Por José
Romero Araújo Cardoso
O ato de pechinchar, regatear, haggling, em inglês, tornou-se condição sine qua
non do próprio processo de interação que rege as relações humanas que
caracterizam as feiras livres espalhadas por todas as partes do planeta.
O ato de fixar de forma intransigente o preço das mercadorias, como nos
circuitos superiores, inexiste literalmente, pois discutir a melhor forma de
pagamento é algo presente e necessário nos espaços de comercialização das
feiras livres.
Comerciantes e fregueses discutem, na maioria das vezes de forma harmoniosa,
como as mercadorias expostas devem ser adquiridas e quais os preços mais
atraentes para ambas as partes.
A relação de amizade entre agentes econômicos, entre atores sociais, em uma
feira livre, tangencia-se com a familiaridade, pois, frequentemente, há toda
uma história envolvendo as partes, a qual, marcada, no geral, pela afetividade,
não raro tratam-se por apelidos ou formas bem próximas do emocional, da própria
subjetividade que aproxima as pessoas.
Ao contrário da rigidez burocrática verificada em grades estabelecimentos
destinados ao abastecimento da população, verifica-se nas feiras livres
democrática interação da comunidade, com a vida social sendo dinamizada de
forma extraordinária.
Os feirantes, em geral, são bem informados de tudo que acontece, aproveitando
para colocar a conversa em dia com seus fregueses no ensejo do regateamento dos
preços das mercadorias que disponibiliza para compra.
Por esse motivo, regatear torna-se ato indispensável em feiras livres, pois
consiste em fundamento à própria dinâmica das informações pertinentes à vida em
sociedade. Notícias de namoros, de ganhos ou perdas, do estado de saúde dos
membros da comunidade, das razões por que determinadas pessoas não estão
frequentando as feiras, etc., passam necessariamente pelo processo interativo
comerciante-freguês em feiras livres.
Há exageros em discursos inflamados quando a dinâmica da concretização do
processo de globalização torna-se mais efetiva a cada momento, pois havia a
perspectiva de que as feiras livres, enquanto símbolos dos circuitos
inferiores, fossem evacuadas ou minimizadas em importância em prol das
facilidades contidas em grandes estabelecimentos comerciais que são uma das
representações da atual fase do modo de produção capitalista.
As feiras livres persistem e resistem, tendo em vista que personificam o modus
vivendi de populações espalhadas pelo globo em seu afã de tornar concreta a
indispensável interação enquanto sinônimo da necessária vida em sociedade.
José Romero
Araújo Cardoso. Geógrafo. Escritor. Professor-Adjunto IV do Departamento
de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em Geografia e Gestão Territorial e
em Organização de Arquivos. Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Sócio da
Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC) e do Instituto Cultural do
Oeste Potiguar (ICOP).
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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