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domingo, 23 de setembro de 2012

PARA NÃO CONFUNDIR AS COISAS (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

PARA NÃO CONFUNDIR AS COISAS

Afirmo sempre que primeiro é preciso conhecer a realidade, sopesar a situação, entender seu contexto, para depois se intrometer sem correr o risco de agir imprudentemente, de falar besteira, perdendo uma ideal oportunidade de ficar calado. E tudo para não confundir as coisas.

Verdade é que pensam que porque um parente meu tem emprego na prefeitura, é comissionado por lá, recebe sem fazer nada ou simplesmente exerce a deplorável função de bajulador, de descarado baba-ovo, de adulador sem-vergonha, tenho que, por reconhecimento e agradecimento familiar, também me tornar um safado.


Ledíssimo engano. Cada um responde na medida do que faz, cada um é agraciado com o que merecer, cada um é dono de seu nariz e de seus atos. Ora, se é submisso, arrasta-se aos pés pelo emprego, pelo que recebe na moita ou possui apenas expectativa de arranjar qualquer coisa, então que vá - sozinho ou junto com pai, mãe e irmãos - pedir voto, bater palmas, segurar bandeira. É grave erro pensar que todos da família têm de agir da mesma forma, que todos têm de abençoar a safadeza.

Seria um absurdo querer tapar o sol com a peneira diante do inegável. Se o candidato é imprestável, claramente não possui capacidade de administrar, é o pior entre todos, seria um aberração de repente pretender transformá-lo no melhor do mundo, no mais confiável e trabalhador, e somente porque um parente meu faz parte do seu metiê.

Ademais, se o parente vende a alma ao diabo em busca de proveito atual ou futuro, isso é problema só e apenas dele. E ninguém venha querer insinuar que uma família inteira deve votar num candidato somente porque um e outro tiram proveito com a candidatura. Ao querer vincular a família, seria o mesmo que querer desonrar a todos em defesa de uma desonra maior ainda.

Citando exemplos. O proveito que um parente tira bajulando um candidato não se estende a outros parentes; o que um ganha defendendo a candidatura não é estendido nem repartido com os demais; aquele que ganha, seja lá quanto for, bota no bolso e pronto, nem pensa nos outros. O que recebe é por mérito ou desonra sua. Então por que os outros familiares têm de apoiar o candidato do parente?

Ora, quem tiver seu nome sujo que limpe, quem rasgou sua roupa que costure, quem comprou fiado que pague. Ninguém venha nesse momento falar em solidariedade, compartilhamento ou união familiar porque inegavelmente isso não existe. Quando querem esculhambar, ferir, macular, nem lembram que são parentes. E muitas vezes são os primeiros a alardear inverdades e a chegar com quatro pedras na mão.

Tem gente que se diz de família, porém só lembra que existe parente nessa hora. E tal lembrança chega de maneira totalmente contraditória. Se o dito parente, mesmo enxergando a imprestabilidade do candidato escolhido, se predispõe a alardear qualidades inexistentes, dizendo que é o melhor, é o máximo, então receberá mimos e abraços. Mas se fala na cara que sua honra e o seu caráter não permitem sentir a podridão e dizer que é perfume, então será xingado, achincalhado, transformado num verme.

Mas talvez alguns aspectos expliquem porque agem assim. Certamente não sabem que o indivíduo é um ser único em si mesmo e caracterizado por fatores fundamentais que o predispõe a ser reconhecido socialmente: honra, caráter, integridade, ser livre para pensar e agir, procurar sempre preservar-se diante dos chamados desonrosos do mundo. Se não for assim logo será transformado num alienado, num submisso, num escravo do novo tempo.


Quando alguém diz que vou seguir por aquela estrada porque sei o que encontrarei adiante, deverá sempre ser respeitado nessa decisão. O caminho do homem quem faz é ele próprio, a cada dia constrói sua condição cidadã e se firma com o reconhecimento que merecer. Mas basta um ato, um só, para que se transforme num asqueroso ser. Basta que deixe de fazer o que achar correto para seguir pelo lamaçal, puxado pelo braço do familiar que já anda de botas longas.

É aquela velha história. Para salvar alguém, o indivíduo pula na água sem saber nadar. Depois que o outro está salvo simplesmente vira as costas e segue adiante. Nem olha pra trás para ver o outro se afogando.

(*)Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com



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