Por Geraldo Maia do Nascimento
O tempo passa, as memórias ficam. Em 14 de novembro de 1890 morria, em Mossoró, D. Amélia de Souza Galvão, esposa de Romualdo Lopes Galvão, que fora Presidente da Intendência (Prefeito) de Mossoró nos períodos de 1883-1886 e 1892-1895.
D.
Amélia Dantas de Souza Melo Galvão ou D. Sinhá Galvão, como era mais conhecida,
teve papel de destaque no movimento abolicionista mossoroense, sendo de sua
autoria a confecção do Estandarte da Libertadora Mossoroense, feito em cetim,
com franjas e letras douradas. Este estandarte, que pode ser visitado no Museu
Histórico “Lauro da Escóssia”, é o símbolo maior da abolição da escravatura em
solo mossoroense. É a prova do idealismo, da disposição e da luta de um povo em
prol da liberdade, luta essa que teve D. Amélia como uma incansável guerreira.
Nas
palavras de Raimundo Nonato, “D. Sinhá Galvão foi a mais extraordinária figura
feminina de Mossoró, com atividades políticas, sociais e humanitárias do século
XIX.” Contagiou-se pelo idealismo do seu marido, de quem se tornou uma cooperadora
dedicada e cheia de entusiasmo pela vitória da causa que empolgava as multidões
da cidade.
Era
filha do também abolicionista e poeta José Damião de Souza Melo, português
radicado em Mossoró. Professava a religião presbiteriana, apesar de seu pai ter
sido padre em Portugal. Nunca se soube o motivo da mudança de religião. Sabe-se
apenas que um dia ele tirou a batina, queimou-a e veio para o Brasil, surgindo
como comerciante em Mossoró.
Segundo
depoimentos do Major Romão Filgueira, “D. Sinhá era uma mulher dotada de raros
predicados morais e culturais, belo espírito de comunicação e de idéias
elevadas”. Tomou parte em todas as comissões importantes da Libertadora.
Apaixonada pelo movimento, “convida suas amigas, entre elas as das famílias
Soares do Couto, Dr. Paulo Leitão e outras, para saírem às casas dos senhores
possuidores de escravos, concitando-os a alforriarem seus cativos, chegando ao
ponto de quando não podiam receber adesões para o movimento, em virtude da
escravidão ser garantida por lei, de se ajoelharem, beijando os pés dos
potentados, indiferente aos sofrimentos dos prisioneiros das senzalas, rogando
a liberdade imediata dos escravos que possuíam”.
Na
memorável sessão de 30 de setembro de 1883, D. Amélia Galvão teve a incumbência
de fazer entrega de carta de alforria às mulheres escravas e, a cada uma,
beijava, dizendo: “Dona Fulana, a senhora, de agora em diante é tão livre como
eu”. Foi um belo e espontâneo gesto.
A
história de Mossoró está cheia de mulheres guerreiras. Só para lembrar algumas,
podemos citar, além de D. Sinhá Galvão, Anna Rodrigues Braga, a Anna Floriano,
que liderou o movimento das mulheres de Mossoró contra a obrigatoriedade do
serviço militar e a Professora Celina Guimarães, a precursora do voto feminino
no Brasil.
Mas
D. Sinhá Galvão pagou um preço alto por sua luta em prol da libertação dos
escravos. Esgotada pelo cansaço adoeceu, contraindo uma tuberculose e dela não
conseguiu se curar. Morreu a 14 de novembro de 1890, estando sepultada em
túmulo próprio no Cemitério Público de Mossoró. É lamentável que Mossoró, em
suas homenagens prestadas em cada dia 30 de setembro, jamais tenha se lembrado
de prestar uma homenagem a D. Sinhá Galvão.
Geraldo
Maia do Nascimento
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