O casamento entre primos foi e é tabu em boa parte do mundo ocidental.
Mas não no Brasil. Aqui, segundo o Artigo 1.521 do Código Civil, é proibido o casamento entre parentes colaterais até o terceiro grau – tio(a) e sobrinha(o) -, mas os chamados primos-primeiros são parentes em quarto grau. As culturas onde se aceita o casamento entre primos defendem os seus benefícios sociais e econômicos, tais como o fortalecimento dos laços familiares, a manutenção da riqueza na família ou o amparo em quadro de miséria.
Maria Bonita um caso entre muitos no cangaço, de casamento entre primos
Citemos o caso de Maria Gomes de Oliveira, a Maria Déa, Maria do Capitão, ou Maria Bonita como ficou mundialmente conhecida, nasceu na Bahia em 1911 numa família numerosa de homens e mulheres: Ananias, Oséias, José, Isaías, Arlindo; e mais Benedita, Antônia, Dorzinha, Chiquinha, Nana, Dondon e Deusinha.
Maria de Déa seguiu uma tradição social sertaneja de amor perigoso: casou com um primo chamado José Miguel da Silva, mais conhecido como Zé de Neném. Sapateiro de profissão, mais velho e com condições de sustentar uma família. Sua irmã, Dondon, fez o mesmo, casou com um tal de Cícero, também sapateiro e irmão de Zé de Neném.
As longas distâncias entre um lugar e outro, as dificuldades de locomoção e de sociabilidade, afinidades emotivas levavam à prática da endogamia recorrente nas relações conjugais, inclusive no cangaço.
Também há relatos que indicam mais sobre as inquietações da baianinha que viria ser a “Rainha do Cangaço”. Contam que, mesmo casada, Maria de Déa teve aventuras extraconjugais. O escritor Alcino Costa atribui à Maria Bonita um caso com comerciante de tecido de Santa Brígida.
“Um romance sigiloso, com o tal comerciante de nome João Maria, tão sigiloso que ainda hoje é negado pelos seus familiares”. Este suposto romance extraconjugal não é mencionado por nenhum outro escritor.
Sargento Exército José Mutti foi chefe de volante e casou com uma irmã de Maria Déa
O sargento do exército José Mutti, chefe de volante na Bahia, conheceu biblicamente Antônia Gomes, irmã de Maria Déa e com ela viveu e teve um filho que fez carreira nas Forças Armas. Mutti narra que conheceu Antônia através de Zé de Neném, que era festeiro, espécie de rufião nos bailes organizados por ele na Malhada da Caiçara.
Já descasada, como Maria de Déa conheceu Virgulino?
Há versões para todos os gostos e em prosa e verso. Mas segundo Oséias, seu irmão, Lampião frequentava sua casa. E o casal dançou e namorou, antes de Maria Déa tomar a decisão de seguir o novo amor, e nem a futura “rainha do Cangaço” entrou para a aventura bandoleira automaticamente.
Conta-se que entre 1929 até 1932, já convivendo com Lampião, permaneceu Maria em casas de coiteiros, familiares ou fazendeiros.
Por conta da Revolução de 1930, a repressão ao cangaço arrefeceu, as forças policiais estavam focadas no Litoral e Lampião aproveitou a oportunidade para adotar a própria mulher no bando e, por conseguinte, determinou que cangaceiros casados podiam trazer as mulheres o bando.
Maria Bonita e a presença feminina no cangaço causaram impacto. O primeiro deles: a maternidade. No primeiro casamento, devido à infertilidade de Zé de Neném, ter filhos estava fora de questão.
Relatam que Maria Bonita engravidou quatro vezes, mas só uma filha nasceu e que recebeu o nome Expedita. O parto foi assistido por uma senhora de nome dona Rosinha, e é atribuída a essa parturiente o fato de a criança ter sobrevivido, pois nos outros três partos não houve assistência alguma.
Maria Bonita não tinha bacia, diziam.
Maria Bonita foi descrita pelo Diário de Pernambuco como “Madame Pompadour” do Cangaço, uma definição de Benjamin Abraão. Na edição de 30 de julho de 1938, sobre os acontecimentos em Angico, inclui um parágrafo sobre Maria de Déa, que diz:
“Maria Bonita amava Lampião doidamente. Nunca o abandonava quando no combate. Com ele viveu, com ele morreu”.
Por fim, o relato do soldado José Panta de Godoy, da volante do aspirante Francisco Ferreira de Melo e que foi o carrasco de Maria Bonita. Diz ele:
- “Aí eu atirei nas costas dela e ela caiu; no que ela caiu, ela levantou-se; eu dei outro tiro na barriga dela, assim por trás, ela caiu e não levantou mais. O soldado Santo cortou a cabeça de Lampião, e depois me emprestou o facão para mim cortar a cabeça de Maria Bonita. Nisso nóis fiquemos levantando a saia dela com a boca do fuzil, pra vê a caçola que era incarnada”.
Como Lampião terminou seus dias todo mundo sabe. Mas como viveu e morreu Zé de Neném?
Zé de Neném, casado com Maria Bonita: organizador de bailes, casou depois com uma prima de Maria
O pouco que se sabe, Zé de Neném nunca sofreu assédio da polícia pelo fato de ter sido o ex-marido da “rainha do cangaço”; ele, que nunca chegou sequer a conhecer Lampião – arranjou outra mulher com quem casou: uma prima da própria Maria Déa, também frequentadora dos bailes organizados por ele. .
Relatam que deixou tudo para trás, casou novamente e reconstruiu sua vida; jamais deu entrevistas; migrou para São Paulo onde fez fortuna e virou industrial do ramo de calçados.
Fotos. Benjamim Abrão e de domínio público
Uma abordagem baseada em:
“Os Últimos Dias de Lampião e Maria Bonita”, de Victória Shorr.
Fonte: “Lampião Além da Versão, Mentiras e Mistérios de Angicos”, de Alcino Alves da Costa.
“Maria Bonita – Entre o Punhal e o Afeto”, de Nadja Claudino.
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