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quinta-feira, 21 de setembro de 2023

O ÚLTIMO DUELO DE MANOEL NETO. SEVERINO BROSCO É ASSASSINADO.

 Por Giovane Gomes.

Certo dia, o Coronel, em sua rotina habitual, chegou ao Povoado Lage. A população ficou apreensiva. De óculos escuros, camisa cáqui, calça preta e seu velho revólver calibre 38 na cintura. Os moradores perceberam que o visitante estava estranho. Naquele dia ele se envolvera em briga com o Jovem Severino Brusco, motorista do coronel João Inocêncio. Dias Depois o jovem viria a ser assassinado por Manoel em um duelo de cabra macho. Existem duas versões da causa desse desentendimento.

A primeira versão é de que o coronel entrou em um estabelecimento e o motorista chegou logo em seguida, dizendo:

- Coloque um Coronel; hoje quero beber; hoje quero beber. Era costume dos sertanejos colocar um corpo americano de cachaça e tomar de uma só vez. Essa prática era chamada de “sargento”. O significado disso era que, muitas vezes, em perseguição aos cangaceiros, os soldados tomavam um corpo cheio de cachaça em um único gole para aumentar a adrenalina no corpo, atenuando o estresse emocional em que viviam os militares. Então, muitos sertanejos chegavam nas bodegas e falavam: “Coloque um Sargento!”

Nesse dia Severino gritou:

- Coloque um “coroné”!

O Cel. Manoel Neto perguntou:

- Como é, cabra?!

O jovem repetiu:

- Hoje eu quero beber, coloque um “coroné!

Sentindo-se humilhado, Manoel Neto puxou seu revólver 38 e desferiu um golpe certeiro na testa do jovem com o cabo da arma, fazendo um enorme sangramento. Assim,

Começou uma verdadeira confusão, as pessoas ali presentes entraram no meio da briga para acalmar os ânimos dos dois. Severino jurou vingança contra a vida de Manoel Neto. O jovem motorista falou:

- O senhor pode ter certeza de que não vai ficar assim.

O coronel Manoel Neto disse:

- Não vou mudar de cidade por causa de você.

A segunda versão diz que o desentendimento foi por motivo político: Severino andava difamando o coronel Manoel Neto. Chateado com a atitude do jovem, o velho militar pensou em dar um basta nessa situação. Certo dia, chegando ao Povoado Lages em seu jipe, presenciou o jovem Severino correndo atrás de uma moça; estavam brincando. Manoel Neto, incomodado com aquela atitude, gritou:

- Deixe disso, cabra safado. Parece um tarado!

A moça falou:

- Estamos brincando, Coronel!

Severino, revidou à altura:

- Cabra safado é o senhor.

O coronel ficou de orelha vermelha quando ouviu a resposta de Severino. Desceu imediatamente do jipe, partiu para o jovem, dando-lhe um tapa na cara, Sacou de sua arma para atirar no jovem, sendo impedido por populares.

Severino disse:

- Coronel, em cara de homem não se bate!

O outro falou:

- Não estou dando em cara de homem, mas na cara de cabra safado. Homem não corre atrás de

mulher!

Severino respondeu:

- Coronel, eu sou pobre, mas sou homem. Era melhor o senhor ter me matado. Em cara de homem não se bate. Várias pessoas já estavam envolvidas na confusão, o coronel de arma em punho. Os amigos do militar chegaram, tiraram-no do local. Severino, que foi desmoralizado, estava

com os ânimos exaltados, jurando vingança.

Indo embora, o Cel. Manoel Neto contou sobre a confusão ao seu amigo, Antônio Cambista. Esse advertiu:

- Aquele rapaz tem coragem!

O Cel. Mané Neto falou:

- Pode vir. Estou acostumado com cabra safado.

Seu Antônio Cambista, dizia:

- Não se bate na cara de homem, Coronel!

Manoel Neto ficou calado como se nada houvesse acontecido. Severino era um homem valente, foi humilhado com um tapa na cara. Com sede de vingança, começou logo a beber, chorar e jurar vingança. Ele conhecia os hábitos do militar, pois seu patrão morava perto do Coronel. Assim, arquitetou um plano para sua vingança:

matar o algoz em sua casa. Seu Antônio Cambista alertava:

- Coronel, Severino é genioso como o senhor. Ele vai querer vingança. O homem humilhado quer

lavar sua honra.

O Cel. Manoel Neto respondeu:

- Pode vir. Nunca tive foi medo de macho!

No dia seguinte, Severino colocou seu plano em ação. O Coronel morava em uma casa de jardim com um muro pequeno na frente e um corredor lateral. Foi nesse local que o jovem Severino se escondeu, sem ninguém perceber, esperando surpreender o velho militar, acreditando que sua força juvenil era superior à idade de seu adversário. Ele nunca imaginou que estava emboscando Manoel de Souza Neto, o lendário Mané Fumaça, o homem que muitas vezes enfrentou Lampião e tinha a força dos cabras de Nazaré.

O coronel vinha tranquilamente na rua principal de Ibimirim, usando sua camisa de

brim azul, sua calça de linho preta, chapéu de massa na cabeça. A única coisa que lhe denunciava ser militar era seu velho revólver calibre 38 no coldre, à mostra. Aproximando-se de sua casa, entrou pelo velho portão, fazendo um estalo. Um vulto apareceu com uma faca peixeira na mão e partiu para cima do coronel. Sem entender nada, mas sempre precavido, Manoel Neto sacou sua arma, dando um tiro por reflexo, não acertando o alvo. Ouviu-se uma voz:

- Perdeu a fama, velho safado?!. Nunca mais você bate em cara de homem. Com uma agilidade espetacular para um homem de mais de setenta anos, ele pula o pequeno muro de sua casa. Deu o segundo tiro, acertou o peito de Severino, que se afastou Com o impacto do projétil, mas logo voltou ao campo de luta. As pessoas presentes à peleja ficaram impressionadas com a velocidade do velho coronel. No terceiro tiro, ele gritou:

- Cabra Safado, você está brigando é com o Cel. Mané Neto!

O terceiro tiro acertou o abdômen de Severino. Mesmo alvejado à queima-roupa, Severino continuou caminhando para cima do Coronel, tentando acertar um golpe com sua faca peixeira. Não acertou nenhuma facada. No momento de fúria, baleado com dois tiros, ele tentava desesperadamente matar o algoz. Sentindo seu corpo perdendo as forças, sangrando muito, Severino começou a cair lentamente no chão. O quarto tiro acertou-lhe de raspão. Os dois últimos tiros o velho militar errou. Quem presenciava o duelo tinha certeza de que a hora do velho militar havia chegado. Mas, por incrível que pareça, ele saiu ileso, sem nenhum arranhão. Mais uma vez Manoel Neto enfrenta a morte e sai vitorioso. Severino estava caído no chão, mas conseguiu se levantar e, cambaleando, saiu caminhando, todo ensanguentado, da casa do Cel. Mané Neto que estava de arma na mão e novamente carregada. Porém, não desferiu mais tiros contra seu agressor. O jovem motorista baleado conseguiu chegar até a casa de seu patrão, caindo em seguida. O Cel. João Inocêncio falou:

- Que desgraça foi essa, homem?!

Severino respondeu:

- Foi o Cel. Mané Neto. O Senhor está vendo o que ele fez comigo?!

O patrão respondeu:

- Eu não disse a você que não mexesse com aquele cascavel!?

Logo em seguida, uma multidão se aglomerou em frente à casa do cel. Manoel Neto.

Um rastro de sangue estava presente, a fumaça da pólvora ainda estava no local e, de arma em punho, estava o maior perseguidor de cangaceiros. A experiência de combate com facínoras foi decisiva para reagir a mais uma emboscada sofrida. Quem presenciou a última peleja do Cel. Manoel Neto concluiu que ele era valente ao extremo, que ele fazia jus ao apelido de Mané Fumaça. Logo chegou a notícia que Severino estava morto próximo à casa de seu patrão.

João Florentino de Carvalho era de Floresta, estava no dia da tragédia que abalou Ibimirim. Ele era funcionário público dos Correios. Na hora do episódio ele ouviu os primeiros tiros. Então, saiu para ver o que estava acontecendo, percebendo que vinha do lado da casa do Coronel Manoel Neto. Assim, correu em direção à residência do velho militar ao seu socorro. Quando lá chegou encontrou o Cel. Manoel Neto e falou:

- O que foi isso, Coronel?

O coronel respondeu:

- Dei cabo de um infeliz agora.

João Florentino insistiu:

- Coronel! O que o senhor vai fazer agora?

Ele respondeu energicamente:

- Nada. Não sou homem de me assombrar com pouca coisa. Com muita tranquilidade, o Coronel aconselhou a seu amigo que tentava lhe ajudar:

- João, vá para casa, você é de Floresta, você é casado e tem filhos. Pode ser que alguém queira vir atrás de mim querendo vingança. João, que se encontrava desarmado quando chegou à tragédia, mesmo exposto a tudo e a todos, disse:

- Não vou Coronel. Não deixarei o senhor sozinho. Um Florestano não deixa outro para trás. João Florentino permaneceu com o Coronel e o recomendou que deixasse Ibimirim por enquanto, coisa que o Coronel não se mostrava interessado. Porém, em seguida, mesmo relutante, entrou em sua casa, pegou suas outras armas, colocou

no carro e saiu. Todos ali presente ficaram impressionados com a sua frieza no meio daquela desgraça; não parecia que há poucos minutos sua vida estava correndo perigo. João Florentino só saiu da frente da casa quando Manoel Neto foi embora para a residência de Antônio Cambista, o qual foi logo perguntando:

- O que faz aqui, meu amigo?

O coronel respondeu:

- Acabei de fazer uma desgraça.

- O que foi aqueles tiros? – Antônio perguntou.

Ele respondeu:

- Acabei de matar Severino.

- Qual Severino? - perguntou Antônio.

- Severino, motorista de João Inocêncio.

- O senhor é doido? O senhor vai ser preso!

O Cel. Manoel Neto disse:

- Nunca. Não admito um volante colocar as mãos em mim. Antônio cambista continuou:

- Coronel, o senhor tem que sair da cidade. Logo em seguida chegou a esposa de Seu Antônio, Dona Eutália, desesperada com o acontecido. Disse:

- Coronel, pelo amor de Deus, vá embora.

Ele disse:

- Estou saindo da cidade, não por medo, mas por respeito ao oficial de justiça, que é meu amigo e a vocês que estão me pedindo. A quem perguntar por mim pode dizer que daqui a oito dias estarei de volta. O coronel começou a assobiar; isso era comum quando ele estava nervoso ou calmo. Logo em seguida, entrou no seu jipe e partiu para a fazenda Baixa da Imburana. Quando voltou para Ibimirim, logo tratou de vender a residência; não quis mais morar nela. Alugou uma pequena casa e foi residir próximo de seu amigo Antônio Cambista.

Texto: Giovane Gomes

Essa história é outras faz parte do meu novo Livro A Origem de Manoel Neto. Que será lançado em Dezembro 2023.

Foto: 01 Manoel Neto e o Jornalista Malquiades da Rocha em 1938.

Foto 02: Manoel Neto em Ibimirim-PE.

Essa foto é inédita e faz parte do meu acervo particular.

Foto 03 : Manoel Nestor na Bahia.

Essa foto é uma original fazia parte do acervo de Manoel Neto. Essa foto tem uma dedicatória do proprio Manoel Neto.

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