Por: Josafá Inácio
Convite
Honroso
Recebi do professor Xavier Gondim o honroso convite para escrever um depoimento
sobre o conterrâneo Dr. Antonio Rodrigues de Carvalho, falecido a 03 de
dezembro do corrente ano, aos 82 anos de idade. Caindo a tarefa sobre mim,
muito me enobrece desempenhá-la, pois tive contatos importantes com Antonio
Rodrigues, alguns no início de minha vida profissional e outros no período de
nossa aposentadoria. No intermeio nos encontrávamos pouco. Ele ocupado nas suas
funções e eu nas minhas.
A história de Antonio Rodrigues é daquelas que dão novelas e filmes. Não foi uma história comum às demais pessoas, não.
A história de Antonio Rodrigues é daquelas que dão novelas e filmes. Não foi uma história comum às demais pessoas, não.
Uma Caminhada Diferente
Ter nascido no Sítio Capim Grosso, a 13 de junho de l927, quando Upanema nem
era ainda vila, mas estava apenas na condição de simples povoado, tudo indicava
que o caminho do Toinho era o roçado, para plantar milho, feijão e batata; ou
era a várzea do rio, para amassar o barro, bater tijolo e queimar caieiras; ou
era, ainda, o carnaubal, para cortar palhas e sacudir o pó. Era o que fazia seu
pai, o trabalhador braçal Luiz Rodrigues de Carvalho, conhecido por Lucas Sebo,
casado com Cosma Martiniano de Carvalho.
O sobrenome Carvalho destes Rodrigues não é o mesmo dos Carvalhos do Sítio
Umari, não. A saída dos filhos de Seu Lucas, ainda na infância, e a separação
da terrinha por longo tempo, dificulta um melhor esclarecimento de suas
origens. Mesmo assim podemos apontar a família Ferreira de Aquino, os chamados
Bacurinhos (e ainda Bacurins), como parentes dos Rodrigues de Carvalho.
Antonio Rodrigues de Carvalho
Voltemos a Antonio Rodrigues, que saiu de Upanema com sete anos de idade, pelo desejo de duas irmãs suas que já estavam vivendo em Mossoró. Tropeiros fizeram o favor de levar Toinho no lombo de um jumento. Sair de Upanema era se desviar dos caminhos percorridos por todos de sua época: o roçado, a várzea e o carnaubal. Mas suas irmãs não eram folgadas não. As atividades desenvolvidas por elas em Mossoró eram aquelas de empregadas domésticas. Ainda em Upanema, Toinho aprendera as primeiras letras com a sua irmã Francisca Rodrigues, mais conhecida por Chicuta.
O Início dos Estudos
O menino Toinho frequentava escola em Mossoró, iniciando o Primário com sete
anos de idade. Corria o ano de 1934. Concluinte deste curso, e garoto com dez
anos, angariou a simpatia do vereador mossoroense João Manoel, que o adotou
como afilhado. O vereador já era amigo de suas irmãs.
Depois do curso primário, o estudo devia ser pago. Na década de 1930 não havia
escola pública que oferecesse o curso ginasial (hoje ensino fundamental maior).
Só o Ginásio Diocesano Santa Luzia (depois Colégio) oferecia o curso. Mas o
garoto conseguiu por carta uma bolsa de estudo do então Governador do Estado
Rafael Fernandes.
Rafael Fernandes
Aluno, Professor e Deputado
Adiantar-se no estudo implicava em sair para Natal, pois Mossoró não tinha o curso médio (o clássico, o científico ou o magistério). Fez o Clássico no Colégio Estadual Ateneu, onde também foi professor. Morava na Casa do Estudante, revelando-se líder entre os colegas. Ser conversador, ter sensibilidade às causas estudantis, transpirar ideais políticos e falar bem, foram as credenciais para chegar à política. Assim é que apareceu o convite para completar a chapa para deputado estadual. Em 1948, aos vinte e um anos de idade, ele chegou à Assembléia Legislativa.
O estudo continuava sendo um sonho permanente. Sua boa oratória o levou ao curso de Direito. Não havendo esse curso em Natal se deslocava periodicamente para Maceió-AL. Ser estudante em terra alagoana, e em Natal desempenhar as funções de professor e deputado era a confirmação de uma história singular.
Deputado, Prefeito e Médico
Reelegeu-se deputado em 1952. Foi quando Upanema pode contar com os seus
préstimos. Ainda Vila, pertencente a Campo Grande, Upanema vivia um momento
político favorável à sua emancipação. A Câmara de Vereadores de Campo Grande
tinha como Presidente o nosso conterrâneo Vicente de Paula Rocha (Vicente
Rocha), que propôs aos seus pares a emancipação de Upanema. Proposta aceita por
todos os vereadores e Decreto assinado por Vicente Rocha. Mas o Decreto devia
receber a sanção da Assembléia Legislativa e se transformar em Lei. O deputado
conterrâneo abraçou a causa, fez a devida justificativa perante os seus pares,
e Upanema foi desmembrado de Campo Grande, tornando-se Município pela Lei de N
874, de 16/09/1953.
Antonio Rodrigues foi ao terceiro mandato de deputado. O passo seguinte foi chegar à prefeitura de Mossoró, em 1958, ainda com 31 anos de idade. Volta à Assembléia, em 1966, de onde sai mais uma vez, para enfrentar, em l968, a mais emocionante e equilibrada eleição já vista em Mossoró. Seu opositor era o Dr. Vingt-un Rosado, que no embate era chamado de “Touro” e ele de “Capim”. Saiu vitorioso, com maioria de 98 votos.
Vingt-un Rosado
Largou a política no final deste mandato (1973) para se formar em medicina. Formou-se com a idade passando dos 50 anos. Sua atuação como clínico geral perdurou até às vésperas do seu falecimento.
Encontro de Conterrâneos
Devo me envolver, agora, nesta história de Antonio Rodrigues, com muita honra.
Chegava eu em Mossoró, em l969, para começar uma nova etapa de minha vida. No
mesmo ano, assumi um trabalho social no Bairro Alto do Xerém. A primeira etapa
do trabalho previa a construção de um chafariz. A comunidade, devidamente
conscientizada, se responsabilizaria pela mão de obra voluntária, e as outras
despesas seriam assumidas pelo poder público. Levei o projeto para o prefeito
Antonio Rodrigues que o apreciou e fez a seguinte observação: “Josafá, ontem
recebi vários pedidos de vereadores, sendo um deles também para construção de um
chafariz. Minhas respostas foram negativas. Diante do seu projeto, porém,
sinto-me motivado e obrigado a atender”.
Uma semana depois da aprovação do projeto, fui convocado pelo prefeito para uma reunião no seu gabinete. Estava eu com poucos meses na minha nova etapa de vida. Saía de um internato vivido em alguns seminários, durante treze anos, sem nenhuma experiência no serviço público. E recebi o convite para assumir a Secretaria de Administração ou a recém criada Secretaria de Planejamento. Não sabia eu que um simples projeto, o primeiro que fiz, fosse motivo para chegar a uma secretaria da Prefeitura de Mossoró. E não sabendo disso, mas sabendo que ia comandar chefes de departamentos, com idade variando entre 40 e 50 anos de idade, enquanto estava eu com 27, temi assumir a tarefa, cuja responsabilidade não seria correspondida pela minha inexperiência, assim pensava eu naquela época. Só depois, aos 35 anos entrei na Prefeitura, como Secretário de Administração.
O Desejo de Voltar à Terra Natal
O que destaco em Antonio Rodrigues, indo além do que muitos falaram e
escreveram sobre ele, são os três envolvimentos que ele teve com Upanema.
Aquele, de 1952 para 1953, relativo à emancipação política; o convite que me
fez, também na lembrança de Upanema, assim me disse ele; e o terceiro
envolvimento, ainda comigo, se deu há apenas dois anos, já na nossa
aposentadoria. Nossos encontros se davam na Praça da Catedral de Santa Luzia,
na calçada da Rádio Rural ou no Banco do Brasil. Foi maravilhoso ouvir dele o
desejo de voltar para Upanema, na altura dos seus 80 anos. Comprar uma faixa de
terra no Capim Grosso, e ali erigir uma capela, um posto de saúde e uma escola,
era o último sonho do advogado, do deputado, do prefeito e do médico Antonio
Rodrigues de Carvalho.
Complemento Indispensável
Este parágrafo e o seguinte trazem um complemento indispensável para esta
história. Pouco foi dito sobre suas irmãs, nada sobre seu irmão, sua esposa e
seus filhos. Antonio Rodrigues, ainda não era rapaz feito, quando repetiu o gesto
de suas irmãs, de voltar a Upanema para trazer o irmão que tinha ficado aqui.
Cresceram juntos, sofreram juntos e venceram juntos. As irmãs, Luiza e Romana,
estavam no apoio apertado, e aquele vereador, o Sr. João Manoel teve
participação importante. O irmão, Francisco Rodrigues de Carvalho, formou-se em
medicina (Dr. Chico Rodrigues), e agora goza a aposentadoria. Portanto, o amor
fraterno não faltou.
Não poderia faltar também aquele amor, que do abraço quente nascem filhos. Namorou 10 anos com a mesma moça. Em 1956, na Igreja de Nossa senhora do Perpétuo Socorro, Antonio prometeu viver até morrer com a mossoroense Maria Augusta Filgueira, mulher de fé e de caridade. A humildade e a simplicidade são outras virtudes da esposa. O que importava para ela era o crescimento do marido. A propósito alguém disse: “Atrás de um grande homem existe uma grande mulher”. Antonio Rodrigues deixou, por morte, além da mulher, a filha Nairma Filgueira de Carvalho, formada em psicologia, viúva que deu um neto aos pais. Maranto Filgueira Rodrigues de Carvalho, casado, deu dois netos, e é promotor de justiça.
Figura Ímpar e Exemplar
Este depoimento se confundiu com a própria história de Antonio Rodrigues. A história enriquece o depoimento, e este não pode alterar nada da história. Ser este trabalho menos depoimento do que história, é se comportar como tal. Contudo, não deixei de depor a favor do personagem central da história, e espero, com o depoimento, ter realçado a figura ímpar e exemplar do Dr. Antonio Rodrigues de Carvalho.
Texto do professor Josafá Inácio publicado na edição 68 do Jornal de Upanema
http://upanema.blogspot.com.br/2010/01/depoimento-sobre-o-dr-antonio-rodrigues.html
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