Por João Costa
Foto1. Jagunços liderados por Floro Bartolomeu.
José Lourenço Gomes da Silva, filho de negros alforriados, desembarcou em Juazeiro do Norte em 1890 procedente de Pilões de Dentro, Brejo paraibano, numa leva de romeiros aos 18 anos de idade – após a romaria os parentes retornaram à Paraíba, mas José Lourenço resolveu ficar; pediu ao padre Cícero Romão e obteve um emprego.
Lourenço foi designado pelo padre Cícero para administrar uma de suas propriedades rurais, um sítio de nome Baixa do Dantas entre a Serra do Cruzeiro e a Serra do Caldeirão, município do Crato, rota e entreposto utilizado por romeiros que chegavam ao Juazeiro, quase como enxames.
Disciplinado e empreendedor eficiente, logo o sítio Baixa do Dantas prosperou produzindo algodão, café, hortifrutigranjeiros, uma casa de farinha além de servir de entreposto para banho e alimentação de romeiros e, claro, refúgio para assassinos foragidos que se misturavam aos romeiros em sua jornada.
- Aqui o passado de ninguém interessa, ele é apagado; o que conta no presente e futuro é a crença e o trabalho pra servir a todos, era a saudação de Zé Lourenço para aqueles que resolviam, como ele, permanecer nos arredores de Juazeiro.
Negro alto, elegante e de fé inabalável susceptível ao fanatismo dominante entre os sertanejos católicos, logo tornou-se beato fervoroso adotando práticas introduzidas por padres missionários católicos como a penitência e a autoflagelação, como meio de purificação e obtenção do perdão para os pecados,
O Vaticano sempre aprovou o uso da autoflagelação como penitência, com uso de cilício, cintos ou práticas de desconforto, como dormir no chão, rezar de joelhos, carregar cruzes similares a do Cristo; tudo que era permitido e estimulado pela Igreja Católica, o beato Zé Lourenço praticava.
A combinação de religioso fervoroso com prosperidade na administração dos negócios renderam tremendos problemas para José Lourenço – além de despertar inveja entre os que compunham o staff em torno do padre Cícero Romão.
Ao visitar o Juazeiro do Norte em missão religiosa e em busca de negócios com Floro Bartolomeu – que conduzia o braço financeiro do padre Cícero, Delmiro Gouveia presenteou o clérigo com um boi da raça guzerá (touro zebu), que muito se diferenciava dos bois pés-duros da região.
O padre Cícero entregou o animal aos cuidados do beato Zé Lourenço, que de imediato providenciou um estábulo exclusivo por conta de aclimatação, ração e tudo o mais; o hábito de nominar animais é recorrente entre sertanejos e o animal recebeu o nome de “boi Mansinho”.
Contam que Zé Lourenço terceirizou os cuidados do “Bois Mansinho” para uma velha senhora, que tratava o animal com mimos: além de banhos, o animal era ornamentado e, em função da presença daquele animal “majestoso”, os rivais propagaram boatos de que Zé Lourenço adorava o referido animal, além de “distribuir fezes e urina do boi como remédio para enfermidades”, e com isso o beato faturava economicamente.
Simultaneamente ao que ocorria no sítio Baixa do Dantas estourou a “sedição do Juazeiro”, um movimento político e militar dos chefes políticos locais contra o governo do estado do Ceará liderado por Floro Bartolomeu, Nogueira Acióli e padre Cícero Romão.
- Meu padrinho não posso aderir à guerra pegando em armas, mas posso ajudar no sustento daqueles que vão combater em seu nome, disse Zé Lourenço ao padre Cícero.
De fato, durante o cerco das tropas do governo coube ao beato Zé Lourenço fornecer mantimentos e água para as tropas leais ao padre Cícero sitiadas no Juazeiro, tudo a partir da produção agrícola do sítio Baixa do Dantas.
Esse contexto fez crescer o papel de Zé Lourenço à sombra do padre Cícero, tanto quanto a importância de Floro Bartolomeu, médico, tesoureiro e braço político do padre Cícero.
Mas a suposta conduta exacerbada de fé de Zé Lourenço no sítio Baixa do Dantas foi utilizada como pretexto pelos “inimigos ocultos” do beato para destruir a sua reputação.
O padre Cícero mandou investigar e ao fim e ao cabo de tudo, constatou-se que nada daquilo que propagavam contra Zé Lourenço e seus seguidores ocorria.
O sacerdote recomendou a venda do animal para estancar a onda fanática em torno do “Boi Mansinho”, mas Floro Bartolomeu fez diferente; mandou encarcerar Zé Lourenço no Crato e determinou que o animal fosse abatido e que jagunços obrigassem o beato e seus acólitos a comerem a carne do animal.
Liderando jagunços bem armados, Floro destruiu as benfeitorias do sítio, que acabou sendo vendido pelo padre Cícero e os compradores exigiram a saída de Zé Lourenço e seus seguidores do lugar.
Mas a trajetória e protagonismo do beato Zé Lourenço não acabam aí.
O padre Cícero despacha Zé Lourenço para cuidar de outra propriedade, desta feita, a fazenda Caldeirão dos Jesuítas, no outro lado da Serra do Cruzeiro.
Um lugar pedregoso e aparentemente sem água, que rapidamente Zé Lourenço transformou em fazenda pujante com modo de produção cooperativa, capela, escola e, evidentemente, segurança feita por cangaceiros desgarrados e assassinos em fuga. Mas aqui é outra história.
Aguardem para a Parte 2 deste conto a seguir. O Caldeirão do Beato Zé Lourenço como foco do comunismo e sua destruição com uso até da aviação militar.
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Fonte: Capítulos da História do Nordeste, de José Bezerra Lima Irmão.
Recortes de jornais e folhetos de Cordel.
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