“Derna a mais
tenra idade juvenil, Virgolino já demonstrava trejeitos afeminados no andar, no
falar e no fazer das coisas. Os contemporâneos tinham medo de falar sobre sua
masculinidade, senão em raras oportunidades em conversas ao pé do ouvido,
prevenindo-se das retaliações. E muito se falou dos seus escondidos e confusos
relacionamentos desde a adolescência. Essas desordenadas e estranhas relações
foram muito criticadas, ora servindo de mangação. Essa fama foi conhecida e
falada e muito repetida a centenas de quilômetros de distancia, tantos anos
após no Poço Redondo, em Sergipe”. (...). (MORAIS, 2011, p. 251)
“Virgolino nem
tanto ou quase nada; diferentemente dos outros, gostava de se dedicar com as
meninas da escola às brincadeiras com cantigas de roda”. (...). (MORAIS, 2011,
p. 22)
(...). “Feito
rapaz, costumeiramente se exibia dançando e valsando em leves rodeios no ar
como a pluma despencada nas correntes desfiadas pelo vento ou jogada na espuma
boiando à deriva nas vagas. Gostava de cantar, recitar e dizem até ter sido
tocador de harmônica, embora disso não seja conhecido qualquer registro, nunca
dando a conhecer o seu talento musical”. (MORAIS, 2011, p. 22)
“Era ele quem
comandava as brincadeiras com sua turminha com peculiar eloquência e saber.
Escolhia e separava os pares nas danças e cantigas de roda entre tantas outras
lúdicas diversões pueris, nas cantorias, nas pastorinhas e nas encenações
teatrais. Tudo era ele e com ele. Viveu toda a sua infância na região que
tratava no pulsar carinhoso do seu coração por meu sertão sorridente. Foi um
menino criado com a avó. Vivia a andar pra cima e pra baixo com garbo e
desempeno, todo engalanado, calçando meias coloridas adornando seus pés
melindrosos nas alpercatas de rabicho, pisando macio a terá batida e as areias
das charnecas sertanejas. Seus contemporâneos, amigos e companheiros, com ares
de inveja da figura elegante, tratavam-no por almofadinha. Nos versos e nas
rimas da literatura de cordel está escrito que sua mãe, dele, sonhava por uma
menina ao nascimento do terceiro parto. Se Virgolino tivesse nascido fêmea, o
sertão seria outro”. (MORAIS, 2011, p. 23)
“Nas festas,
nas danças de rodas e nos bailes e folguedos, era ele o indicado na arrumação
dos pares de rapazes e moças, escolhendo sua dama, dado que dançava muito bem,
carregando leve e cavalheirescamente seu par pelos salões, sob os olhares dos
presentes. Chamavam-no de Pé de Valsa. Os seus amigos e companheiros,
desajeitados em finuras, recolhidos às suas humildes rudezas, isolados pela
falta de talento no agradar das moças, pela força dos justificados ciúmes,
próprios dos jovens, chamavam-no de fresco. Ciúme bobo daqueles rapazes.
Virgolino parecia ter nascido príncipe no jeito e no bom parecer. Negou fogo à
realeza, contudo”. (MORAIS, 2011, p. 24)
(...).
“Enquanto Antônio e Levino, reconhecidos como bons cavaleiros, colocados à
frente dos melhores na região, dedicavam-se diariamente aos trabalhos de
adestramento e montaria em potros e burros, dominando esse ofício com maestria,
Virgolino se dedicava com apego, saber e bom gosto, aos trabalhos com costura e
outros serviços artesanais em couro, desenvolvendo com arte essa especialidade.
O ofício de amansamento de animais trouxe justa fama aos irmãos Antônio e
Levino Ferreira. Era uma festa a exibição desses dois rapazes em montaria,
ostentando porte de um cavaleiro medieval ao montar esbelto e garboso. Embora
Virgolino vibrasse com as peripécias de seus irmãos no domínio dos animais,
dava-se ao tempo nessas festas ao convívio com as mocinhas, constantemente
cercado delas, divertindo-se alegremente, desprezando as coisas das cavalhadas,
atividade entendida como muito rude ao seu gosto, embrutecida e desprezível,
imprópria ao nascido com vocação para o trato das coisas finas. Seu negócio era
o corte e costura de roupas e arreios de couros e coisas similares, com tudo
isso se identificando. Quando por necessidade precisava montar em mulas aos
serviços da almocrevaria fazia como um nobre cavaleiro, esbanjando vaidade,
atravessando garbosamente os povoados, exibindo suas qualidades de cavaleiro.
Seus irmãos reclamavam constantemente do fato de ele montar por apenas querer
mostrar suas reverentes qualidades de formoso montador, principalmente ao
montar na mula faceira, tratada com frescura, meiguice e ternura, por “danada e
sem-vergonha”. Assim foram os primeiros lustros de vida de Virgolino até
engajar no mundo do cangaço”. (MORAIS, 2011, p. 24/25)
“Por volta de
1917, Virgolino juntou-se a Tonho Rosa, um amigo bem chegado, chegado até
demais a ponto de provocar inquietação na desconfiada Sulena, a todo instante
dirigindo um olhar atravessado àquela amizade incomum entre os rapazes machos,
no exercício do sexto sentido das mães. Estava na cara. Antônio Rosa Ventura,
ainda criança, entre os oito a dez anos de idade, foi deixado na casa dos
Ferreira por uma família de romeiros que nunca mais deu notícias nem voltou
para buscá-lo. Abandonado, sem seus pais, foi criado como ente da família,
muito apegado a Virgolino que sobranceiro dizia: “dou a ele de um tudo e tomo
de conta”. (...). (MORAIS, 2011, p. 49)
(...). “Muito
se soube que desde a mocidade, Virgolino era mestre em arrumar festas e ensaiar
bailes, arrumar casais nas danças, folguedos e outras brincadeiras da turminha
sertaneja, formando os pares de namorados, levando e trazendo recados e
mensagens amorosas. Os mensageiros de recados, figura, aliás, preciosa e muito
benquista e cultivada entre jovens namorados eram cognominados pelo apelido de
cocada ou vela. Figura típica do alcoviteiro ou alcoviteira, ou seja, o homem
ou a mulher que alcovita, catalisando o par nas relações namorosas,
permanecendo junto com o par enamorado durante horas pela noite adentro”.
(MORAIS, 2011, p. 60)
“Naqueles tempos idos, por alcoviteiro era também conhecido o lampião de querosene em que nele era introduzido um pavio de pluma de algodão retorcida, absorvendo o combustível e queimando em labareda protegida numa redoma, tornando-se uma só chama, permanecendo toda a noite acesa, iluminando perseverante o ambiente, permitindo por mais tempo a permanência de casais em namoro. E como Virgolino adorava alcovitar, permanecendo na presença de casal de namorados, passou a ser igualado a um lampião, restando-lhe este apelido. Esta versão decorre de um fato real, possível, palpável, sabido por todos os viventes desse tempo. O apelido não surgiu, portanto, de destreza bélica ou feito heroico; não nasceu de coisa de macho. Nasceu da alcovitice, do lampião”. (MORAIS, 2011, p. 60/61)
(...). “Todo o
Pajeú sabia de suas peripécias e fantasias sexuais desde a mocidade, aflorada
na liberdade com a morte dos seus pais. A viadagem de Virgolino sempre foi
propalada, muito embora a mitografia tentasse esconder sua degenerada conduta,
pela necessidade de fortalecer a construção ou transformação de um canalha em
mito, em herói, em general das caatingas. Eventuais segredos entre os
sertanejos se deveram ao medo do canalha, o mesmo não acontecendo nos centros
populosos em que uma sociedade efetiva entre dois cangaceiros poderia ao máximo
servir de chacota, de escárnio”. (MORAIS, 2011, p. 121/122).
Adendo
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Que coisa, hein! Como se escreve
tantas maldades contra o rei do cangaço, o Lampião? Quantas mentiras! Não acredite nestas mentiras, leitor!
Fonte: facebook
Página: Archimedes
Marques
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário