até mais ver!
Mamede, de pé, continuou acenando até o bando sumir na estrada. Depois caiu sentado e lá ficou, por muito tempo, pensando em como iria repor seu capital de giro. Mas é certo que Lampião não se esqueceu dele, e consta que sempre lhe teve em muito boa conta.
Mas a história
não acaba aí. Dizem que por volta de um mês depois, em outra madrugada,
Ribeirópolis ouviu outro tropel. De novo os cavaleiros se detiveram à porta da
padaria iluminada.
Mamede pensou:
é ele de volta; virou freguês.
Não era Lampião. Agora assomava à porta o Tenente Arlindo Leite, comandante de uma volante faminta, na pista do Capitão Virgulino. Repetiu-se todo o ritual, Tim-Tim por Tim-Tim. Na hora da conta, Mamede outra vez:
- A mim o Tenente não deve nada, que eu não vou cobrar de quem está arriscando a vida pela Pátria.
- No dia seguinte, Mamede se virava para comprar matéria prima no fiado. Seu irmão e sócio Euclides então lhe diz:
- Mamede, se essa briga de jagunços demorar de acabar, nós vamos é quebrar.
Ao que ele responde, entre conformado e otimista:
- Mas não se esqueça de que estamos fazendo amizades importantes!
DANTAS,
Raymundo Paiva. A história em depoimentos: Mamede Paes Mendonça. Salvador:
Press Color, 2015. p. 129-131.
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