A partir de Maria Bonita, há registros de quase duzentas mulheres que passaram pelo cangaço. Mesmo vivendo um cotidiano fora dos padrões da época, uma vez que as mulheres do cangaço não eram responsáveis pelas atividades domésticas, por exemplo, elas ainda estavam presas a uma dinâmica centrada num universo preconceituoso e dominado pelo homem. A própria justificativa da presença feminina no movimento era um exemplo disso: ela eram as companheiras dos cangaceiros.
Para poder ingressar no bando, as mulheres tinham que ser casadas (ou roubadas) com algum cangaceiro. Não houve registro histórico de nenhuma que tivesse entrado no movimento por simpatia à causa, desejo de vingança ou qualquer outro motivo que não um casamento. Todas foram levadas por um companheiro fixo - cada um era responsável por sua esposa.
Para o pesquisador João de Souza Lima, a principal função das mulheres no cangaço era a de cuidar dos companheiros. No entanto elas também podem ser interpretadas como um ornamento deles – afinal, andavam com roupas enfeitadas, cobertas com perfumes e jóias em ouro: “A mulher era um enfeite, um símbolo sexual. E cada cangaceiro queria ter a mulher mais bonita, mais enfeitada”, explica o estudioso.
Uma vez enxergadas como pertences de seus companheiros, a vida e a morte destas mulheres também ficava sob o domínio dos maridos. A infidelidade delas, por exemplo, era punida com a morte.
Caso da cangaceira Lídia, considerada uma das mulheres mais belas do cangaço. Ela ingressou no bando aos 18 anos, casada com o cangaceiro Zé Baiano. Ao ser descoberta que traía o marido com o companheiro de bando Bem Te Vi, Lídia foi torturada e morta a pauladas. Outra vítima da violência foi a cangaceira Lili, casada com o cangaceiro Moita Brava. Ele não perdoou o flerte entre a esposa e o colega de bando Pó Corante, e assassinou Lili com seis tiros à queima roupa, no meio do acampamento.
Nos casos acima, apenas as mulheres foram julgadas e punidas com a morte. Porém a postura era bem diferente quando a traição acontecia de maneira inversa. Como ocorreu com a cangaceira Antônia, que abandonou o grupo após descobrir que o marido, o cangaceiro Gato, havia trocado-a por outra. Antônia ainda reclamou e reivindicou, mas o que prevaleceu foi a vontade do cangaceiro.
A ex-cangaceira Aristéia Soares, (já falecida) também foi devolvida para a família a pedido do companheiro. Ela passou oito meses casada com o cangaceiro Catingueira, morto num confronto entre o bando e as volantes do governo. Gravemente ferido, Catingueira orientou os companheiros que encaminhassem Aristéia, que estava com a gravidez avançada, de volta à casa dos pais. E assim foi feito. Mais uma vez, a vontade do companheiro determinou o destino da mulher.
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