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sábado, 21 de abril de 2012

Documento - Auto de perguntas feitas a Alcino da Silva Duarte

Por: Rubens Antonio
 

Divulgando mais um documento relacionado ao Cangaço, obtido e gentilmente disponibilizado pelo estudioso Orlins Santana.

. Auto de perguntas feitas a Alcino da Silva Duarte

. Aos vinte e oito dias do mez de setembro de mil e novecentos e vinte e nove, as quize horas, na sala de audiencia desta delegacia perante o 2° suplente de delegado de Policia José Luiz Pereira comigo o escrivão de seu cargo abaixo nomeado e assignado compareceu o cidadão Alcino da Silva Duarte a quem foram feitas as seguintes perguntas: Perguntado qual o seu nome, estado, idade, profissão, filiação, naturalidade, residencia e se sabe ler e escrever. Respondeu chamar–se Alcino da Silva Duarte, casado, com trinta annos de idade, comerciante, filho de Laurindo da Silva Duarte, natural e residente nesta cidadesabendo ler e escrever. – Perguntado como se
encontrou com o grupo Lampeão, em que dia, horas, quantos vinham no grupo, nomes de gerra, nomes proprios, material bellico, intenções? Respondeu que no dia vinte e seis do corrente mez, indo o respondente para a Fazenda “Mariannas”, adiante do Arraial de Canoa, um kilometro mais ou menos, distante desta cidade, treze kilometros ou quinze minutos de carro, encontrou–se o respondente, com dois homens bem armados, e bem montados, que o aggrediram, com palavras obscenas, pedindo dinheiro e armas; que em curto espaço de tempo, appareceu o resto do grupo com posto de dez homens, tambem bem armados e montados como os primeiros, roubando o correspondente a importancia de trezenteos e sete mil reis deixando o correspondente de entregar armas porque não as conduzia; que soube la a tratar–se do grupo Lampeão em vista de esse dizer que era obrigando o respondente, mostrar, em Canôa, quem podia ter dinheiro; que imediatamente guiou o terrivel e malsinado grupo para a casa de campo do Senhor Romulo Gonçalves da Silva, onde este senhor estava a passeio com sua familia; que na casa de Romulo chegaram as dezoito horas, tendo antes, á entrada da cancella pegado o fazendeiro Francisco Alves da Silva, esbofeteando–o e obtendo do mesmo certa importancia, toda que o mesmo tnha nos bolsos, não sabendo entretanto quanto; em seguida tomaram a porta da casa do referido senhor Romulo exigindo–lhe, em particular, uma certa importancia, que soube depois ser de cinco contos, tendo entretanto spo arranjado um conto de réis; que após a conversa foram com Rômulo seguro para o interior da casa, onde estavam a senhora do mesmo em crise nervosa, ficando o respondente sob a guarda de Arvoredo e Corisco; que dalli seguio com o grupo já o respondente na retaguarda, pois já outros haviam passado na frente; que viu de perto a ferocidade de Lampeão e seus comparsas; diz o respondente que nunca avaliou existirem pessoas tão desnaturadas, capazes das maiores imfamias pois presenciou scenas de barbarismo tal, de taes ferocidades que deixou o depoente seriamente impressionado; Lampeão se orgulha de ser o Rei do Sertão e sente tanta felicidade em humilhar o proximo, sente tão grande satisfação em implantar o terror, que se lá, nos olhos do monstro a alegria de que se vê possuído quando a victima treme implora compaixão ante a lamina brilhante do seu punhal de setenta e cinco centimetros; ante a bocca do seu instrumento de morte, que ao enves de mosquetão é um riffle oitavado, de bandoleira enfeitada de moedas de ouro ante ao seu parabellum cano longo; ante a impressionante equipamento composto de cartucheiras e imbornaes de balas; ante aos olhares irrequietos dos seus comparsas armados até aos dentes; que teem o garbo de dizerem que não perdem pontaria salientando–se Lampeão que atira com as duas mãos com eximia pontaria; que o seu encontro se dera as dezsete horas seguindo para o Arraial de Canôa, onde chegou ás dezoito e de onde sahiram ás vinte e treis horas, mais ou menos; que em Canôa, beberam e saqueiaram, espancaram, e, a vontade, sem susto nehum, debandados, cada um cuidando de si beberam á vontade; que Lampeão gracejou muito da acção da Policia, criticando, achando ridicula a covardia da perseguição dos macacos que não sabem atirar; que Lampeão se orgulha de dizer que os macacos nunca o atacaram, pois quando sabem que elle, Lampeão, está no logar, nunca o foram atacar, e se já se deu uma vez em Aboboras foi por que não esperavam encontrar o grupo alli; que a prova melhor foi em Tanque Novo, conforme um bilhete recado que Lampeão de proprio punho escreveu e deu ao depoente para trazer para o Capitão José Galdino que vae transcripto neste auto e é do theor seguinte:

“Eu capitão Virgolino Ferreira – Ziquiel Ferreira, Ponto Fino, Luiz Pedro, Marianno, Serrillo, Gato, Lavareda, Revolto, Volta Secca, José Bahiano, Fortaleza, Alvoredo e Oeste, doze homens que brigaram, digo que combati com 160 macacos no Tanque Novo, porem estamos todos em paz, é vergonhozo ver a distancia que recebemos os primeiros tiros porem os macacos estavam com tanto medo, que os tiros foram todos errados u que reagimos mais de uma hora no campo limpo, demais tratei de não pocurar posição, i isperar que tinha certeza que tinha rectaguarda, como de facto tratei de retirar depois que fizemos algum serviço pois não gosto de perder tempo deixei elles podendo como soube de S;PEDRO, e sahi em minha pelle enterinha nem re vécho ––– Bem Agora mesmo aviso ao Antonio Cajuhy que não sou Napoleão sou Virgolino Ferreira Vulgo Lampeão o terror do Sertão, isto né as moças dizem. A.C. (A.C. é Antonio Cajuhy) toda cidade é pouca pois homem que pega questão comigo dorme pouco perdi o amor de dormi com a mulher sem mais assunto Eu Capitão Virgolino Ferreira da Silva. Vulgo Lampeão”

Alem de ter recado escripto pelo proprio punho de Lampeão diz o respondente que Lampeão mandou, de bocca, mais o seguinte;

“que o Negrão que estava no commando das Forças, aqui em Bomfim, podia ficar certo que a qualquer momento lhe faria uma visita para que o mesmo lhe pagasse o que lhe devia;”

– que a intenção de Lampeão, conforme o mesmo demonstrou era vir a Bomfim; isso não fazendo, porque o depoente dissera que em Bomfim tinha muitas praças e até metralhadora; que as vinte e treis horas mais ou menos, marcharam de Canôa, após o saque, marcharam para Rancharia, deste Municipio, onde dormiram, depois de umntar uma forte guarda em torno a casa; que poderam os animaes em um pastro ficando de sentinela á porta os bandidos Arvoredo e Volta Secca com o depoente á vista; dentro de casa estavam Lampeão, Marianno, Cyrillo, Ponto Fino, Curisco e Antonio Engracia todos jogando “31” –; que as fichas eram as balas dos fuzis valorisadas em cincoenta mil reis (50$000) cada; que durante o jogo tiveram forte altercação Cyrillo e Marianno em vista do primeiro ter chamado Marianno de ladrão por causa de quatro fichas (200$000) sendo preciso a intervenção de Lampeão para acalmar os animos exaltados; que após essa discussão todos, isto é, os de dentro da casa, dormiram calmamente até as seis horas do dia seguinte; que a guarda se revezava constantemente não se lembrando o depoente se era de uma hora ou de duas horas; que Lampeão mostrou ao respondente uma bolsa contendo dinheiro, calculado em mais de quinhentos contos de réis; que o grupo é constituido em numero de dezoito homens, conforme contou o depoente na occasião de montarem e com os seguintes nomes dados ao depoente pelo bandido Arvoredo –; Lampeão, Revolto, Volta Secca, Arvoredo, Moderno, Esperança, Mourão, Curisco, Antonio Engracia, Cyrillo, Marianno, José Bahiano, Quaebra Faca, Aleixo, Serra Negra, Lavareda, Fortaleza e Gatinho; que queria que o respondente mandasse publicar no Diario de Noticias o recado para o Capitão José Galdino bem como para Cajuhy; que Arvoredo e Curisco odio de morte a José Clementino e se poderem estrangulam na primeira opportunidade; que Arvoredo fallou tambem, com muito odio, nas mortes de um irmão e um primo assassinados na linha ferrea, dizendo que o maior responsavel era José Clementino; que Lampeão o procurou com muito interesse no “Diario de Noticias” mostrando um desejo ardente de colleccionar ese jornal ao que o depoente mostrou–se penalisado de não poder lhe facultar sua collecção; que as seus e meia horas despediram–se do respondente e seguiram rumo que o depoente ignora; E como nada mais disse nem foi perguntado mandou o senhor 2° suplente de delegado encerra o presente depoimento que depois d elido e achado conforme e assgina com o depoente comigo Escrivão que o escrevi e assigno. Eu Napoleão Pinto de Souza, Escrivão o escrevi e assigno. (A) José Luiz Pereira – (A) Alcino da Silva Duarte – (A) Napoleão Pinto de Souza.

Enviado pelo professor e pesquisador do cangaço:
Rubens Antoniom do blog Cangaço na Bahia

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