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sábado, 22 de outubro de 2016

MORTE DE UM RASTEJADOR NAS MARGENS DO “VELHO CHICO”

José Osório Farias, o tenente Zé Rufino

O rastejador, homem que rasteja os rastros deixados pelos animais que eram suas caças nas terras desérticas e áridas do sertão nordestino, foi, em determinado momento, ‘inserido’ para fazer parte das volantes perseguidoras de cangaceiros nas matas da caatinga.

Quando temos uma primeira visão do rastejador, não damos o valor que merece na grande luta das Forças Públicas contra a guerra de movimentos implantada pelos cangaceiros. 

Os perseguidos, com astúcia, sabedoria e desenvolvimento, ao mudarem de lugar, procuravam ‘mexer’ o menos possível no natural existente. Procuravam não quebrar galhos de plantas nas trilhas que seguiam, não deixarem um pedaço de pano, de papel, ponta de cigarro de palha, não virarem as pedras onde pisavam, etc.. Além de sempre caminharem em fila indiana, e o último homem ter por obrigação apagar possíveis marcas deixadas pelos que passavam primeiro.

Foto da volante do tenente Zé Rufino colorizada digitalmente pelo professor Rubens Antonio

O rastejador, acostumado a perseguir uma caça, por exemplo, um veado catingueiro, uma onça ou outro animal na mata, tem um domínio que as outras pessoas não. Ele, ver no solo coisas, marcas, que lhes contam se o animal foi para a direita ou esquerda de onde se encontra, ou mesmo se seguiu para o Norte ou para o Sul. E foram essas qualidades natas, naturais, que os grandes comandantes das volantes, na época do cangaço, usaram para perseguirem os grupos de cangaceiros através do Rastejador.

Com essa nova ajuda, esse importantíssimo trabalho, mostrando caminhos antes não notados, os soldados começam a apertar o cerco aos grupos dos fora-da-lei, cada vez mais e com maior frequência.

Lampião, então ver, em seu sangrento caminho, surgir um problema sério que poderia acabar com todos os seus planos, o Rastejador. A partir daí, tem ele como um dos seus piores inimigos. Todas as vezes que conseguiu capturar algum, sempre ceifou sua vida com grande requinte de crueldade, para desencorajar os outros que faziam parte das outras volantes.

Volante do tenente João Bezerra com as cabeças de três cangaceiros

Naquele tempo, os homens eram resistente feito aço, pois a própria vida os fazia, forjava, dessa forma. Quando um ‘jurava’ outro, o outro, para ver-se livre do juramento, ou saia do lugar e ia armar sua tenda em outra localidade, ou resolvia o caso com o mesmo.

O pernambucano José Osório Farias, conhecido nas hastes cangaceiras como Zé Rufino, fora um dos comandantes de volantes que mais perseguiu cangaceiros. Tendo em seu Curriculum ser o maior dos matadores de cangaceiros. Ele entrou para Força Pública do Estado da Bahia em 2 de janeiro de 1934. De imediato passou a fazer parte da FONE - Forças em Operações no Nordeste – justamente para dar combate aos grupos de cangaceiros.


Zé Rufino era compadre e amigo de um rastejador chamado Cornélio. Cornélio era natural do Juá, município de Paulo Afonso, BA, morando, na ocasião, em Serra Negra, no Estado baiano, e teve como professor de rastejar, o afamado rastejador Gervásio, que prestava seus serviços na volante do comandante pernambucano José Osório. Zé Rufino, sabedor dos serviços de Cornélio, o convida para trabalhar na volante comandada pelo tenente João Bezerra, que também era pernambucano, mas, prestava seus serviços para a Força Pública alagoana, fixado na cidade de Piranhas, AL.

Cornélio era um bom rastejador, prestando sempre sérios serviços. Teve grande participação quando da batalha entre a coluna do tenente Bezerra e um grupo de cangaceiros, onde foram abatidos os cangaceiros Serra Branca, sua companheira Eleonora e Ameaça, no riacho dos Patos, no município de Iapi, nas Alagoas.

Cabeças dos cangaceiros "Serra Branca", sua companheira "Eleonora" e "Ameaça"

O rastejador, compadre do tenente Zé Rufino, tinha um grande defeito que era o de beber além da conta, e abrir ‘imbuança’, brigar, discutir, com muitas pessoas. Como nunca falta gente fuxiqueira, alguns vão e comunicam ao seu comandante, que de imediato o expulsa da polícia. O rastejador, revoltado, continua na bebedeira e deixa escapar que só iria embora da cidade, Piranhas, quando desse cabo do tenente. Um amigo dele, Zé Gomes, chama-o a parte e diz que ele acabe com aquela conversa e que vá embora para sua cidade. Zé Gomes conhecia o pessoal e sabia que diriam, também, essa ameaça ao tenente João Bezerra.

“(...) Zé Gomes era um dos poucos amigos de Cornélio, e depois que ouviu o desabafo do companheiro, sabia que o tenente seria sabedor da jura que ele havia feito. Zé Gomes desconfiado de que algo de mal pudesse acontecer, aconselhou o amigo Cornélio para que o mesmo voltasse o mais rápido possível para Serra Negra (...).” (“LAMPIÃO EM PAULO AFONSO – LIMA, João De Sousa. 2ª edição. Paulo Afonso, BA. 2013).

Ao saber das ameaças que fizera o rastejador, o tenente Bezerra chama dois de seus soldados, Zé Baixinho e Marreca, comunica-lhes o fato e determina que eles deem um jeito na ‘situação’.

“(...) Cometeu aí seu maior erro, pois desconhecia uma das maiores pragas que persegue o homem desde a sua criação: A traição. O tenente João Bezerra já havia arquitetado, junto com os soldados Zé Baixinho e Marreca a sua cruel estratégia (...)”. (Ob. Ct.)

O tempo passa e Cornélio continua na cidade de Piranhas. Chegam às festividades juninas e, na noite de São João, Zé Baixinho e Marreca, chamam o rastejador para entornarem ‘umas lapadas’, doses, de aguardente. Ora, era o mesmo que oferecer banana a macaco. Cornélio topa na hora e começam a beber. Lá para as tantas, Cornélio já embriagado, caminha com seus dois ‘amigos’ na direção do rio. Chegando próxima à margem do “Velho Chico”, Marreca se atrasa um pouco, saca de uma arma e executa, com um tiro na nuca, o rastejador Cornélio, deixando seu corpo ali, sem vida.

O tenente Zé Rufino ao saber que seu compadre fora expulso da Força Pública, parte de Canindé do São Francisco, SE, com a intenção de leva-lo para casa e, ao chegar ao momento de fazer a travessia nas águas do rio, recebe a notícia do assassinato de Cornélio por um canoeiro.

“(...) Zé Rufino sabendo da expulsão do amigo veio de Canindé para busca-lo e quando chegou próximo a margem do rio para atravessá-lo, o conhecido canoeiro Pedro Bengo deu-lhe a notícia da morte de Cornélio. Zé Rufino parecia não acreditar e assim que chegou em Piranhas Zé Gomes contou que os autores do crime tinham sido Zé Baixinho e Marreca (...).” (Ob. Ct.).

O tenente Zé Rufino, após ouvir o relato de Zé Gomes, segue direto para casa do tenente João Bezerra. Lá chegando, acompanhado de Zé Gomes, para conversar com o tenente João Bezerra, notam que o soldado Marreca estava presente. Zé Gomes apontando para Marreca, o acusa de ser um dos assassinos do rastejador Cornélio. Zé Rufino diz saber de tudo e de que não havia necessidade de terem matado seu compadre. João Bezerra diz a Zé Rufino que nada tem a ver com a morte do Rastejador... Nas margens do rio São Francisco.

Fonte “LAMPIÃO EM PAULO AFONSO – LIMA, João De Sousa. 2ª edição. Paulo Afonso, BA. 2013


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