Será lançado em breve, em Monte Santo, o romance histórico “O Silêncio do Sino”, do escritor e diretor de teatro Ivan Santtana. O livro vem na esteira dos melhores romances sobre a temática de Canudos e, de modo particular, sobre a temática das crianças de Canudos.
Antes deste, dois outros romances trataram do caso dos pequenos de Canudos, sendo eles “O Menino-Jagunço”, de Paulo Dantas, e “As Meninas do Belo Monte”, de Júlio José Chiavenato, ambos brilhantes tanto na forma como no conteúdo. “O Menino-Jagunço” apresenta a saga de André Ema, o Bacutinho, que, homem feito, resolve escrever suas memórias, relatando sua infância ao lado do Conselheiro. Já “As Meninas do Belo Monte” traz à luz o drama das crianças de Canudos, que, uma vez prisioneiras, foram destinadas – pelos próprios militares – umas ao trabalho escravo, outras à prostituição.
E o que dizer deste “O Silêncio do Sino”?
Há que se dizer inicialmente que o interesse do romancista histórico não é propriamente pelo rigor do fato, mas pelas possibilidades de criação e recriação que o fato em si pode oferecer. Poderíamos dizer que o fato histórico é o tronco de madeira que, esculpido, vira obra de arte nas mãos do artista.
O romance histórico permite ao artista – e somente ao artista – adentrar as entranhas do fato e extrair delas o que o historiador nunca seria capaz de perceber. Isso porque – a exemplo do tronco – o fato possui nuances, sutilezas, possibilidades que somente o espírito intuitivo do romancista é capaz de colher, já que embalado pelo voo criativo da liberdade poética.
Escritor e diretor de teatro Ivan Santtana
O romance histórico revisa e revisita o fato. Conta e reconta a história. A história que foi, mas que não pôde ser percebida nem contada pelo historiador, porque o historiador tem método, tem regra e tem rigor – o que nem de longe é o caso do poeta, que tem por regra unicamente a liberdade. E assim, como bem afirmou Otto Maria Carpeaux, ocorre que o romancista “cria novamente a história”.
É o que ocorre com o “Silêncio do Sino”. Bentinho – e aqui todo cuidado para não oferecer nenhum spolier – Bentinho encarna o pequeno herói, herói de carne e osso, que de fato viveu, e que de fato combateu (e que possivelmente também amou), mas que passou batido aos olhos do historiador.
Bentinho é uma parte da história que faltava ou que o poeta achou que faltava para conferir à trama o brilho que ela merece. Uma parte da historia que, aliás, não só é contada, como é contada por inteiro, na sua justa medida, com todas as cores e esplendor. Numa saga como a de Canudos, tão grande, tão superior, não poderia faltar um herói do quilate de Bentinho, e aqui está ele, tangendo cabras, rezando com o Conselheiro, empunhando o bacamarte, morrendo de amor por sua Maria Domingas.
Bentinho é também a personagem que faltava na ficção de Canudos, muitas vezes superficial, descolada da realidade, sem o cheiro e sem o calor do sertão. Bentinho é real, tem a cara e o sotaque dos meninos do sertão. Vive, luta e reluta como os meninos do sertão. Vive a paixão e o amor como os demais meninos do sertão. De tão genuíno, de tão nosso que é, ouso até pensar que Bentinho foi concebido numa bela tarde sertaneja, à sombra do umbuzeiro, e ao som dos chocalhos das cabras.
Bentinho é nosso e é atual; e aposto que ele, que tanto lutou e amou nos Canudos de ontem, muito iria gostar de lutar e amar nos Canudos de hoje, tão desérticos e tão precisados de mais luta e de mais amor.
Pelo visto, "O Silêncio do Sino” de silencioso só tem o nome!
José Gonçalves do Nascimento
23/10/19
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário