Acervo do Geraldo Júnior
A GRANDE SECA
DO NORDESTE
* por Talita Lopes Cavalcante
Das grandes
secas que assolaram o Brasil, uma das mais graves e lembradas foi aquela que
compreendeu os anos de 1877 à 1879, ficando conhecida como a grande seca do
Nordeste. Foram quase três anos seguidos sem chuvas, com perda de plantações,
mortes de rebanhos e miséria extrema. A situação foi tão desesperadora, que
famílias inteiras se viram obrigadas a migrar para outros estados, promovendo
uma onda de imigrações.
O cenário
ficou cada vez mais caótico, principalmente quando os retirantes chegaram em
outras cidades e estados. Devido à miséria extrema das pessoas que chegavam, os
moradores locais temiam saques no comércio e armazéns. Além disso, as cidades
para as quais as vítimas da seca se dirigiam começaram a ficar cada vez mais
apinhadas de flagelados. Fortaleza, por exemplo, converteu-se na capital do
desespero. De 21 mil habitantes pelo censo de 1872 passaram a ter 130 mil.
Somando-se ao
quadro caótico, os rebanhos de animais sobreviventes sucumbiram diante da ação
de zoonoses, furtos, fome e sede. A flora e a fauna da região praticamente
desapareceram. Por fim, para completar o quadro de tragédia, houve um surto de
varíola, dizimando milhares de pessoas. Finalmente o governo imperial enviou ao
Nordeste uma comissão de engenheiros para a perfuração de poços, construção de
estradas de ferro e armazenamentos de água, para assim resolver o grande
problema da seca.
Curiosidade:
Calcula-se que
500 mil pessoas morreram por causa da seca, em que o Estado mais atingido foi
Ceará. O imperador dom Pedro II foi ao Nordeste e prometeu vender “até a última
joia da Coroa” para amenizar o sofrimento dos súditos da região. Não vendeu,
porém enviou engenheiros para a construção de poços.
Alguns anos
depois da primeira grande seca no século XIX, em 1915 um novo episódio assolou
o sertão nordestino. Mais uma vez, a nova seca fez com que diversos nordestinos
migrassem para as grandes cidades, porém, ao contrário do primeiro episódio, o
governo cearense resolveu se precaver de uma maneira desumana. Desta feita, o
governo criou os primeiros currais humanos, campos de concentração em regiões
separadas por arames farpados e vigiadas 24 horas por dia por soldados para
confinar as almas nordestinas retirantes castigadas pela seca.
A oeste da
cidade de Fortaleza foi erguido, então, na região alagadiça da atual Otávio
Bonfim, o primeiro campo de concentração brasileiro. Ali ficaram confinadas
cerca de 8 mil pessoas com alimentação e água controladas e vigiadas pelos
soldados do Exército. Naquele mesmo ano de 1915, após incentivos para que os
retirantes migrassem para a Amazônia, o curral humano foi desativado.
Cerca de 17
anos mais tarde, em 1932, foi a vez de reabrir o campo de concentração de
Otávio Bonfim e criar novos currais humanos. Naquele ano, outra grande seca
castigou novamente o sertão nordestino, fazendo com que, mais uma vez, milhares
migrassem para os grandes centros urbanos. Após dezessete anos, nem o governo
federal, nem os governos estaduais haviam se precavido para diminuir os efeitos
da seca e a solução, novamente desumana, passou a ser a criação e ampliação dos
campos de concentração nordestinos.
Pela segunda
vez, foram erguidas regiões cercadas por arames farpados e vigiadas diariamente
por soldados para confinar os nordestinos afetados pela seca. Corpos magros, de
cabeças raspadas e numeradas se apinhavam aos montes dentro dos cercados de
Senador Pompeu, Ipu, Quixeramobim, Cariús, Crato (ou Buriti, por onde passaram
mais de 65 mil pessoas) e o já conhecido Otávio Bonfim, os maiores currais
humanos instalados no Brasil para conter a massa castigada pela seca dos anos
de 1915 e 1932.
Poema “Campos
de Concentração no Ceará”, por Henrique César Pinheiro.
No Estado do
Ceará
A exemplo do alemão
Houve por aqui também
Campo de concentração
Lá era pra matar judeu
Aqui o povo do sertão.
Na seca de
trinta e dois
Criamos uns sete currais
Para evitar que famintos
Criassem problemas sociais
E pudessem invadir
Na capital seus mananciais.
Currais foram
construídos
Em Senador Pompeu, Ipu,
Quixeramobim e Crato,
Fortaleza e Cariús.
Fortaleza teve dois
Otávio Bonfim, Pirambu.
Pessoas foram
confinadas
Como bando de animais.
Tinha a cabeça raspada
Sacos de açúcar, jornais
Era o que lhes serviam
Como vestes mais usuais
Sem nome, ou
identidade,
Chamados por numerais.
Desta maneira estavam
Registrados nos anais.
Só se comia farinha,
Rapadura nos currais.
Toda essa
gente foi presa
Sem ter crime praticado
E para isto bastava
Somente estar esfomeado.
Pedir prato de comido
Que seria logo enjaulado.
E controlados
por senhas,
Pelas forças policiais.
Quem entrava não saía,
Senão pros seus funerais.
Sessenta mil lá morreram.
Nos registros oficiais.
Para aqueles
locais, todas
Pessoas foram atraídas.
Com promessas que seriam
por médicos assistidas,
Que teriam segurança
E fartura de comidas
Experiência
que houve
Somente aqui no Ceará.
Que se iniciou em quinze
Naquela seca de torrar
Depois disso os alemães
Trataram de aperfeiçoar.
Alguns campos
projetados
Para abrigar duas mil pessoas
Dezoito mil chegou alojar.
Presos por vilões e viloas,
Felizes os governantes
Ainda cantavam suas loas.
Em Ipu todos
os dias
Morriam de sete a oito.
A maioria era de fome
E até por ser afoito,
Nas tentativas de fugas,
Pro que não havia acoito.
Nas décadas
posteriores,
Pra mudar essa imagem,
governos criaram albergues
para evitar sacanagem,
mesmo assim pouco funcionou
pois sempre há malandragem.
E o povo
nordestino
ainda de pires na mão,
espera de todos governos
pro problema solução.
Agora estamos na briga
pela tal transposição.
Ceará de Terra
da Luz
É chamado no Brasil.
Foi nosso primeiro estado
Que escravatura aboliu
Pra isso não foi necessário
Nem mesmo usar um fuzil.
Mas a geração
atual
Tem que redimir o erro
De governantes passados.
Não permitir o desterro
De seus filhos pra terra alheia
e muitos acham o enterro.
REFERÊNCIAS:
– “A SECA DE
1877 – 1879“, FÁTIMA GARCIA, FORTALEZA EM FOTOS.
– AZEVEDO, MIGUEL ÂNGELO. CRONOLOGIA ILUSTRADA DE FORTALEZA.
– AZEVEDO, MIGUEL ÂNGELO. CRONOLOGIA ILUSTRADA DE FORTALEZA.
– KOSSOY,
BORIS. UM OLHAR SOBRE O BRASIL: A FOTOGRAFIA NA CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DA NAÇÃO
(1833 – 2003). 1° EDIÇÃO. SÃO PAULO: FUNDACIÓN MAPFRE E EDITORA OBJETIVA, 2012.
P. 94.
– LESSA,
LETÍCIA. CURRAIS DE GENTE NO CEARÁ.
– “CURRAIS
HUMANOS“. DIÁRIO DO NORDESTE
– SÁ, CHICO.
“CEARÁ: NOS CAMPOS DA SECA“. REVISTA AVENTURAS NA HISTÓRIA. EDITORA ABRIL:
2005.
– ARQUIVO “O
POVO NO CAMPO DE CONCENTRAÇÃO“. 1932.
Na imagem
abaixo: Vítimas da seca. Crianças e adultos jazem ao lado da linha férrea que
levava para o Campo de concentração de Senador Pompeu/CE. De forma
assustadoramente parecida, as cenas brasileiras dos currais humanos lembravam
bastante os campos de concentração nazistas.
Geraldo
Antônio de Souza Júnior (Administrador)
Fonte: facebook
Página: Geraldo Júnior
Grupo: O Cangaço
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