Por José Romero
Araújo Cardoso (2)
Venho recordar-lhes um grande herói das veredas da terra do sol, um personagem
ímpar da nossa história que marcou indelevelmente nosso imaginário, pois cantou
e decantou com invulgar perfeição o estilo de vida, a natureza e as coisas mais
belas que podem existir na face da terra.
Encourado, vestia-se como um rei, pois na verdade ele o era, sua coroa era
inigualável, feita da mais pura e autêntica matéria-prima que, sem sombras de
dúvidas, assinala a autenticidade de uma cultura forjada sob a égide dos cascos
das boiadas que outrora palmilharam céleres pelas trilhas tortuosas dos adustos
rincões sertanejos.
O gibão que ostentava servia para enfatizar a essência de um povo forte que não
mede distância em se aventurar pelos perigos das caatingas bravias, buscando no
mato cerrado o gado que se perdia e nem mais atendia ao aboio cadenciado do
vaqueiro, um dos inspiradores desse grande rei.
A estética armorial incorporada pelo nosso grande rei fê-lo original em todos
os sentidos, pois com tenacidade agregou valores ao nosso processo de
afirmação, imortalizando variedade impressionante de temas que enriqueceram
formidavelmente a nação sertaneja em todos os sentidos.
Digo-lhes sem titubear que amo nosso grande rei encourado por que foi na
superação de provações e obstáculos que colocou em panteão dos mais altos nosso
povo e nossa terra, não faltando-lhe humildade para se declarar um devoto
apaixonado das coisas ligadas à terra que tanto amou.
Nosso rei tinha a pele crestada de sol, muitas vezes vítima de preconceitos,
pois era o registro biológico da miscigenação de três raças impávidas que não
hesitaram em formar uma civilização singularíssima que se firma bravamente
diante dos desafios da contemporaneidade, muito devido ao legado de sua suprema
e divina arte.
Esse rei elegeu o acordeon, a nossa sanfona, como instrumento musical por
excelência da ruralidade que marca a essência da sertanejidade que deve estar
presente em nossas veias, em nossas mentes e corações, pois devemos defendê-la
com todo ardor, tendo em vista que se trata do retrato de nossas vidas e das
memórias dos nossos antepassados.
Harmonia e melodia de suas canções fazem despertar a identidade de um povo que
luta bravamente e nunca esquece o torrão natal, por mais distante que esteja,
por mais longe que possamos estar sempre há espaço para recordações quando seus
imortais registros musicais ecoam pelas quebradas estranhas.
Esse rei, adornado em tradições imorredouras, fez vibrar de emoção o mais belo
pedaço de chão que Deus em Sua Divina Providência criou para alegria daqueles
que sabem valorizar um processo de construção coletiva marcado pela firmeza de
conduta.
Samarica Parteira, Assum Preto, Asa Branca, Xanduzinha, Riacho do Navio,
Mossoró, pois Lampião não era besta, não, vozes da seca, enfim, uma infinidade
de assuntos dialogados e tratados pelo grande rei encourado das caatingas do
sertão devem servir de exemplo às gerações presentes e vindouras a fim de
valorizar a terra mãe, esse pedaço de chão cheio de percalços e desafios, mas
que oferece vantagens incomparáveis àqueles que o ama.
Termino aqui esta carta recomendando que mirem-se no exemplo de telurismo que o
grande rei deixou-nos enquanto signo maior de um tributo exemplar às raízes
sertanejas.
(1) Concorrente
ao I Prêmio A CARTA, ano de 2015, promovido pelo Grupo União São Francisco –
Parque Cultural O Rei do Baião – São João do Rio do Peixe - Paraíba.
Não obteve
classificação entre os três primeiros colocados.
(2) José
Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Escritor. Professor-Adjunto IV do
Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista em Geografia e
Gestão Territorial e em Organização de Arquivos. Mestre em Desenvolvimento e
Meio Ambiente. Sócio da Sociedade Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC) e do
Instituto Cultural do Oeste Potiguar (ICOP).
Enviado pelo autor...
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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