Por: Rangel Alves da Costa*
ZABÉ
CANGACEIRA
Ainda falta
muito de tudo que já contaram, pois veja só que estripulia de estória é essa
que me asseveraram ter acontecido lá pelas bandas do sertão mais distante. Mas
vou contar como sei, como quero contar.
Verdade é que
o cangaço sempre despertou interesse no sertanejo, seja pela intrepidez do
bando de Lampião, seja pelas façanhas contadas de boca em boca, num irrealismo
tamanho que parecia coisa do outro mundo. Daí ser também verdade que o sonho de
muitos era ser cangaceiro, espalhar sangue e revolta pelos sertões, lutar pelo
que nem sabiam.
Mas Zabé foi
cangaceira, ganhou fama de justiceira do sertão, de mulher audaciosa e
destemida, sem jamais ter colocado um pé nas entranhas da mata nem dormido por
cima de espinho e debaixo do luarar. Depois seguiu a vida bandoleira, é
verdade, mas primeiro teve que fazer sozinha sua fama de valentona e
arrelienta.
Coisa de se
estranhar, mas a verdade é que de repente a mulher, ainda jovem e graciosa
igual a flor de mandacaru, e largada do marido por conta própria - por não
suportar traição segundo ela - começou a ser chamada de Lampioa, cangaceira,
bandoleira, muié home. Ela não gostava de nada disso, mas engolia a seco para
manter uma postura ainda maior de propósitos.
E tudo começou
quando ela descobriu que seu marido andava lhe traindo com uma e com outra, num
descaramento de não acabar mais. O que acabou foi o casamento, pois ela juntou
tudo do safado num saco e jogou na porta da rua. Ele quis reclamar, achar ruim,
se defender, mas teve que sair com o rabinho entre as pernas e uma velha
espingarda na sua mira.
A valentia da
mulher despertou a atenção de outras mulheres, igualmente vítimas das safadezas
e traições de seus maridos. E em romaria seguiam até a casa de Zabé para pedir
ajuda sobre uma desfeita, uma danação do esposo ou coisa parecida. Então, a
cada visita, Zabé perguntava a cada uma se tinha coragem de formar uma frente
de batalha para expulsar do lugar todo homem galinha e toda mulher casada que
abria as pernas pra outro cabra. Vixe Maria, a danação tava feita!
Com a geral
aceitação, o grupo foi formado e a líder começou a planejar as ações,
verdadeiras estratégias de guerrilha. Cataram trabuco, espingarda velha,
garruncha, baleadeira, pedaço de pau, taca de couro cru e o escambau e se
preparam para agir, para o enfrentamento. E o que se viu depois foi um
deus-nos-acuda no lugarejo e sertão adentro, com cabra a correr de perder o
chinelo, mulher safada desandar no mundo com pouca roupa, muitas vezes só a
parte de baixo.
Uma zinha viu
que não tinha jeito e se danou a correr, a gritar e a chorar, nuazinha como
veio ao mundo. Mas que coisa mais feia, pois quanto mais corria mais aquela
pelanquice parecia querer se desprender e se desfazer pelo ar. Já outra,
vaidosa demais e faceira de fazer inveja, preferiu ser expulsa do lugar
mansamente, parecendo que caminhava numa passarela, ainda que tomando lapada na
bunda e varada nos quadris.
Não demorou e
o bando de Zabé, agora chamada em bom som de Zabé Cangaceira se deu por
satisfeito. Porém quando a valentona resolveu dar outro destino à vida tudo
voltou ao normal, se não ficou ainda pior.
Muitas
daquelas que expulsaram seus maridos a varadas deram pra quengar de tal forma
que o lugar parecia um cabaré. Tentavam justificar a sem-vergonhice afirmando a
falta de homem, vez que não deveriam ter expulsado seu safadinhos daquele
jeito. E na falta deles só outros, ainda que casados.
Mas Zabé não
estava mais por lá para fazer nada, mudar aquela situação vergonhosa, aquela
putaria toda. A danada já fazia parte do bando de Lampião, convidada que havia
sido pelo próprio Capitão. E o pior que lá se engraçou pelo líder e assim que
Maria Bonita percebeu a chegança, deu-lhe uma surra de cansanção junto com
garrancho de catingueira que até hoje a ex-valentona se coça no oco do mundo.
Poeta e
cronista
e-mail:
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