Por Jerdivan
Nóbrega de Araújo
As ondas do
Rio Piancó chicoteando as pedras ali na panela, Araçá ou na Oiticica de Ana.
Uma criança que grita de alegria ao pescar uma piaba. O cheiro gotoso de
Arrubacão em uma panela de barro e a garrafa de Pitu que era passada de mão em
mão. E depois o silêncio... O resto era o silêncio... O silêncio que se fazia
para ouvir os acordes harmoniosos do bandolim de Bideca.
Não se pode falar em Bideca e não se lembrar do rio Piancó, de Biró de Onofre,
Vicente Candeia, Negro Panela, Negro Adelson, Tuzinho, Pedoca e de muitos
outros que emprestaram suas vozes desafinadas ao afinadíssimo bandolim do
Bideca. Naquele tempo nós éramos "alegres como um rio, um bicho, um bando
de pardais como um galo quando havia galos noites e quintais”.
As manhãs de domingos a beira do rio tinham uma trilha sonora como se fora uma matinê no Cine Lux. Estivéssemos onde estivéssemos o vento fazia questão de levar aos nossos ouvidos o som das cordas dedilhadas pelo maestro: o vento era seu maior fã.
Bedeca fora sinônimo de música boa, de alegria e de boas conversas. Mesmo
quando se mudou para João Pessoa, a sua casa foi a extensão da beira do rio,
com os mesmo amigos de outrora lhes cobrando um bom solo das suas cordas.
Ali frequentavam os mesmos saudosos amigos, já envelhecidos ou expostos em memoriais como fotografias amareladas e desgastada pelo cruel e imperdoável tempo em busca de reviver sua juventude nos braços daquele violão que tantos corações acalentou nas noites e madrugadas frias de Pombal.
Vicente Candeia costumava falar de Bideca como que se referisse ao gênio
clássico, o maior entre os maiores. Contava histórias do tempo deles rapazes
nas ruas de Pombal; das serenatas encomendadas a janela da amada como se ainda
fosse possível hoje ser assim.
As tardes de domingo em Pombal hoje são tão diferentes. Não tem mais o Jeeps e Rurais Cruzando as ruas, levando a noiva à delegacia para selar o casamento; não tem mais "padoriel" e seus sermões engraçados; e os jovens de hoje sequer sabem quem foi Bideca. Nem um registro em mídia deve ter ficado.
A Pombal de hoje é uma cidade pobre, banhada por um rio assoreado, poluído e lutando numa crise de identidade entre saber se se trata apenas de um esgoto, um riacho ou de um simples sangradouro. Os domingos são tristes reclamam a volta da rapaziada que vinha dos Arrubacões a beira do rio; reclamam sirenes de fábricas anunciando "onze horas”, reclamam um vesperal e uma matinê no Cine Lux e uma Ave Maria num final de tarde nas Difusoras do Lord Amplificador.
Para Pombal o silêncio do bandolim de Bideca já se havia feito há muitos anos, existindo apenas na memória indelével e inextinguível de pessoas como Dona Cessar que escreveu:
" Bideca era um cidadão de caráter espirituoso, gênio da música, maestro que executava mais de sete instrumentos de corda, compositor de sambas e chorinhos, brilhante intérprete da música, talentoso anedotista e brincalhão nas horas de lazer".
Nessas palavras sábias da nossa eterna professora para sempre existirá o nosso Bideca.
Outro dia, isso tem uns seis anos, eu encontrei com Bideca e ele me agradeceu por ter se lembrado dele em uns textos e poesias da minha lavra.
― “Não fui tudo isso que você escreveu a meu respeito, mas, de qualquer forma, obrigado!”.
E eu respondi:
― Não sou ninguém para escrever sob você, mas, de qualquer forma obrigado, pelas vezes que parei para ouvir as melodias vinda destes dedos mágicos. “Naquele tempo tudo era mesmo divino tudo era maravilhoso, mas... tudo muda e com toda razão.”
O que pouca gente sabe e que entre os fãs tínhamos ninguém menos do que o cantor Nelson Gonçalves, para quem Bideca emprestou o seu talento em algumas turnês pelo nordeste.
Mas seu palco maior foram as oiticicas e ingazeiras do rio Piancó.
Enviado
pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de
Araújo Cardoso.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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