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sábado, 24 de setembro de 2016

UMA ANÁLISE DO CANGAÇO NA HISTÓRIA DO BRASIL


O estudo do cangaço é investigar também o contexto socioeconômico e cultural do Brasil desde a sua colonização. Um país “descoberto” por europeus que não respeitavam a cultura dos habitantes ali encontrados, iniciando assim uma série de violências contra a etnia que habitava as terras e palmeiras brasileiras. O poder político do Império através das capitanias e sesmarias concedeu terras aos seus correligionários em detrimento dos que ali já viviam. Posteriormente a exploração da mão-de-obra escrava também não era questionada em razão das etnias, tidas como minorias e não serem reconhecidas culturalmente sendo tratadas como inferiores, forçadas ao progresso “civilizador”.

O objetivo é refletir essas práticas violentas compreendendo-as como um grito de justiça social diante da concentração de riqueza, da ausência do Estado de direito, do controle social exercido pela política coronelística. O estudo traz uma reflexão sobre o cangaço, configurando-o como uma questão social nordestina, pelo fato de ter surgido no final do século XIX, época de seca na Região Nordeste, fome e miséria, além dos conflitos gerados pelo latifúndio explorador onde o homem do campo era subserviente à elite agrária e ao coronelismo político. Os direitos sociais eram inexistentes e a lei do mais forte era a que imperava, de modo que a justiça se efetivava através da coragem das pessoas e de suas ações vingativas.

As condições climáticas do semiárido nordestino favoreciam o surgimento de secas prolongadas de tempos em tempos, castigando a produção agrícola do homem do campo trazendo miséria e fome. As secas, o controle social, a partir da prática de favor cultivada pelos senhores de fazenda diante dos trabalhadores fez com que alguns se indignassem e fossem mudar o seu destino, adentrando no cangaço ou no messianismo. Ainda havia aqueles que decidiam entrar no cangaço por motivos de vinganças pessoais ou como grito de justiça em um país onde não havia políticas para diminuir as desigualdades sociais e os direitos só eram efetivados através da lei do mais forte.

“Em 1877, por exemplo, o sertão nordestino foi atingido por uma terrível seco, que matou cerca de 500 mil pessoas e obrigou 3 milhões de sertanejos a buscar sobrevivência em outras áreas. Uma delas foi a Amazônia, onde se expandia a exploração da borracha” (Projeto Araribá: 2006.p.69).

“Vale a pena citar o Diário de Pernambuco que informa o número de flagelados em fins de 1877: 700 mil no Ceará, 150 mil no Piauí, 117 mil no Rio Grande do Norte, 400 mil na Paraíba, 200 mil em Pernambuco, 50 mil em Alagoas, 30 mil no Sergipe e 500 mil na Bahia. Vê-se que o Nordeste sofria por inteiro, com fome, miséria e morte. A história do sertão é marcada pela ausência do Estado; o sertão passou da monarquia para a República, esquecido pelo poder central ficando a mercê das elites arbitrárias. O sertanejo continuou entregue à própria sorte.” (Diário de Pernambuco in Bezerra: 2009.p 58).

O orgulho e a questão de honra no sertão nordestino sempre foram muito fortes, uma vez que não havia resposta imediata da justiça, os sertanejos faziam justiça com as próprias mãos respondendo as suas indignações. 

Muitos sertanejos entraram no cangaço pelo status social que ele adquiriu no sertão, chamados de justiceiros, o que denotava poder entre a população sertaneja, já que ora eram amados e ora eram temidos. Outros seguiam Antônio Conselheiro ou o beato José Lourenço nas comunidades criadas por eles onde se vivenciava os princípios da igualdade e fraternidade, onde ninguém era oprimido e tudo era repartido entre todos.

Virgulino Ferreira da Silva (o Lampião) sentindo-se injustiçado formou seu bando e, com a alma ébria de ódio saiu pelo sertão nordestino saqueando o comércio, as fazendas e matando sem temor, como forma de se vingar e sobreviver a dor que encarcerava as veias do seu coração. Agia como se toda a sociedade fosse culpada pela sua perda e assim a vida destemida o protegia de seu desalento e o fato de ser temido e conhecido no País inteiro alimentava o seu ego.

Lampião foi o produto de uma sociedade desigual econômica e socialmente, que por não oportunizar aos trabalhadores à dignidade, transforma-os em rebeldes e revolucionários, Virgulino fez do cangaço uma forma de enfrentamento à justiça, às desigualdades sociais, ao próprio governo e a toda elite agrária, sendo temido por suas ações violentas e truculentas em todo o sertão nordestino. Subverte a ordem também quando por amor deixou Maria Bonita adentrar no cangaço, levando-a consigo e tratando-a como companheira, o que acarretou a vinda de outras mulheres para esse movimento social. Analisamos a questão de gênero que envolve o cangaço. Um país que caminhava com base na educação patriarcal, machista, onde o homem era o centro das decisões, cabendo a mulher apenas a educação da prole e a organização do lar. Na vida rudimentar da Caatinga, do sertão nordestino, as mulheres entram no cangaço, quebrando a tradição masculina do mesmo e são tratadas como companheiras, participando das lutas, seguindo os seus companheiros nas viagens, alegrando as suas noites com músicas e danças.

O estudo sobre o cangaço trouxe a possibilidade de analisar esse movimento como uma questão social do Nordeste, surgida como um grito de justiça social em decorrência das desigualdades, da falta de oportunidades com dignidade para o trabalhador rural e pela ausência do Estado diante das questões sociais.

Conclui-se que a violência praticada no cangaço pode ser refletida a partir de uma análise da conjuntura do Brasil naquele momento, assim podemos melhor compreender as razões que levaram a formação desse movimento social.

http://www.m.vermelho.org.br/noticia/249409-11


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