Por Verluce Ferraz
As exigências
da vida levam algumas reservas energéticas e não sucumbem totalmente ao
princípio da inércia. A mente é obrigada a transformar as atividades de tais
energias para obter satisfações, nem sempre adequadas a obtenção dessas,
podendo assim, serem conduzidas às alucinações para obter suas satisfações. E a
alucinação é considerada, segundo os melhores estudiosos do assunto, o caminho
mais curto para a realização do desejo, sendo considerado esse uma atividade
primária.
Na vida de Virgulino, o emprego da força psíquica estava de acordo com
a exigência de sua vida. Era imperativo de seu pensamento tecer um mundo
interior e realizar o seu percurso no mundo exterior. Cabe aqui clarear essas
funções, substituir o desejo alucinatório interior e obter o resultado que
apresentasse relação à monção (1) do seu desejo: vingança. Mas, vingar o que? O
que desejava vingar Virgulino? De onde vinham essas atividades alucinatórias
para o matador vingador? Ao buscar repetir a percepção ligada à vivência de
satisfação, o aparelho psíquico produz o fenômeno da alucinação indicando a
tendência do aparelho à repetição dos estados de desejo. Virgulino não
suportava o aumento de suas tensões, daí entrar em cena o deslocamento da
quantidade de energia para entrar em ação o seu ‘estatuto’: o prazer de matar e
ver sangue. Mas ainda não respondemos de onde provinha tal desejo. Ao que tudo
indica, é a produção da atividade alucinatória como fruto da regressão da
excitação, e a porta da entrada foi o registro psíquico da consciência, que
possui canal direto com a percepção, denominado consciência-percepção.
Segundo
David-Ménard (2000), o sistema ω (2) registra não quantidades de energia, mas
sim diferenças relativas de frequência ou duração, aproxima da noção freudiana
de período e daquilo que se denomina sinal da consciência. Lembranças
anteriores podem desencadear grande quantidade de energias e o organismo
interior que transitam em forma de alucinação; mecanismos das memórias. Lampião
sempre afirmou que não gostava de ouvir choro de crianças, associando ao berro
de cabritos. Essa informação é recebida como sendo uma recordação gravada na
memória dos tempos em que sua avó fazia partos... Virgulino foi incapaz de se
livrar daquelas lembranças... Em Virgulino os desejos eram combustível para
suas atividades criminosas.
Isso exigia memória, é claro que também condições
deveriam também de estar presente ao mesmo tempo. As condições ele foi buscar
na própria exclusão social, ao viver de forma anormal atuando sempre dentro de
grupos dominados por ele. Embora não se comprove nenhuma experiência de como
ele compartilhava suas exigências no tocante a sua ‘double conscience’; sabe-se
que supria suas necessidades biofisiológicas capacitando-se no modo de atacar,
feito lobos que vivem isolados dentro da caatinga, suportando a própria natureza;
usava da força para saciar seus desejos de possuir vantagens, que, alguns,
tomam por inteligência e, mora aí, a falta de uma análise mais profunda que há
de mostrar alguns exageros. Virgulino não possuía as características da
inteligência emocional, não tinha capacidade de controlar impulsos, canalizar
emoções para situações adequadas, praticar gratidão e motivar as pessoas para o
bem, além de outras qualidades que poderiam ajudar a encorajar indivíduos; não
sabia seguir em frente diante de suas frustrações e desilusões. E, assim,
durante a vida, Virgulino transitou em ‘atitudes passionnelles’ (fase
alucionatória) que acabou no dia 28 de julho de 1938. E com ele, os seus
seguidores.
(1) Monção (do
árabe: موسم [mausim],
estação) é a designação dada aos ventos sazonais, em geral associados à
alternância entre a estação das chuvas e a estação seca, que ocorrem em grandes
áreas das regiões costeiras tropicais e subtropicais. A palavra tem a sua
origem na monção do oceano Índico e sudeste da Ásia, onde o fenómeno é
particularmente intenso. A palavra aqui citada no texto é para aproximar o
estado psíquico em que transitava o pensamento do cangaceiro que volitava e
estaria governado por monção. Em Virgulino os desejos eram combustíveis para
suas atividades criminosas. Isso exigia memória,
(1) ω O que é Ômega:
O termo ômega possui o significado de “fim” quando utilizado associado à primeira letra do alfabeto grego “alfa”, por exemplo, na expressão “alfa e ômega”, que representa “princípio e fim”. Na Física, a representação gráfica da letra maiúscula Ω e da letra minúscula ω é utilizada em diferentes contextos.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário