Por: Wescley Rodrigues
Wescley Rodrigues e a professora Ana Lúcia
Bom dia!
Por ocasião do
Seminário Parahyba Cangaço, foi lido no dia 16 de junho de 2013, na cidade de
Nazarezinho, o manifesto que pede o tombamento da casa do sítio Jacú, antiga
residência do cangaceiro Chico Pereira, e a criação de um museu no referido
local.
Em anexo
encaminho o manifesto lido.
Atenciosamente
Prof. Wescley
Rodrigues
MANIFESTO EM PROL DO RESTAURO DA CASA DO SÍTIO
JACÚ
Exmº. Sr.
Prefeito do Município de Nazarezinho, autoridades municipais constituídas,
cidadãos e cidadãs do estado da Paraíba e demais estados da Federação, família
Pereira, o cangaço foi um movimento que marcou a história do sertão nordestino,
sendo um movimento que, devido as suas peculiaridades e características não
encontramos em outro lugar do mundo, sendo algo eminentemente nosso, um dos
elementos caracterizadores da região Nordeste.
Alguns
registros históricos pontuam a existência de cangaceiros já no século XVIII, no
momento das entradas de gado e de desbravamento dos sertões. No entanto, o
apogeu do cangaço deu-se na primeira metade do século XX. Sabemos perfeitamente
que a figura do cangaceiro liga-se ao banditismo, a violência, a assassinatos,
roubos, estupros e depredações do patrimônio público e privado, mas devemos
salientar que esses homens e mulheres chamados por muitos de bandidos, foram
fruto da sociedade de sua época. Essa sociedade marcada pela má distribuição de
terra, latifúndios, trabalho escravo ou servil, analfabetismo, descaso por
parte da justiça e das autoridades políticas, falta de políticas públicas e
trabalho.
Todos esses fatores acabaram levando muitos sujeitos a enxergarem no
banditismo uma solução imediatista para a resolução dos seus problemas, pois
quando bate a fome, como bem disse o médico Josué de Castro no seu livro “Geografia
da Fome”, o homem perde todo o seu código ético e moral e deixa a sua fera
interna romper as barreiras da conversão social para poder alimentar-se. Essa é
a busca desenfreada pela sobrevivência.
Outro fator
que carece de uma atenção mais amiúde foi à falta de justiça, haja vista ser a
justiça no século XIX e início do XX totalmente parcial, estando à disposição
apenas da elite que a manipulava acabando por marginalizar inúmeros sujeitos
por meio de ações que levavam a injustiça, plantando no homem um sentimento de
revolta. Vitimados muitos viam nas armas a solução para os seus problemas, o
meio para alcançar a tão almejada vingança; um refúgio protetor contra uma
elite e um sistema coronelístico desumanizador; e um meio de vida para
sobreviver apesar de todas as intempéries da vida nômade na caatinga.
O final do
século XIX e início do XX surgiram cangaceiros famosos, os quais, por meio das
suas ações, se imortalizaram na memória e trova popular. A história dos seus
atos foram gradativamente passando de geração a geração. Essas narrativas
construíram um espaço memorialístico para a figura do cangaceiro, os quais
tinham seus feitos reproduzidos por meio das falas
populares, das histórias mirabolantes salientadas pelos caixeiros viajantes ou
por meio da deliciosa construção discursiva do cordel. Tivemos nomes que até
hoje são lembrados: Jesuíno Brilhante no Rio Grande do Norte, Lucas da Feira na
Bahia, Antônio Silvino na Paraíba e Pernambuco, Sinhô Pereira no Pernambuco,
Virgolino Ferreira da Silva, conhecido como Lampião, grande ícone do “ser”
cangaceiro e que “reinou” nas suas andanças por sete estados do Nordeste
brasileiro; e Chico Pereira no sertão paraibano. Poderíamos citar inúmeros
outros, mas nos detemos de forma ilustrativa no nome desses.
Nesse contexto
apresentado, falar do Nordeste sertanejo é falar do cangaço, não temos como
apagar da história esse movimento que mazelou por muito tempo o povo
nordestino, muitos pobres que viviam isolados na caatinga. Lembrar do
cangaceiro não é um ato de revesti-lo com armaduras de heroísmo, de fazermos
apologia a violência e ao banditismo, mas sim, voltar o nosso olhar para um
momento crítico da nossa história, buscando entendê-lo, esmiuçá-lo para não
cometermos no presente os mesmos erros do passado. Falar do cangaço é analisar
antropologicamente o homem sertanejo tão estigmatizado e martirizado com as
intempéries climáticas e com a desvalorização política. Falar do cangaço é
discutir o papel da justiça como um meio responsável por lutar pela dignidade
da pessoa humana e pelo princípio da equidade. Como coloca Francisco Pereira
Nóbrega no livro “Vingança, não”: “Cangaceiro não era apenas o perverso, o
tarado. Havia-os também honestos, incapazes da menor crueldade gratuita, de
armas em punho só para tentar justiça”.
Em uma
sociedade que abria poucas possibilidades para o pleno desenvolvimento dos
sujeitos, assumir a vida das armas era uma forma de buscar se fazer ouvir,
lutar por seus direitos, haja vista a justiça da época só valorizar a elite.
Estando encravada
no Nordeste, a Paraíba não esteve imune à atuação dos cangaceiros, como também
era caracterizada por todos esses fatores conjecturais expostos há pouco, que
promoviam a segregação social. Ao palmilharmos essa história nos deparamos com
a figura do cangaceiro Chico Pereira, um dos maiores ícones do cangaço
paraibano, homem de fibra que se fez personagem da história do Brasil e que
precisa ter a sua memória preservada.
O que
percebemos é que essa história tão rica que temos na cidade de Nazarezinho não é
valorizada, estudada, acabando por, gradativamente se perder no tempo,
acarretando perdas irreparáveis para a história do Brasil e do cangaço no
Nordeste. As futuras gerações tem direito a memória, a história, sendo a
história de Chico Pereira não só um patrimônio de Nazarezinho, mas de todo o
Brasil e de todos os brasileiros e brasileiras. É preciso preservar para os nossos
filhos terem direito de conhecer as raízes da nossa constituição histórica e
identitária nacional, pois “a história, por vezes, ironiza os homens” (Nóbrega,
2002, p. 65). Um dos maiores medos dos gregos não era o do julgamento dos
deuses, mas sim o julgamento da História, de serem lembrados como covardes ou
não serem lembrados pela posteridade.
A Constituição
Federal de 1988, no seu artigo 23 é muito clara quando determina:
É competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...]
III – proteger
os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural,
os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;
IV – Impedir a
evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de
valor histórico, artístico ou cultural;
V –
proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e a ciência.
A belíssima
casa do Sítio Jacú, que pertence a família Pereira, é de um enorme valor
histórico, tendo grande importância como patrimônio material para a história do
Brasil. Percebemos está a casa ameaçando ruir devido a ação do tempo,
necessitando urgentemente reparos e restauro.
Assim, nós
pesquisadores(as) pedimos encarecidamente a Prefeitura Municipal de
Nazarezinho, ao Governo do Estado da Paraíba e a família Pereira, o restauro
imediato, o tombamento da casa citada e a criação de um museu destinado ao
movimento social do cangaço, essa seria uma homenagem a memória de Chico
Pereira. Pois, como foi dito, hoje Chico Pereira é um patrimônio para todo o
povo brasileiro. Gostaríamos que o Exmº. Sr. Prefeito tome uma atitude
imediata, antes que a história passe a conhecer Nazarezinho como uma cidade sem
cultura e sem memória, que não guarda a sua herança histórica.
Nazarezinho –
PB, 16 de junho de 2013.
Sociedade
Brasileira de Estudos do Cangaço (SBEC)
Cariri Cangaço
Comitê em prol
da Reforma e Tombamento da Casa de Chico Pereira
Enviado pelo professor e pesquisador do cangaço:
Wescley Rodrigues
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http://sednemmendes.blogspot.com
http://mendespereira.blogspot.com
http://jmpminhasimpleshistórias.blogspot.com
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