Por Anildomá Willans de Souza
https://www.assisramalho.com.br/2011/12/exclusivo-diretor-do-museu-do-cangaco.html?m=0
A incessante
perseguição de Zé Saturnino e dos Nogueiras foi determinante para Antônio
Matilde e os irmãos Ferreiras arrochar o nó até sangrar, se não para matar os
inimigos, pelo menos para provocar um prejuízo material difícil de recuperar.
Para isso, foram a Vila de São Francisco conversar com o chefe, Sinhô Pereira,
relataram o plano e terminaram dizendo que queriam cinco homens dos bons para
ajudar na empreitada.
Somando os irmãos ferreiras, Antônio Matilde, Antônio Rosa e os irmãos Beneditos, já davam doze, com arma e munição suficiente para brigar dois dias sem parar.
Sob o comando de Antônio Matilde a base de operação foi montada na fazenda Mata do Pato, nos arrabaldes da vila de São Francisco, de onde remeteria comandos de ataque. Era a primeira semana de março.
Montados em cavalos, logo após o café da manhã, os cangaceiros tomaram rumo, e
obedecendo a um plano esquematizado por Virgolino, foram completamente
destruídas e arrasadas as fazendas Serra Vermelha de João Nogueira, a Pedreira,
de Zé Saturnino, e Mutuca, de Venâncio Barbosa. Com garranchos secos e as
varas das cercas foram feitas fogueiras atingindo as casas, chiqueiros de bodes
e de galinhas, com as chamas se espalhando pelos matos e roçados, escangalhando
os currais, fazendo o gado fugir embaraçado, enquanto grandes redemoinhos de
fumaça iam subindo empurrado pelo vento, dificultando avistar o sol, com as
labaredas famintas devorando tudo pela frente.
Os donos das propriedades encontravam-se reunidos em Villa Bella fazendo planos para as eleições municipais que se avizinhava, sem saberem que a vingança dos Ferreiras estava começando. Os moradores correram apavorados, sem a mínima condição de tracejar alguma reação.
Dezenas de reses mortas a tiros, centenas de criações esturricadas, os currais queimados, as cercas completamente destruídas e os matos ainda crepitando com o fogaréu, um espetáculo tétrico e assustador, uma carnificina dos diabos, parecia um inferno na terra e os bichos eram os condenados, com os gritos dos atacantes sedentos por vingança fazendo uma mistura funesta com os berros e urros dos animais terrificados.
Um fedor de carne e chifre, ossos e pelos queimados, misturados com toda diversidade de matos e madeira soltando uma fumaceira puxando a um pretume feio danado, deixou o ar impossível de respirar, dando náuseas em qualquer pessoa num raio de seis quilômetros. Parecia que o mundo tinha se acabado naquele pedaço de chão.
Os cangaceiros viram que não tinha mais nada em pé, deram o sinal combinado e se retiraram, indo comemorar o sucesso da empreitada nos bares da Vila de São Francisco. Antes do final da tarde os proprietários retornam avisados pela vizinhança, trazendo um contingente de policial e cabras arregimentados no percurso de Villa Bella ao local.
João Nogueira ao ver o estado de sua fazendo, entre vômitos e choros desesperados, gritava que não quer mais saber de um Pereira vivo, que vai buscar os filhos de José Ferreira debaixo da saia da mãe de satanás. Com o amor-próprio arrebentado, entrou de cabeça num estado profundo paranoico de depressão, sem força para nada.
Na fazenda Mutuca, Venâncio Barbosa não disse uma palavra sequer, ficou em estado de choque, paralisado, sendo socorrido pelos amigos e vizinhos. Por vários dias ficou alheio ao mundo, sem dormir e nem comer, nem falar coisa por coisa, apenas murmurava palavras e frases desconexas. Aos poucos foi tornando a consciência, mas sem ação para nada.
Zé Saturnino foi o único que ainda conseguiu tracejar os pensamentos. Montou em um cavalo, acompanhado do seu cunhado Vicente Moreira, num galope só chegaram à fazenda Juá, em Custódia, na casa do seu tio Cassemiro Honório. Este estava cavando um poço na frente de sua casa, com uns trabalhadores, ouviu todo relato do sobrinho, não precisou muitas palavras para o velho Cassimiro sacudir fora as ferramentas, mandou os trabalhadores se armarem, montaram em seus cavalos e sem perca de tempo dezoito homens armados até os dentes, tendo a frente Cassimiro Honório, Zé Saturnino e Vicente Moreira, partem num galope enfurecido na direção do Pajeú, não fizeram nenhuma parada e ao chegarem foram direto para o possível campo de lutas. Ao chegarem à Lagoa da Laje ouviram uns tiros. Esconderam-se em umas pedras, sabendo que deveriam ser os inimigos e que logo passariam por ali. De fato, era Zé Benedito com um sobrinho de Antônio Matilde que vinha formando um grupo de nove cangaceiros e haviam terminado de matar algumas reses no bebedouro.
Ao se aproximar de onde estavam entrincheirados, a cabroeira fez fogo deixando Gino, sobrinho de Antônio Matilde, morto com mais de trinta tiros, e os outros correram, saindo também Zé Benedito com leve ferimento no braço. Os cabras de Cassimiro Honório continuaram entrincheirados no mesmo local aguardando o socorro que certamente viria para desforra.
Antônio Matilde ouvindo o tiroteio, imaginou de que se tratava e correu em auxilio, com seus seis homens, sem ter percorrido um quilometro encontrou os que vinham fugindo. Ao escutar a conversa de quem eram os atacantes, lamentou ter de brigar com o antigo companheiro de armas. Virgolino ainda retrucou dizendo que seria perigoso voltar pelo mesmo caminho que eles vieram, o melhor seria fazer a volta e pegar os inimigos pela retaguarda. Antônio Matilde não concordou e puseram-se a caminho do local da briga.
Ao chegarem à Lagoa do Laje encontraram logo o morto, enquanto pegavam alguns objetos do defunto, as armas dos cabras de Cassimiro Honório eram apontadas para os emboscados. Trava-se violento tiroteio com as balas zunindo por toda parte.
Antônio Matilde leva um balaço nas costas atingindo os pulmões, ficando fora de combate, mas ordenando que continuasse a peleja sob o comando de Virgolino.
Cassimiro Honório estava no limite das suas condições sem chance de avançar e liquidar os inimigos, porque Virgolino se mantinha bem entrincheirado, embora cercado por todos os lados.
Sinhô Pereira estava na Passagem do Brejo, quando escutou a fuzilaria mandou sete dos seus homens darem reforço a Antônio Matilde. Em pouco tempo chegaram ao local e foram entrando no fogo, animando Virgolino.
A tarde ia caindo, mas a luta continuava firme, sem ninguém arredar o pé. A
situação ficou de um jeito que não se tinha como avançar nem como recuar, nem
de um lado nem do outro. Ao que indicava tudo iria para uma luta corpo a corpo,
na ponta da faca, todo mundo se esbagaçar no punhal, para num sobrar nem as
tilancas.
Cassimiro Honório manda atear fogo no mato e no meio da fumaça os combatentes dos dois lados , abaixados e rastejando como bichos por trás das rochas e troncos de árvores, conseguem deixar para trás o campo de luta após cinco horas de intenso tiroteio. Antônio Matilde foi conduzido para fazenda Carnaúba, onde recebeu tratamento, ficando completamente curado em menos de dois meses.
Fonte: LAMPIÃO
E O SERTÃO DO PAJEÚ
De: Anildomá Willans de Souza
De: Anildomá Willans de Souza
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