Por Mario Alberto Peçanha
A tiros, baionetas e pauladas, os
bolcheviques deram fim à aristocracia mais antiga da Europa.
Naquela noite
fatídica de 17 de julho de 1918, a família real russa, os Romanov,
já havia caído na mais absoluta desgraça. Desde maio estavam presos na Casa
Ipatiev, em Yekaterimburgo. O local havia sido cercado por paliçadas altas e as
janelas cobertas por jornais e nunca abertas, para que não fossem vistos. Eram
vigiados o dia inteiro e tinham de tocar um sininho para avisar se fossem
ao banheiro.
Mais de uma vez, os guardas atiraram como aviso diante de desobediência.
Pouco depois
da meia-noite,
foram acordados pelos guardas, sob o pretexto de serem transferidos. Mas, no
lugar da rua, foram levados para o porão, eles e os servos, 11 pessoas no
total. Lá esperaram longos minutos até chegar o caminhão que levaria seus
corpos, que manteve seu motor ligado para ocultar o ruído.
Yakov
Yurovsky, chefe dos captores, leu então sua sentença:
"Nikolai
Alexandrovich, diante do fato que seus parentes continuam seu ataque contra a
Rússia Soviética, o Comitê Executivo de Ural decidiu executá-lo" [aprovado
e oficializado pelo Comitâ Central do Partido Comunista]
As últimas
palavras do último czar foram
um incrédulo "O quê?! O quê?!".
Quarto onde os
Romanov foram executados, na Casa Ipatiev / Crédito: Reprodução
Imediatamente,
o pelotão começou a atirar. Cada um tinha um nome de quem seria seu alvo,
inclusive as crianças, mas a coisa logo descendeu ao caos porque a fumaça das
armas tornou impossível ver qualquer coisa. A porta foi aberta e, quando a
fumaça baixou, perceberam que os cinco filhos - a mais velha, Olga, de 22
anos, e o mais jovem, Alexei, de 13 - ainda estavam vivos. A ordem foi
então matá-los com baionetas e o cabo dos fuzis. Quando isso não funcionou,
mais tiros foram disparados.
As lendas
Essa é a história
real. Mas os bolcheviques,
por razões bem compreensíveis, evitaram que ela fosse conhecida do público.
Inclusive espalharam boatos de que o resto da família
real, tirando o czar, estava viva. De certa forma, deve-se a eles os
rumores.
Anastásia,
filha predileta do czar
Nicolau, acabou se transformando em uma das lendas mais duradouras do
século 20. Tudo porque as mulheres da família Romanov resistiram aos primeiros
tiros disparados pelo pelotão de fuzilamento. Algum tempo depois da chacina,
testemunhas afirmaram ter visto a menina pedindo ajuda nos vilarejos próximos a
Yekaterimburgo. Um soldado da guarda Tcheca,
comovido ao perceber que a princesinha tinha sobrevivido, teria ajudado
Anastásia a fugir.
Maria, Olga,
Anastásia e Tatiana, prisoneiras em 1917 / Crédito: Reprodução
Nas décadas
seguintes, falsas Anastásias apareceram em toda a Europa e nos EUA,
reivindicando a fabulosa fortuna que a família real mantinha em bancos suíços.
O caso mais famoso é o de Anna Anderson. Em 1970, ela foi à Justiça alemã para
tentar estabelecer-se como legítima herdeira dos Romanov. O processo
arrastou-se por quase 15 anos, sem que ninguém chegasse a uma conclusão. Até
que, em 1994, testes de DNA provaram que Anna não tinha qualquer parentesco com
a realeza russa. Na verdade, ela era a polonesa Franziska Schanzkowska, uma
operária nascida na cidade de Pomerânia em 1896 e desaparecida desde 1920.
O segredo
Durante o
regime socialista na URSS,
ninguém se atreveu a investigar a morte dos Romanov. Ou melhor, quase ninguém.
Em 1979, dois curiosos historiadores-amadores russos – os amigos Alexander
Avdonin e Gueli Riabov – encontraram sinais de uma cova suspeita nos arredores
da Casa Ipatiev. Escavaram o local e retiraram de lá cinco ossadas que pareciam
ser de integrantes da família real.
Temerosos de
que a descoberta fizesse a ira do Estado
soviético cair sobre suas cabeças, eles recolocaram os ossos no lugar.
Com o fim da URSS, as ossadas foram novamente exumadas e submetidas a testes de
DNA, que comprovaram: aqueles eram mesmo os restos mortais do czar Nicolau II,
da imperatriz Alexandra e das filhas Olga, Tatiana e
Anastásia.
No dia 17 de
julho de 1998 – exatos 80 anos depois de terem sido executados –, os Romanov
foram levados para a cidade de São Petersburgo e sepultados na cripta da
Catedral de São Pedro e São Paulo. Dois anos mais tarde, seriam canonizados
pela Igreja Ortodoxa Russa.
Em julho de
2007, um grupo amador de estudiosos de história anunciou ter encontrado as duas
ossadas que faltavam: a do garoto Alexei e a de sua irmã Marie. Arqueólogos
russos confirmaram a veracidade da descoberta.
Em 2000,
começou a ser feita a Igreja de Todos os Santos, sobre o local original da Casa
Ipatiev.
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