Por: Valdir Julião repórter
Fonte: http://ocomunicador10.blogspot.com/
Em lombo de
cavalo, de jumento ou a pé, a incursão do bando do capitão Virgulino Ferreira
da Silva, o Lampião, pelo Rio Grande do Norte, na segunda década do século XX,
durou apenas três dias: tempo suficiente para virar lenda e se perpetuar no
imaginário popular dos potiguares, além de se converter no anti-herói de
Mossoró, que era o principal alvo da cobiça dos cangaceiros por ser, como é
ainda hoje, o município polo e mais rico da região Oeste.
A Gruta da
Carrapateira, em Felipe Guerra, foi uma das três grutas que abrigaram os
fugitivos do bando de Lampião, expulsos de Mossoró. Oito décadas depois e por
conta da argúcia e curiosidade de dois espeleólogos (estudiosos das cavernas)
esse percurso de Lampião foi refeito ao longo de 90 dias. Entre idas e vindas,
o técnico em turismo
Rostand Medeiros e o advogado Sólon Almeida Netto
revezaram-se em seguir uma trilha de 500 quilômetros entre o município de Luís
Gomes, por onde o bando de cangaceiros entrou no Estado, e Mossoró, última cidade
escolhida para encerrar a onda de saques em território potiguar.
"Nessa
época, em junho de 1927, só existiam sete municípios na região", diz o
pesquisador Rostand Medeiros, que ao invés de cavalos, usou o "lombo"
de motos para refazer a cavalgada de Lampião pelo sertão do Rio Grande do
Norte.
Rostand
Medeiros explicou que a ideia de se percorrer os rastros de Lampião e seu
bando, surgiu depois de descobrir e ouvir de algumas pessoas - "filhos e
netos de moradores da região que viveram naquela época" -, relatos
sobres as escaramuças dos cangaceiros, como roubos, saques, pilhagem,
raptos, seqüestros e violência cometida contra as pessoas e fazendas que
vinham encontrado pela frente.
Medeiros diz
que, com seu companheiro Sólon Almeida Netto fizeram dois trabalhos, um que
resultou numa pesquisa sobre 83 cavernas da região Oeste e o segundo, um
relatório de 300 páginas, que chamou de "Nas pegadas de Lampião".
Nesse segundo
trabalho, segundo Medeiros, existem relatos de pessoas, cujos ascendentes
fugiram de suas casas e se esconderam em cavernas para escapar dos cangaceiros:
"Nós percorremos quinze cavernas, mas descobrimos que só três cavernas
serviram de esconderijo, duas em Felipe Guerra e uma em Baraúna, que na época
pertencia a Mossoró".
O
espeleologista Rostand Medeiros disse que, ele e seu amigo, tentaram percorrer,
ao máximo, os mesmos trechos onde passaram Lampião e seu bando, contando com
informações orais, principalmente, das pessoas mais velhas dos municípios
originalmente percorridos pelos cangaceiros: Luís Gomes, Martins, Pau dos
Ferros, Apodi, Caraúbas e Pau dos Ferros.
Com o tempo,
explicou ele, houve desmembramento territorial e criação de outros municípios,
por isso, a trilha de Lampião foi percorrida em 18 municípios.
Por onde
Rostand e Almeida Netto andavam, iam descobrindo coisas e vestígios sobre o
período e a passagem de Lampião pela região Oeste. "Nossa proposta foi
conhecer e percorrer o caminho o mais próximo da realidade dos fatos que
ocorreram", sintetizou o pesquisador, cujo trabalho e de seu companheiro,
despertou o interesse em transformar o episódio numa forma de induzir e
desenvolver negócios na área de turismo na região. "É o que estão chamando
de culturalização da economia", completou.
Missa do
Soldado é um dos marcos da passagem de Lampião pelo RN
Para refazer o
mesmo roteiro da passagem de Lampião no Rio Grande do Norte, entre os dias 10 e
13 de junho de 1927, o pesquisador Rostand Medeiros se baseou em pelo
menos três livros publicados sobre o cangaço, de autoria dos escritores Raul
Fernandes, Raimundo Nonato e Sérgio Dantas. "Cada um tem o seu foco, a sua
importância", afirmou ele.
Mas Rostand
Medeiros não dispensou "a oralidade" das pessoas que foi encontrando,
nem os "casos e causos" que lhe foram contando. Ele disse que
descobriu algumas coisas inéditas, como a realização da chamada "Missa do
Soldado", que é celebrada em homenagem ao policial José Monteiro de Matos,
morto em combate contra os cangaceiros de Lampião, no confronto que foi chamado
pela população de "Fogo da Caiçara".
Segundo
Rostand, as tropas da Polícia do Rio Grande do Norte enfrentaram os cangaceiros
na localidade denominada Junco, hoje situada a cinco quilômetros do
município de Marcelino Vieira, no Alto Oeste. No decorrer do combate, às
vésperas da invasão a Mossoró, segundo relatos, os soldados foram recuando,
enquanto o soldado Monteiro ficou no local e teria dito o seguinte:
"Morro, mas não corro".
Por conta
disso, a "Missa do Soldado" é realizada, anualmente, a cada 13 de
junho, na Dia de Santo Antonio, na capela homônima. "O povo mantém a
tradição", disse Rostand. Próximo ao açude da Caiçara também foi
construído um monumento em homenagem ao soldado morto em combate com os
cangaceiros.
O
pesquisador conta que descobriu, no município de Luís Gomes (Alto Oeste),
a casa que pertenceu ao pai do cangaceiro Massilon Leite, que foi o
guia de Lampião para adentrar no RN, inclusive prestando informações sobre
Mossoró, a qual Lampião decidiu atacar.
Deste
município potiguar, que faz divisa com a Paraíba, o capitão Virgulino iniciou
suas escaramuças pelo RN, que terminou com o ataque e sua retirada em Mossoró,
em virtude da resistência comandada pelo então prefeito Rodolfo Fernandes. Aos 92 anos,
dona Leonila fala de Lampião.
Entre os
municípios de Felipe Guerra e Caraúbas está situada, na fazenda Santana, uma
das duas grutas
das redondezas que serviram de esconderijo para os fugitivos do bando do
capitão Virgulino Ferreira da Silva.
Nessa gruta,
denominada "Tapia de Zé Félix", escondeu-se em 12 de junho de 1927,
dona Leonila Tomé de Souza Barra. Hoje, aos 92 anos, falou de suas lembranças
aos pesquisadores Rostand Medeiros e Solón Almeida Netto.
Os
pesquisadores localizaram dona Leonila Barra em 12 de setembro de 2009. Através
de suas lembranças, pois ela tinha dez anos quando ocorreu a fuga da família
comandada por sua mãe, souberam que a matriarca Tionila Nogueira Barra e os
moradores buscaram refúgio na fazenda Passagem Funda, a cerca de três
quilômetros de sua propriedade, onde se abrigaram por quase 30 dias nessa
gruta.
Segundo os
pesquisadores, Leonila Barra recordou que em meio à notícia da aproximação do
bando de Lampião e a todo o tumulto que tomou conta da região, estava com
algumas de suas nove irmãs no casarão do Mato Verde debulhando vargens de
feijão, quando um portador trouxe a notícia da aproximação do bando.
"Na sua
ingenuidade infantil, ela não acreditou na história do mensageiro. Diante dos
fatos, sua mãe parte para juntar tudo que pudessem carregar e se esconderem,
mas devido à chegada da noite, decidem dormir na fazenda", historiou
Medeiros.
"Quem
atualmente visita o local, o encontra preservado tal como era naqueles
estranhos dias de junho de 1927", diz o relatório dos dois espeleólogos.
Fonte: Tribuna do Norte
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