Por Sálvio
Siqueira
O fenômeno
cangaço brotou regado de sangue, suor, lágrimas e foi adubado com os corpos
daqueles que tombavam nas terras semiáridas do sertão nordestino. Diante da
arrogância, prepotência e imponência dos poderosos dominantes de uma região
pobre e ‘esquecida’ pelos governantes, alguns nordestinos desviaram-se de sua
conduta honrosa para tentar sobreviver ante o devastador mundo do poder.
Os flagelos causados por fenômenos naturais, segundos estudos de sociólogos, pesquisadores/historiadores renomados, por diversas vezes ao longo do tempo foi uma das principais causas do surgimento de grupos de homens errantes que passaram a aterrorizar as quebradas do sertão nordestino. Para sobreviverem, alguns dos chefes de bandoleiros faziam alianças com latifundiários, ‘coronéis’, políticos e comerciantes numa espécie de ‘favores’ trocados.
As grandes secas que assolavam a região do semiárido nordestino, que sem elas já era uma batalha para sobreviver, passa a aumentar em números alarmantes as dificuldades, sofrimentos, fome e sede de uma comunidade carente de ações políticas regionais. O sertanejo então, desde o seu nascer, é induzido a crenças que o fazem, em parte, aceitar seu sofrimento, flagelo e morte sem notar que a maior parte daquilo tudo é simplesmente a falta de atenção das pessoas que estavam com as rédeas do poder nas mãos.
Ao longo do tempo, governantes e religiosos sempre se destacaram com pactos quanto ao destino das pessoas. Os governantes por não fazerem, cumprirem com a responsabilidade de práticas e ações sociais para com o povo e, os religiosos fazendo com que as pessoas não notassem essa falta de responsabilidades daqueles por elas escolhidas para lhes governar, lavando seus cérebros, deixa a culpa toda para um Ser Supremo. Achando que todo seu sofrimento é determinação divina, morriam pelos caminhos e veredas empoeiradas do sertão pedindo perdão pelos pecados que jamais comentaram. O misticismo, a religiosidade, o sebastianismo, em fim... as crenças trazidas da Europa por nossos colonizadores, travou o desenvolvimento intelectual da maioria da população brasileira. É fato.
O sertão nordestino sempre pariu homens e mulheres fortes e destemidos. Pessoas que foram forjadas pelo calor calcinante de um sol que parece estar mais próximo, pela brisa leve e seca que ao bater na pele parece gumes de pequenas navalhas e por um bioma que se despe entrando em uma espécie de hibernação para sua própria proteção e sobrevivência. Essa última mostrando vida e morte, verde e cinza, numa contraste constante de renovação periódica, obrigando as pessoas a se adaptarem ou padecerem em suas entranhas.
No sertão, as pessoas, ainda hoje, têm a ‘palavra dada’ como um valor inestimável. A garantia ou a promessa oral, verbal, vale muito mais do que suas assinaturas abaixo de rascunhos numa folha de papel. Muitas delas consideram que palavra dada era igual ouro, um metal que não enferruja. Porém, como em tudo nessa vida tem exceções, essa regra também as teve. Palavras foram quebradas, mentiras foram soltas ao vento causando dores, lágrimas e mortes de inocentes.
Sabedor das crenças dos conterrâneos, Lampião, em sua grande sabedoria, passa a usar de artimanhas, mentiras, para conquistar a adesão, amizade e respeito, da população sertaneja. Primeiro por ser um dos grandes motivos para sua sobrevivência, segundo para se mostrar benfeitor ou mesmo o justiceiro que nunca o fora. Pois bem, como exemplo, contaremos um caso que ocorreu no município de Flores, PE, em junho de 1925, quando Lampião praticou duas grandes atrocidades a um cidadão do Pajeú das Flores.
Para começo de conversa, Lampião sempre referiu que nunca havia invadido a cidade de Flores, PE, devido à mesma ter como ‘Padroeira’ a Santa Nossa Senhora da Conceição. Ora, o povoado de São Serafim, hoje cidade de Calumbi, PE, bem próxima a Flores, também tem por padroeira a mesma santa, e nem por isso o “Rei Vesgo” deixou de invadir e pintar o escarcéu naquele lugarejo. Roubou, extorquiu e estuprou, só não matando devido algumas pessoas alvo, terem fugido para dentro da Mata Branca, muito antes da sua entrada no povoado.
Entre Triunfo e Calumbí, ambas no sertão do Pajeú das Flores, microrregião do interior pernambucano, existe uma serra por nome de Caititu. Nela, Lampião fez moradia temporária devido sua posição, e sua geografia permitir muito pouco alguém escalar. Sabedor das dificuldades naturais da serra, Lampião usa-os como aliado e, foi não foi, estava nela acoitado, principalmente por haver uma gruta bastante ampla chamada de ‘casa de pedra’.
A Serra do Caititu, ficando próximo aos limites do município de Flores, PE, Lampião envia um emissário para dois cidadãos, um que morava no Sítio Melancia e outro próximo ao sítio Saco dos Bois, propriedade d’um grande coiteiro de Virgolino, o major Ernesto. O emissário leva dois dos famosos bilhetes de extorsão que tanto o chefe mor do cangaço usou com suas vítimas. Eram dois, porém, tinham o mesmo conteúdo, pediam uma determinada quantia.
Segundo o pesquisador Louro Teles, em seu “A Maior Batalha de Lampião – Serra Grande e a Invasão de Calumbi”, os dois eram donos de engenhos de rapadura e eram envolvidos na política regional, dois fatores que conquistaram a cobiça do cangaceiro.
Um desses cidadãos chamava-se Matias Moreira. Esse, ao receber o pedido de dinheiro responde malcriadamente, dizendo:
Os flagelos causados por fenômenos naturais, segundos estudos de sociólogos, pesquisadores/historiadores renomados, por diversas vezes ao longo do tempo foi uma das principais causas do surgimento de grupos de homens errantes que passaram a aterrorizar as quebradas do sertão nordestino. Para sobreviverem, alguns dos chefes de bandoleiros faziam alianças com latifundiários, ‘coronéis’, políticos e comerciantes numa espécie de ‘favores’ trocados.
As grandes secas que assolavam a região do semiárido nordestino, que sem elas já era uma batalha para sobreviver, passa a aumentar em números alarmantes as dificuldades, sofrimentos, fome e sede de uma comunidade carente de ações políticas regionais. O sertanejo então, desde o seu nascer, é induzido a crenças que o fazem, em parte, aceitar seu sofrimento, flagelo e morte sem notar que a maior parte daquilo tudo é simplesmente a falta de atenção das pessoas que estavam com as rédeas do poder nas mãos.
Ao longo do tempo, governantes e religiosos sempre se destacaram com pactos quanto ao destino das pessoas. Os governantes por não fazerem, cumprirem com a responsabilidade de práticas e ações sociais para com o povo e, os religiosos fazendo com que as pessoas não notassem essa falta de responsabilidades daqueles por elas escolhidas para lhes governar, lavando seus cérebros, deixa a culpa toda para um Ser Supremo. Achando que todo seu sofrimento é determinação divina, morriam pelos caminhos e veredas empoeiradas do sertão pedindo perdão pelos pecados que jamais comentaram. O misticismo, a religiosidade, o sebastianismo, em fim... as crenças trazidas da Europa por nossos colonizadores, travou o desenvolvimento intelectual da maioria da população brasileira. É fato.
O sertão nordestino sempre pariu homens e mulheres fortes e destemidos. Pessoas que foram forjadas pelo calor calcinante de um sol que parece estar mais próximo, pela brisa leve e seca que ao bater na pele parece gumes de pequenas navalhas e por um bioma que se despe entrando em uma espécie de hibernação para sua própria proteção e sobrevivência. Essa última mostrando vida e morte, verde e cinza, numa contraste constante de renovação periódica, obrigando as pessoas a se adaptarem ou padecerem em suas entranhas.
No sertão, as pessoas, ainda hoje, têm a ‘palavra dada’ como um valor inestimável. A garantia ou a promessa oral, verbal, vale muito mais do que suas assinaturas abaixo de rascunhos numa folha de papel. Muitas delas consideram que palavra dada era igual ouro, um metal que não enferruja. Porém, como em tudo nessa vida tem exceções, essa regra também as teve. Palavras foram quebradas, mentiras foram soltas ao vento causando dores, lágrimas e mortes de inocentes.
Sabedor das crenças dos conterrâneos, Lampião, em sua grande sabedoria, passa a usar de artimanhas, mentiras, para conquistar a adesão, amizade e respeito, da população sertaneja. Primeiro por ser um dos grandes motivos para sua sobrevivência, segundo para se mostrar benfeitor ou mesmo o justiceiro que nunca o fora. Pois bem, como exemplo, contaremos um caso que ocorreu no município de Flores, PE, em junho de 1925, quando Lampião praticou duas grandes atrocidades a um cidadão do Pajeú das Flores.
Para começo de conversa, Lampião sempre referiu que nunca havia invadido a cidade de Flores, PE, devido à mesma ter como ‘Padroeira’ a Santa Nossa Senhora da Conceição. Ora, o povoado de São Serafim, hoje cidade de Calumbi, PE, bem próxima a Flores, também tem por padroeira a mesma santa, e nem por isso o “Rei Vesgo” deixou de invadir e pintar o escarcéu naquele lugarejo. Roubou, extorquiu e estuprou, só não matando devido algumas pessoas alvo, terem fugido para dentro da Mata Branca, muito antes da sua entrada no povoado.
Entre Triunfo e Calumbí, ambas no sertão do Pajeú das Flores, microrregião do interior pernambucano, existe uma serra por nome de Caititu. Nela, Lampião fez moradia temporária devido sua posição, e sua geografia permitir muito pouco alguém escalar. Sabedor das dificuldades naturais da serra, Lampião usa-os como aliado e, foi não foi, estava nela acoitado, principalmente por haver uma gruta bastante ampla chamada de ‘casa de pedra’.
A Serra do Caititu, ficando próximo aos limites do município de Flores, PE, Lampião envia um emissário para dois cidadãos, um que morava no Sítio Melancia e outro próximo ao sítio Saco dos Bois, propriedade d’um grande coiteiro de Virgolino, o major Ernesto. O emissário leva dois dos famosos bilhetes de extorsão que tanto o chefe mor do cangaço usou com suas vítimas. Eram dois, porém, tinham o mesmo conteúdo, pediam uma determinada quantia.
Segundo o pesquisador Louro Teles, em seu “A Maior Batalha de Lampião – Serra Grande e a Invasão de Calumbi”, os dois eram donos de engenhos de rapadura e eram envolvidos na política regional, dois fatores que conquistaram a cobiça do cangaceiro.
Um desses cidadãos chamava-se Matias Moreira. Esse, ao receber o pedido de dinheiro responde malcriadamente, dizendo:
“- Diga a ele
que se ele quiser dinheiro, vã trabalhar como eu trabalhei! Eu não tenho
dinheiro para bandido, não!” (LT, 2017)
O morador do
sítio Melancia chamava-se José Calú, ou Calu. Que também negou o envio de
alguns mil réis. As férias, quantia em dinheiro, prevista pelo “Rei do Cangaço”
não deu certo. O ‘apurado’ foi por ‘água abaixo’ e isso sempre deixava o
cangaceiro bastante zangado. Além disso, os dois teriam que servirem de exemplo
para o restante da população da região perdendo suas vidas ou sendo bastante
torturados.
Deixemos o caso de Matias Moreira para outra oportunidade.
Em vários e vários livros sobre esse fato, o caso de José Calu, vem em suas entrelinhas que Lampião ficando sabendo que o mesmo mantinha relações sexuais com suas filhas, resolveu castiga-lo. “Conversa vai, conversa vem, José Josino contou-lhe que um sujeito chamado José Calu, que era viúvo, matinha relações sexuais com as próprias filhas – um escândalo sem limites, o povo comentava isso como sendo o fim do mundo. Lampião também ficou horrorizado e resolveu dar uma lição de moral no miserável (...) Zé Calu estava se aprontando para ir à feira, quando Lampião chegou à fazenda com seus cabras. O cangaceiro pediu dinheiro.
Zé Calu disse que não tinha. Lampião sabia que ele estava mentindo, pois Zé Calu era dono de engenho de rapadura, com certeza tinha dinheiro escondido em casa. Depois de determinar que pusessem piquetes na estrada para evitar que alguém fosse à cidade avisar as autoridades, lampião mandou que amarrassem Zé Calu pelos testículos e o pendurassem no gancho de um armador de rede. E isso foi só o começo. Zé Calu foi submetido a rigoroso interrogatório sobre as feias práticas que lhe eram imputadas. O homem negou tudo, jurou que era mentira do povo, mas ão teve jeito, os cangaceiros puxaram a corda fazendo-o subir e descer várias vezes, pendurado pelos tesyículos, urrando de dor, enquanto Lampião repetia:
Deixemos o caso de Matias Moreira para outra oportunidade.
Em vários e vários livros sobre esse fato, o caso de José Calu, vem em suas entrelinhas que Lampião ficando sabendo que o mesmo mantinha relações sexuais com suas filhas, resolveu castiga-lo. “Conversa vai, conversa vem, José Josino contou-lhe que um sujeito chamado José Calu, que era viúvo, matinha relações sexuais com as próprias filhas – um escândalo sem limites, o povo comentava isso como sendo o fim do mundo. Lampião também ficou horrorizado e resolveu dar uma lição de moral no miserável (...) Zé Calu estava se aprontando para ir à feira, quando Lampião chegou à fazenda com seus cabras. O cangaceiro pediu dinheiro.
Zé Calu disse que não tinha. Lampião sabia que ele estava mentindo, pois Zé Calu era dono de engenho de rapadura, com certeza tinha dinheiro escondido em casa. Depois de determinar que pusessem piquetes na estrada para evitar que alguém fosse à cidade avisar as autoridades, lampião mandou que amarrassem Zé Calu pelos testículos e o pendurassem no gancho de um armador de rede. E isso foi só o começo. Zé Calu foi submetido a rigoroso interrogatório sobre as feias práticas que lhe eram imputadas. O homem negou tudo, jurou que era mentira do povo, mas ão teve jeito, os cangaceiros puxaram a corda fazendo-o subir e descer várias vezes, pendurado pelos tesyículos, urrando de dor, enquanto Lampião repetia:
- Isso é pra
você aprendê a respeitá suas fia, seu disgraçado!” (BI, pg 180, 2014)
No dia 4 do mês de Santana de 1925, Lampião deixa o esconderijo da ‘casa de pedra’ na serra do Caititu, desceu a serra e foi procurar pelos donos de engenhos que lhe negaram o dinheiro. Matias, não estando em casa, se salva de uma morte certa pelo desaforo que mandou, e sua sentença foi adiada. Já o outro, José Calu, não tem a mesma sorte. Lampião distribuiu seus cabras pelos caminhos e veredas que levavam a cidade de Flores para, todo aquele que fosse para a feira, era um dia de sábado, ser pego e seu dinheiro tomado ficando os mesmos presos para não darem o alarma as autoridades. O restante dos homens, obedecendo às ordens do chefe, cerca a casa sede da fazenda Melancia e, estando seu dono aprontando-se para ir a Flores, é surpreendido por fortes pancadas na porta do terreiro da frente. Abrindo a porta, sua casa é invadida pela horda de cangaceiros que já vão mandando brasa nos móveis e no próprio José Calu.
Segundo o autor do livro seu “A Maior Batalha de Lampião – Serra Grande e a Invasão de Calumbi”, que mora na região onde ocorreu o fato e ainda hoje matem contatos com familiares de José Calu, a coisa não se deu como as outras obras literárias referiram. O castigo aplicado ao dono de engenho foi exclusivamente uma lição por não ter-lhe mando o dinheiro pedido. “Quando José Calu foi interrogado por que não tinha mandado o dinheiro ele disse que não tinha dinheiro, Lampião com raiva mandou os cangaceiros tirarem a roupa do coitado, amarraram os testículos do infeliz e pendurou José Calu, no brabo da casa o deixando pendurado e partiram sem rumo; como se não bastasse, Lampião ainda ameaçou matar quem o tirasse dali.” ( LT, pg 87, 2017)
Lampião era bastante esperto e sempre que possível, procurava fazer-se de vitima. Dentro da caatinga, dava inúmeras voltas em cima dos próprios rastros, subindo e descendo serras, indo e voltando para confundi seus perseguidores. Sempre mandava dizer que iria para uma localidade quando na verdade dirigia-se para outra em direção totalmente contrária. Para amenizar certas crueldades praticadas por ordem dele, ou mesmo pelo próprio, dizia que fora obrigado ou que fora enganado, ou ainda que estivesse fazendo justiça.
O próprio Lampião foi quem inventou a história do coito entre pai e filhas. Condenando o pai para o resto da vida por uma coisa que não cometeu.
O pesquisador/historiador Louro Teles, na página 88 da O.C., nos relata: “(...) entrevistei dona Maria Vanusa Barbosa de Brito, neta de José Calu, entendi que era mais uma mentira de Lampião utilizada por ele apenas para justificar seus erros.”
Referindo sobre o que dissera dona Maria Vanusa, quando perguntada sobre José Calu manter relações com suas filhas, ele escreveu a seguinte resposta dela: “-Não! Ele queria apenas dinheiro. Quando Lampião invadiu a casa de Calu meu avô, minha tia Maria Barbosa conhecida por Maria calu, justamente a menina que diziam que o pai tinha abusado dela estava na sala e Lampião ao ver os brincos de ouro que estavam em suas orelhas tentou toma-los, mas como ela não quis entregar ele lhe rasgou as duas orelhas deixando nela esta marca por toda sua vida.”
Naquela ocasião, o avô por parte da mãe de dona Maria Vanusa, Manoel Barbosa, era cangaceiro participante do bando do “cego”. José Calu teve três filhos, dois homens e uma mulher. Em muitas obras literárias são citadas que seriam duas mulheres e um homem. Um dos filhos de Calu, Manoel Barbosa do Nascimento, era o pai de dona Maria Vanusa Barbosa de Brito.
A historiografia do cangaço é contida de contos e contos sobre fatos que distorcem em todo ou em alguma parte. Nesse caso que acabamos de lhes contar, notamos que que quase toda a narração em uma obra, bate de igual com a outra, inclusive suas datas, localidade e maneira de agir dos cangaceiros. O que diferencia é a causa que levou o “Rei do Cangaço” a praticar mais uma das suas grandes atrocidades... nas quebradas do Sertão do Pajeú das Flores.
Fonte Os. Cs.
Foto Revista “O Malho”
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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