Por Valdir Nogueira
2º tenente da Força Pública do Estado de Pernambuco, Optato Gueiros, temível caçador de cangaceiros, alcunha que recebeu por ter combatido de modo valoroso os bandos do cangaço, por sua rígida fama, após a hecatombe de outubro de 1922, que ceifou a vida do coronel Luiz Gonzaga Gomes Ferraz, foi nomeado delegado de Belmonte por ato do governo do Estado no dia 18 de julho de 1923.
Em suas incursões de trabalho, no combate ao banditismo, pelas veredas tidas como perigosas no solo belmontense, um diálogo seu com um morador da Serra do Catolé transformou-se em curioso relato do livro das suas memórias do tempo do cangaço intitulado: “Lampião – Memórias de um oficial ex-comandante de forças volantes”.
Eis um trecho do diálogo:
“Pelo fim do ano de 1922, o major Teófanes Ferraz Torres, em um encontro na Serra das Panelas, feriu Lampião no pé esquerdo. Ai foram mortos Cícero Costa e Lavandeira.
Nesse encontro, foi o grupo completamente destroçado. Lampião não pode fugir e, escondido por baixo de uma espessa moita, esteve para se entregar algumas vezes. Dele, se aproximavam soldados de vez em quando, a ponto de, se avançassem mais uns cinco metros, o encontrariam estendido com um pé esmigalhado por uma bala.
Mais de um ano depois desses acontecimentos conquistei a amizade e confiança do velho João Menezes, da encosta da Serra do Catolé, que me revelou o seguinte:
- O senhor sabe; quem mora, como eu, num ermo deste, tem que fazer o que não quer, pra poder passar. O senhor está vendo aquela pedra grande na ponta da serra? Disse o velho.
- Sim estou vendo, respondi.
- Pois bem, continuou, por traz daquela pedra, pelo lado esquerdo, há um “sucavão”, que comporta vinte homens. É uma furna de onça. Ali passou Lampião quarenta dias, se tratando do balaço que arrebentou-lhe o pé. Eu não sei como aquele pé ainda emendou, pois o osso ficou um facho...”
E a conversa continuou:
“- Seu João, como vive o senhor numa solidão dessa, sendo visitado somente por tropas volantes e cangaceiros? Aduzi, ao mudar o assunto.
- Vivo muito bem, seu tenente. A minha ocupação aqui é tirar catolé e mandar vender nas feiras. As minhas andadas nunca passam desta encosta de Serra à Pedra do Reino.
- E que Pedra do Reino é esta seu João, perguntei.
- Há! ... isso é uma história comprida. Quem pode lhe contar tudo é o velho João Menino da ponta da Serra, e o major Quincas Leonel da Oiticica. Eles lhe “debulham” tim tim, por tim tim. Já os ouvi contar a homens de posição, de passagem em casa deles.
- E o senhor não gravou nada?
- A história é mais ou menos assim: Há uns sessenta anos passados, um João Antônio dos Santos, juntou na Pedra do Reino, umas quatrocentas pessoas entre homens mulheres e crianças, e botou na cabeça deles que Dom Sebastião iria surgir na Pedra do Reino, montado num cavalo branco, mas, para isso, para que o rei aparecesse logo, seria necessário matar muitas crianças e mulheres e aspergir o sangue na pedra. O povo se deixou levar pelas pregações e os pais entregavam os filhos, que eram logo sangrados em cima da pedra. E assim muitas crianças, em número elevadíssimo, e mulheres, foram mortas com a maior indiferença e sangue frio.
As forças do governo e civis armados, em número de quatrocentos, mais ou menos, atacaram o arraial sebastianista, na Pedra do Reino. Houve uma luta de um dia todo, até que, depois de muitas baixas, conseguiram tomar a Pedra do Reino e acabar com o fanatismo”.
Valdir José Nogueira de Moura,
Conselheiro Cariri Cangaço
São José de Belmonte, 08/11/2020
https://cariricangaco.blogspot.com/2020/11/serra-do-catole-gruta-de-lampiao-e.html
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