Trinta e cinco
anos depois de morto, Lampião é reverenciado pelos nordestinos com o mesmo
entusiasmo com que se reverencia o Padim Ciço, Antônio Conselheiro, Corisco,
Antônio Silvino e Frei Damião (este ainda vivo), entre outras personalidades
cujo misticismo, capacidade de liderança ou trabalho em favor dos mais humildes
os consagraram na admiração popular.
A figura de Lampião foi reverenciada ontem no cemitério das Quintas de Lázaro, em Salvador, para onde se deslocaram seus antigos companheiros de cangaço, amigos e descendentes de ex-cangaceiros que participaram de seu grupo. A 28 de julho de 1938, Lampião tombava na fazenda Angicos, estado de Sergipe, enquanto sua cabeça e a de sua mulher eram conduzidas a Maceió, como prova da façanha dos policiais.
UM HOMEM SEM
ESTIGMAS
“O Lampião não
possuía nenhum estigma de criminalidade. Era um homem normal” – continua
afirmando, como há 35 anos, o professor Arnaldo Silveira, que a 5 de agosto de
1938 examinou a cabeça de Virgulino Ferreira e de Maria Bonita. Ele tinha sido
incumbido de confeccionar uma matriz das duas cabeças, para possíveis
reproduções, mas encontrou-as quase em pedaços. Trazidas de Angicos para Maceió
dentro de uma lata cheia de cachaça, as cabeças estavam praticamente
esfaceladas. O médico teve de fazer uma restauração, recorrendo à madeira para
os enxertos.
“Eles usavam cabelos compridos e os soldados fizeram uma trança para conduzir as duas cabeças à presença das autoridades” – lembra o professor Arnaldo, que afirma ter sido obrigado a recompor inclusive a cabeleira de Lampião e de Maria Bonita, utilizando-se de cabelos de outras pessoas. Quanto a Maria Bonita, Arnaldo Silveira lembra que as fortes contrações dos músculos faciais indicam que ela foi degolada antes de vir a morrer. Durante cinco anos essas cabeças ficaram em poder dele, até que foram entregues ao museu do Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, onde ficaram até 6 de fevereiro de 1969, quando foram enterradas, juntamente com a cabeça de Corisco, no cemitério das Quintas do Lázaro.
O professor acha que a decisão de enterrar as cabeças dos cangaceiros foi acertada mesmo porque elas não têm mais nenhuma utilidade para a ciência. Enquanto ficaram em poder dele, as cabeças conservaram até a cor natural da pele, porque o professor empregava, na época, um processo que ele chama de ítalo-alemão, que consistia em injetar parafina nos tecidos, provocando sua desidratação. “Quando as cabeças foram para o museu – conta Arnaldo Silveira – passaram a ser conservadas por outro processo e perderam totalmente suas características”.
RESISTÊNCIA
Entende ainda
o professor Arnaldo que Lampião foi um homem de resistência física excepcional,
pois mesmo sem o olho direito, tuberculoso de um pulmão e passando privações de
todo o gênero, poderia ter vivido muitos anos se não fosse morto pela polícia.
Ele acredita que “Lampião matava por necessidade, tinha que amedrontar a
polícia para poder viver, e à sombra de seu nome muitas maldades foram feitas
no sertão”.
DADÁ SÓ VIVE
PARA OS NETOS
Sérgia Silva
Chagas, DADÁ, esposa de Corisco, ainda hoje se lembra com carinho de Lampião e
seu bando, do qual Corisco fazia parte. Cuidando dos 11 netos no bairro do
Barbalho, em Salvador, Dadá só faz questão de duas coisas, hoje em dia: quer
que a cabeça do marido seja liberada, para juntar-se aos outros ossos que ela
conserva debaixo da cama, numa urna; e quer que os netos tenham tudo o que seus
filhos não puderam ter.
Diariamente Dadá vai à Igreja dos Perdões, par rezar e lembrar seu grande amor pelo marido, que ela define como um homem manso e bom que entrou para o cangaço porque recebeu uma bofetada de um superior, quando Corisco era polícia”.
REMORSO, NÃO
Outra
preocupação de Dadá, sempre que lhe perguntam sobre o passado, é procurar
demonstrar que não tem nenhum remorso, complexo ou qualquer outro sentimento de
culpa por ter participado da vida de um bando de cangaceiros, a partir dos 13
anos de idade. Para ela, tudo era muito romântico: “Corisco era bom e gostava
muito de mim. Ele era loiro, muito bonito e tinha a pele rosada como uma manga
rosa” – conta Dadá, que era considerada pelo marido como “uma mulher de bem”.
Dadá lembra que o sonho de Corisco era transformá-la numa mulher requintada, e ele começou a executar seu plano, ensinando a ler. À noite, lia para ela trechos da Bíblia e história de guerra de Carlos Magno. A 5 de maio de 1940, Corisco foi metralhado pelas costas.
Fonte:
facebook
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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