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segunda-feira, 2 de novembro de 2015

“O VINGADOR DAS ALAGOAS”

Por Sálvio Siqueira

"Um cangaço pós-lampiônico repontará nos anos 50 e 60, em grupos reduzidos, a exemplo de Floro Gomes Novaes, o capitão Floro da ribeira do Ipanema, com cinco homens, entre Alagoas e Pernambuco. Da esquerda, Valderedo Ferreira (lugar-tenente), o chefe Floro e Faísca c.1962. Cortesia de Valdir Oliveira, Recife, Pernambuco."
http://valdiroliveirasantos.blogspot.com.br

Uma das mais conhecidas, e antigas, profissões do mundo é a de marchante. É aquele profissional que retalha a carne e as vende em porções pelo peso.

Na cidade de Capelinha, nas Alagoas, morava um cidadão que era marchante. Era o Sr. Ulisses Gomes Novaes. Foi assassinado por inimigos e com isso, os autores criaram um grande, sangrento e ferrenho inimigo.

O Sr. Ulisses tinha um filho que se chamava Floro Gomes Novaes, o qual ficou na História sangrenta alagoana como Floro Novaes, “O Vingador das Alagoas”.

Segundo várias literaturas, matérias em blogs e sites, Floro relata: “- Não esqueço o dia em que encontrei o cadáver de meu pai estendido numa estrada. Vi a lama formada pelo sangue misturar-se a pedaços de couro cabeludo e à carne branca e espumosa do seu crânio esfacelada a coronhadas de rifle”. (http://www.anchietagueiros.com).

Após tão horrorosa cena vista por um filho, o resultado foi catastrófico, no sentido humano/vingativo, na consciência de um de jovem de 18 anos. A violência, praticada em seu genitor, gerou outra violência, a partir de então, na mente e ações daquele moço.

- “Pelo sangue daquele que era meu sangue, o sangue dos que lhe tiraram sangue”(site ct), ao dizer essa frase, Floro parte para a matança. Mata sem dó nem piedade.

Apesar de muitos o consideraram “Cangaceiro”, quando vemos suas estripulias, sabemos que há enorme ‘fosso’ que o separa de tal. Primeiro pela época em que iniciou seu ‘ciclo’ de matador, muito além do término do fenômeno cangaço, que, oficialmente, acaba-se em 25/26 de maio de 1940 com a morte de Crhistino Gomes, outrora o cangaceiro ‘Corisco’. Depois, pela maneira comportamental do pistoleiro. Os cangaceiros foram nômades, ele, Floro, mesmo depois de estar na fase de ação, fixa residência na zona rural de Águas Bela, PE.
                                             
Na Fazenda Mamoeiro, no citado município, criava pequeno rebanho de caprinos, algumas cabeças de gado e era um dos maiores produtores de feijão ‘daquelas bandas’.

No período carnavalesco do ano de 1971, Floro, tenta combinar, com amigos da região em que morava fazerem uma caçada de veado na quarta-feira de cinzas, nas terras da Fazenda Riacho do Mel, no município de Águas Belas, PE. Tendo o amigo Mané Miúdo aceito, avisa que, junto a ele, iriam dois irmãos, Wilson e Américo, filhos do Sr. João Lins, cidadão bastante conhecido nas redondezas e de inteira confiança.

A fazenda Riacho do Mel fica perto das terras de Floro, Fazenda Mamoeiro, e do sítio Passagem.

A seguir, transcrevo do livro "A morte de Floro Gomes Novaes e o aniversário da Sudene", de Reginaldo Heráclio, como aconteceu a ‘tocaia’, segundo o conteúdo literário, que pós fim a vida de Floro:

“(...) Na manhã do dia combinado, Floro mandou selar a burra, enquanto limpava a espingarda calibre 12. Revisou os cartuchos, colocando 14 no aió(bolsa que o sertanejo usa para caçar) e dois nos canos.

Calçou botinas, dirigiu-se para o curral e reclamou da demora do ajudante.

Foto meramente ilustrativa - www.ebc.com.br

O bonito animal peidava, soltava coices, numa demonstração de que não estava para ser montado naquele dia.

- Sai daí fi da peste, deixa que eu selo.

Com trabalho e açoites o animal deixou o dono lhe preparar.

Floro passou a perna, juntou esporas no vazio, deu duas riscadas levantando poeira no terreiro.

D. Neném na porta de casa voltou a fazer o pedido do café;

- Fuloro, meu coração tá pedindo pra tu num ir. Num vá não meu fi!

- Besteira véia. Pru causa desse agôro a burra já tá cheia de pantim. 

Disse, apanhando a espingarda encostada na parede da casa.

Neste momento vai chegando Wilson. Vinha saber da demora:

- Seu Fuloro! O pessoá já tá lá no Riacho do Mé, isperando pelo sinhô. Me pidiro pra vim sabê se o sinhô ainda vai?

Foto meramente ilustrativa - www.diariodovale.com.br

Floro entregou a 12 ao rapaz:

- Vambora. Vai levando a ispingarda.

Ajeitou o chapéu de Sumé, presente de Sebastião Trovão administrador da Fazenda Carié, tocando montaria.

Viraram à direita ao atingirem a estrada Boqueirão-Águas Belas. Logo adiante dobraram novamente no mesmo sentido, pegaram a que segue para o Riacho do Mel.

Manhã bonita. Um concris saboreava flor vermelha do cardeiro. A bem-te-vi no topo de uma braúna soltava seus tristes vidas. O orvalho em folhas, absorvido pelos raios do astro-rei. Andaram um quilômetro.

Por trás de moitas de sacatinga, Jurandir de espingarda 20 e Alfredo de mosquetão. Revólveres 38 e respectivas facas à cinta. Moitas praticamente isoladas em campo aberto.

Floro nunca imaginou naquele descampado, lado esquerdo da estrada, dois homens escondidos e um objetivo.

Continuou a conversa com Wilson Lins. Versava sobre outras caçadas. Passagens pitorescas.

No passar em frente do piquete, o primeiro tiro. Jurandir endereçou-o ao ouvido esquerdo de Floro. Passou de raspão na testa, perfurando a aba do chapéu.

No estampido, Floro gritou:

- Solta a ispingarda e corre, senão tu morre, fi da peste!!!

Wilson o fez. Disparou na montaria. A burra empinou.

A parada propiciou Alfredo acionar o mosquetão. O balaço entrou à altura da costela mindinha. Saiu abaixo do peito direito, queimando o músculo do braço.

Floro caiu de tórax perfurado. Arrastou-se rapidamente apanhando a espingarda. Mirou as moitas e fez fogo. O esconderijo foi podado pelos caroços de chumbo da possante. No interior só os gravetos.

A dupla correu caatinga à dentro pelo mesmo lado esquerdo, após o segundo disparo. Atravessou a estrada na frente, pegando o lado direito.

8:30 horas. A dor asfixiando-lhe o peito. O ódio lhe mantendo de pé.

Disparou outro cartucho por cima de um repuxo de cerca em direção à capoeira. Outra tentativa vã.

Correr, não podia. Começou a insultar:

- Vem pra cá amarelo safado, pra gente morrê trocando tiro. E tome tiro.

Ficou brigando e falando, sozinho.

A burra havia fugido. Começou a caminhada de volta. Sacrificado, atravessou a cerca para atalhar caminho. Agarrando em tudo que servisse de apoio. Encurtava distâncias.

Dor e raiva aumentando, parava. Recarregava a arma e insultos:

- Corre fi da peste. Tu num é home mesmo. Corno safado!!!

Mais um tiro a esmo.

Os agressores já haviam chegado à umburana, onde deixaram seus aiós e o supérfluo. Lastimava Jurandir, apreensivo:

- O sirviço foi má feito. Perdemo a caçada.

- Pió é qui ele tá vivo e viu a gente. Completou Alfredo.

Na realidade, a umburana estava na rota do ferido. Todos convergiram num só ponto, após o atentado. Um devagar, os velocistas com tempo suficiente para alguns goles. Serenar nervos na fuga.

A cachaça passou queimando gargantas. O esforço contribuiu.

Na partida, o barulho. Garranchos quebrados, resmungos de ira.

- Óia quem vem ali. Disse em voz baixa Jurandir.

- É o home de novo. Completou.

Abaixaram-se, apontando armas.

A dor retira reflexos. Disparos quase simultâneos. O tiro de mosquetão atingiu o encontro da perna direita, partindo-a. O de espingarda, peito esquerdo. Cravou cinco rolimãs abaixo da clavícula, junto ao coração. Floro deu um pulo. Urrou igual fera atingida de surpresa. No cair, acionou o gatilho a copa da umburana.

Correram. Jurandir parou adiante:

- Vou pegá-lo de revólver.

- Num vá não, qui você num sabe cum quem mexeu. Advertiu Alfredo.

Nesse instante ouviram o berro:

- Tu me paga, fi da peste!

Pique final. Ferido mortalmente, não recarregou a arma, nem disparou mais. Restava cheio um cartucho. Talvez por precaução encostou no tronco de uma catingueira, arriando. Espingarda em punho. Descartar-se da bota da perna ferida cutucando-lhe o calcanhar com o bico da outra, o último esforço.

Tu me paga!!! Última fala.

D. Neném estava com a razão. Vários avisos aconteceram: a montaria; a coincidência de rotas; os resmungos. Todos negativos. Fatais.

Muita gente ouviu tiros. Na caatinga não desperta curiosidades muita coisa. Ninguém se atreveu investigar.

Wilson chegou a galope. Américo e Mané Miúdo uníssonos, perguntaram:

- Cadê Fuloro?

- Eu vinha cum ele e deram uns tiros na gente. Perto de Casa. Ele mandô soltá a ispingarda e corrê! É o que sei dizê!

Em direção ao local do tiroteio, acorreram. Distava uma légua. Resfolegantes, não encontraram nada.

Mané Miudo tomou iniciativa:

- Amériqui, vai na casa de Fuloro avisá a D. Neném:

- Num mi diga uma coisa dessa não meu fi. Pru Nossa Sinhora!!!

Iniciou a busca. À tarde choveu forte. A busca parou. A noite cobriu de manto escuro todo sertão em notícia. Comentários.

Uns achavam que Floro havia saído na trilha dos agressores; outros que estava morto de corpo escondido. Não havia sinais de sangue. Dúvida nas duas versões. Encontro com a polícia alagoana e prisão, outra hipótese levantada.

A chuva cessou pela madrugada. Estiou.

Ao amanhecer da quinta-feira, o mais sensato: todo mundo espalhado no mato, procurando uma pista, um vestígio, o homem.

O orvalho retido no verde molhava vestimentas.

Às onze horas, José Lins, primo de Wilson, avistou Floro sentado, espingarda no colo, olhos arregalados, rindo por ser cangulo:

- O home tá vivo!!! Gritou para o companheiro de procura.

- Adonde?

- Ali. Tá ferido, mai tá vivo.

Num tôvendo sangue. Vamo cum cuidado, que ele pode pensá qui nós e o pessuá qui imboscou ele e passa fogo na gente. Advertiu José Lins.

Chegaram perto e notaram a inércia, era cadáver(...)”.

http://oficiodasespingardas.blogspot.com.br/

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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