Por Sálvio Siqueira
O chefe
cangaceiro Lampião, Virgolino Ferreira da Silva, dentre todos os chefes de
bandos cangaceiros foi o que mais demorou vivo e no comando. Outros morreram
com mais idade, porém, sem terem as rédeas da chefia nas mãos, ou deixaram o
cangaço e foram viver anonimamente em outra região do País, foram presos ou
entregaram-se.
É considerado
pelos pesquisadores/historiadores como o chefe cangaceiro de maior longevidade
em ação, alcançada na saga do Cangaço. Foram quase vinte anos perambulando
pelos sertões de sete Estados da Região Nordeste do Brasil, tendo em seus
calcanhares a Força Pública destes Estados, mais os contratados e os
voluntários que ingressaram engrossando o contingente das tropas. Tropas essas
que foram chamadas de “Volantes”.
Não era que o chefe cangaceiro se ‘envurtava’, se virava num ‘tôco preto’ ou outras coisas do gênero que o folclore sertanejo criou. Fora a astúcia, o estratagema, elaborado e colocado em prática que fez com que ele perdurasse tanto em seu reinado funesto. Lampião cria uma malha de colaboradores, tanto extensa em sua base, horizontalmente, como no sentido vertical, ou seja, entre as camadas sociais. E isso é o que faz, colabora, para que seu comando desse tão certo.
Em determinada
época, já tendo transposto as águas do “Velho Chico”, e fixando-se no Raso da
Catarina, a coisa fica tão ativa que o chefe mor do cangaço manda fazer
pequenos folhetos com sua imagem e em seu verso, escritos o ‘salvo conduto’, os
famosos ‘santinhos’, para aqueles que os possuíam, terem passagem livre nas
estradas dos sertões estorricado.
Frente
do Salvo-conduto entregue por Lampião ao
Coronel Joaquim Rezende
Coronel Joaquim Rezende
“Esses
‘santinhos”, tanto era portado por pequenos agricultores como por fazendeiros e
autoridades das várias cidades onde tinham seus colaboradores. Se por um acaso
uma pessoa vagasse por uma estrada qualquer e fosse parada pelos cangaceiros do
seu grupo particular, ou do seu bando, de algum dos subgrupos, mostrava o
‘passaporte’ e seguia em paz. Porém, se essa mesma pessoa fosse parada por uma
volante e algum dos membros da mesma descobrisse o mesmo, o cacete comia solto.
Poderia ser presa ou mesma morta por isso. Por outro lado, se um viajante não
portasse o ‘passaporte’ e fosse pego pelos ‘cabras de Lampião’, a coisa não
seria boa para o lado dele. A coisa estava mais ou menos assim: ou estava com
ele ou estava contra ele.
Citaremos como
exemplo, um grande ‘amigo’ de Lampião, homem de posses e politicamente gozava
de uma posição estável, alvo e preza dentro dos parâmetros determinado pelo
“Rei dos Cangaceiro”. Lampião nunca quis, nem poderia ser de outro jeito, intrigas
com grandes fazendeiros, pessoas influentes e autoridades. Pelo contrário,
tentava isso sim, as suas ‘amizades’ e participações monetária e de apoio
sustentável. Pois bem, esse político influente era o ‘coronel’ Joaquim Rezende,
que também era comerciante na cidade de Pão de Açúcar.
Verso
do Salvo-conduto, com os seguintes dizeres:
"Au Amo Joaquim Rezendis, como prova di amizadi e garantia perante os Cangaceiro.
Offereci C. Lampião."
"Au Amo Joaquim Rezendis, como prova di amizadi e garantia perante os Cangaceiro.
Offereci C. Lampião."
Rezende fora,
certa vez, ‘intimado’ por Lampião a mandar-lhe a quantia de quatro contos de
réis. Concordando em pagar-lhe o pedido, Joaquim envia pelo mesmo portador o
recado que lhe pagaria, porém, pretendia entregar-lhe diretamente a soma
pedida.
Dias após
receber o ‘contra - recado’, Lampião envia ao coronel um novo bilhete marcando
dia, hora e local do encontro.
“(...)Três
dias depois Lampião mandou-me outro bilhete do seu próprio punho, dizendo-me
que me esperava às 10 horas da noite na fazenda Floresta, município de Porto da
Folha, em Sergipe, recomendando-me que fosse até ali, mas não deixasse de levar
o dinheiro. Não obstante os naturais receios que tive, à hora aprazada cheguei
ao local do encontro, onde permaneci até uma hora da manhã, quando surgiu um
cangaceiro que, ao ver-me, perguntou-me se eu era o moço que desejava falar ao
capitão. Respondi que sim. Dentro de poucos minutos, então, o Rei do Cangaço
ali se apresentava acompanhado de quatro homens, “Juriti”, “Zabelê”,
“Passarinho” e "Nevoeiro". Ao ver o grupo aproximar-se, identifiquei
logo Virgulino e a ele me dirigi, cumprimentando-o. O famoso bandoleiro, ao
contrário do que eu esperava, recebeu-me amavelmente e foi logo perguntando
sobre o que lhe havia levado. Sabendo que o Rei do Cangaço gostava de beber,
eu, que levava comigo três litros de conhaque, lhos ofereci (...).”
(“Bandoleiros das Catingas” – ROCHA, Melchiades da. 1942)
A partir daí,
Rezende recebe seu ‘passe’ para perambular pelos carrascais do sertão sem ser
incomodado por cangaceiros.
Lampião muitas vezes fazia um ‘cerco’ planejado aos grandes fazendeiros. Ameaçava-os e soltava pela região de que iria atacar e maltratar, ou mesmo matar, determinada pessoa. “Amigos” eram escolhidos para que se fizesse um pacto. Com isso o chefe ganhava mais um colaborador, meio que no apulso, mas, ganhava.
Após alguém
colaborar, ficava muito difícil explicar para as autoridades, caso descoberto,
o porquê e como fora obrigado a ser colaborador. Muitas vezes, tinham que
colaborar, também, com os comandantes das volantes para ficarem em paz.
Muito astuto, após conseguir seu principal intento que era a colaboração e amizade do fazendeiro, Lampião podia mesmo esquecer, ou dizer que esquecia, a quantia pedida, porém, isso o levava a ganhar muito mais.
“(...)
Encarando-me com olhar firme, Lampião me disse em tom natural: “Concordo em que
o senhor beba primeiro, mas não é por suspeita e sim porque o senhor é um moço
decente e eu sou apenas um cangaceiro”. Tomamos, então, o conhaque e, em
seguida, abordei o Rei do Cangaço sobre o dinheiro que ele me havia pedido.
Como resposta, disse-me ele:
"- O senhor dá o que quiser, pois eu dou mais por um amigo do que pelo dinheiro”.
Esse fato — disse o conceituado comerciante de Pão de Açúcar — teve lugar no mês de agosto de 1935, e a minha palestra com Lampião durou três horas, tendo ele me falado de vários assuntos, entre os quais o relativo à perseguição de que era (...).” (O. C.)
Coronel
Joaquim Rezende, mais um grande colaborador que fez parte da enorme ‘malha’
construída por Lampião... nos domínios do seu vasto reinado.
Fonte/foto Lampiãoaceso.com
Fonte: facebook
Página: Sálvio Siqueira
Grupo: OFÍCIO DAS ESPINGARDAS
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