Por Rangel Alves
da Costa*
Igualmente a
pessoas e outros seres, a casa também possui olhos. E os olhos de um lar, seja
tapera ou mansão, estão nas portas, janelas, frestas e por todo lugar de onde
se aviste lá dentro e permita enxergar o mundo adiante.
Através dos
olhos da casa, ou seja, de suas portas, janelas e frestas, o mundo é conhecido
e reconhecido, a vida possui passagem, tudo é possível acontecer. Uma casa
totalmente fechada é como a cegueira impondo o desconhecimento de tudo.
Logo se tem
que as portas não significam apenas lugar de entrada e saída, local que se
permite avistar se a casa está fechada ou aberta. O significado é muito maior,
principalmente considerando-se que por ali transita toda a vida, demonstra a
fluência de pessoas, torna possível reconhecer aspectos como o abandono e a
solidão.
Uma porta
trancada são olhos fechados. Haverá adormecimento, morte ou simplesmente uma
situação passageira? Provoca dúvida, sensação de incerteza, temor. Lá dentro
poderá existir alguém, mas também pode estar cerrada porque o lar foi abandonado,
não mais existe ninguém naquele lugar.
Uma porta
fechada causa tristeza e sofrimento. Quando os olhos da casa estão trancados, o
viajante que passa adiante ou o visitante ávido para bater na madeira, logo se
toma de aflição e angústia. Bem que ela fosse reaberta para um gole d’água,
para receber o visitante, para dizer que há vida pulsando ali.
Uma porta
aberta são olhos refletindo a vida, sinais de que há presença humana e talvez
uma acolhida. Mas apenas entreaberta ou deixando entrever que não permanece
fechada, pois do contrário permanecerá a mesma incerteza de quando mantida
fechada por muito tempo.
Contudo, uma
porta totalmente desfraldada ao sabor do vento pode ter muitas significações.
Os moradores resolveram deixar que as luzes do dia iluminem suas dependências,
a ventania traga ares novos ao ambiente, ou porque se está esperando a visita
de alguém. Mas também possa ser que esteja assim porque abandonada, aberta pela
força do vento, entregue à ação de qualquer um que deseje nela entrar.
Nada mais
triste que avistar uma casa abandonada, com portas e janelas abertas, entregues
ao sabor da ventania, sentindo que lá dentro permanecem resquícios de vida, uma
história familiar que não mais pode ser encontrada. Apenas folhagens mortas
invadindo tudo, a poeira envelhecendo ainda mais o já tão antigo, talvez
fantasmas adormecidos ao relento.
O mesmo ocorre
com as janelas de uma casa, só que representando o lado sentimental da moradia.
Com moradores, a janela representa o primeiro contato com o mundo ao redor, o
local de conversas ligeiras, o lugar apropriado para se posicionar no limite
entre o externo e o interno, o que está adiante e dentro de casa.
É na janela
que a mocinha se debruça ao entardecer para sonhar com seu príncipe encantado,
chorar suas mágoas, sentir saudades, tentar enxergar o mundo que faça bem
melhor ao seu coração. Também pelas frestas, apenas avistando o canteiro
adiante, chora lágrimas de dor e sofrimento.
A janela logo
diz da vida ou da morte de uma casa. Dificilmente ela permanece fechada por
muito tempo. Ademais, por detrás de sua madeira, em cada cantinho que possa
passar o olhar, alguém pode estar nas sombras do quarto ou da sala. E de vez em
quando apenas um lado é aberto e um rosto entristecido aparece. Que tristeza
danada.
Contudo, se a
janela é avistada sempre aberta, balançado de lado a outro, sem que olhos ou
vultos apareçam pelo lado de dentro, será certeza de abandono. Talvez o vento
prefira a janela para anunciar que ali pode fazer a festa da solidão, da
angústia, do vazio que ainda ecoa lamentos. E furiosamente vai entrando para
abraçar os sonhos ainda existentes e murmurar seu grito de sofrimento.
E assim também
nas frestas das portas, janelas, telhados, paredes. Tantas vezes o sol bate e
encontra uma face querendo avistar um mundo. Tantas outras vezes apenas bate,
porém sem mais ninguém encontrar. Apenas o silêncio e a solidão.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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